Recém-chegado de Hong-Kong e das
Filipinas, o Pedro Franco trouxe-me a triste notícia da morte súbita, aos 65
anos, do fotógrafo alemão Michael Wolf (aqui). Wolf ficou conhecido por
fotografar a «arquitectura da densidade», hoje um cliché turístico para os
milhares que visitam Hong Kong. E, a par de arranha-céus desumanos de tão sobrepovoados,
Wolf ficou também célebre pelas suas fotografias de rostos no metro do Tóquio,
as caras de homens e mulheres esmagados contra janelas perladas de condensação.
O mundo é um lugar estranho.
terça-feira, 30 de abril de 2019
segunda-feira, 29 de abril de 2019
De Espanha...
Há pouco, por entre notícias das
eleições e do terramoto do Voxx, o El País trouxe uma reportagem sobre Rafael Díaz, um fotógrafo salvadorenho de 46 anos que recria – ou, melhor, reinterpreta – obras artísticas
icónicas da hispanidade. Como Malomil se deleita com estas recriações – ou,
melhor, reinterpretações –, aqui fica uma pálida mas convincente muestra.
Arendt, poeta.
Falta minha, não sabia que Hannah
Arendt tinha escrito poemas. Falta dela, os poemas de Hannah Arendt não são
grande coisa. Saíram em tradução castelhana, claro, com um belo estudo de
enquadramento, que nos explica e ensina a importância que a poesia teve na obra
de Arendt. Só por isso, um livro que vale a pena. Aqui fica a nota, curtinha e
bárbara.
domingo, 28 de abril de 2019
Itália...
Em
Itália, 6 em cada10 cidades não têm livrarias. Neste mapa do La Stampa, a
rarefação das livrarias em muitas zonas do país. E por cá? Nem vale a pena
perguntar….
Dois livros.
Na categoria da literatura antidepressiva,
a frondosa selecção de crónicas gastronómicas de Miguel Esteves Cardoso, Comes e Bebes: De que é que estavas à espera? Vale todos os cêntimos que o livro custa, um festival hedonista (e
um pouco gastador e consumista…), escrito por uma mão de luxo, das melhores de
Portugal. Já agora, para quando uma edição das outras crónicas de MEC no Público, as vinhetas breves que nos
iluminam os dias? Mais ou menos pela mesma altura em que me embrenhava nas volúpias
alimentícias de MEC, veio parar-me às mãos, por um acaso, um livro que
desconhecia, Coisismos, doutro
grande, enorme nome, o Paulo Varela Gomes. É um breviário já antigo, de 1990, ao que parece à venda aqui, um repositório de textos breves sobre coisas. Isso
mesmo: coisas, objectos, modas, tendências, um pouco à maneira das mitologias
de Barthes, escrito com a estrondosa inteligência e a imensa finesse d’esprit de Paulo Varela Gomes, cujas
crónicas na imprensa também deveriam – ai se deveriam! – ser compiladas na íntegra,
numa edição completa e exaustiva, pois são do melhor que por cá temos, do
melhor, do melhor que por cá temos, saudosamente melhor.
sábado, 27 de abril de 2019
sexta-feira, 26 de abril de 2019
Hotel Rwanda (21)
Almoço em Rubavu.
De novo na fronteira com
o Congo. E junto ao lago Kivu.
Fotografias de 21 de
Janeiro de 2019
José Liberato
quinta-feira, 25 de abril de 2019
O(s) Papa(s).
No
meio de tanta coisa péssima, vulgar e sensacionalista que para aí se publica sobre o
Vaticano e os papas, este é um livro interessante, sereno e honesto, que
procura ser imparcial e justo. Acima de tudo, está escrito de uma forma muitíssimo
cativante, capaz de prender a atenção até do leitor menos familiarizado com os labirínticos
meandros romanos. Sobre a renúncia de Bento XVI, não tem a densidade histórica
e teológica de um livrinho precioso, de Roberto Rusconi, A Grande Renúncia. E, para biografias de Ratzinger, há melhor, bem
melhor, do que este livro de Anthony McCarten. Desde logo, os livros de John Allen Jr., de que McCarten se socorre à larga, em especial a sua biografia de
Bento XVI. Mas permita-se a insistência: romancista, dramaturgo, guionista,
autor de A Hora Mais Negra, McCarten tem uma excepcional capacidade narrativa e este livro O Papa lê-se num piscar de olhos. Mesmo
que notemos um ou outro erro lamentável (como chamar cardeais a Hans Küng e
Johann Baptist Metz, na página 153, ninguém notou, em Portugal e no
estrangeiro?) e mesmo que discordemos do seu juízo muito crítico e severo do
pontificado de Bento XVI. Ainda assim, O
Papa é um livro importante para crentes e não-crentes, uma obra de fácil
acesso que permite perceber até que ponto os sucessivos casos de abuso sexual
de menores estão a minar a Igreja sob todos os pontos de vista (inclusive,
financeiro, pois são já muitos os milhões pagos para calar ou acalmar as
vítimas).
O meu 25 de Abril.
O meu 25 de Abril
Estou
na cama de manhã e aproveito para apontar na Agenda o tempo que passa. Tinha
ficado na véspera em casa a rever provas. O puto fora para o liceu. Resolvo ir
à rua beber uma cerveja e continuar a revisão. Ao pé do chafariz, o barbeiro
atira com esta: “então, o Marcello e o Thomaz lá foram ao ar...” Não percebo
logo. Nem acredito como. Mas ele confirma: a Emissora Nacional não funciona, só
o Rádio Clube Português é que dá música e de vez em quando comunicados breves.
Já mais convencido, convido-o logo a festejar na tasca da Laurentina que era
para onde eu ia. E depois, ainda duvidoso, vou com ele à barbearia a ver se
oiço algum comunicado. Música ligeira, sem nada de marcial. Canções populares
portuguesas, pouco mais. (Até a Amália, parece-me!). Mas passados minutos um
comunicado do Comando das Forças Armadas. Aí, adquiro a certeza que é, deverá
ser a repetição do golpe das Caldas, mas com outra amplitude. Refere que o
público tem ocorrido às lojas, em tentativas de açambarcamento, e manda fechar
o comércio. Aconselha a população a manter-se nas suas casas e as forças
militares e militarizadas a recolherem aos quartéis e não oferecerem
resistência à tropa. A coisa é grave. Parece que não há comboios e para lá de
Sete Rios não se passa. Tenho algum dinheiro e resolvo logo ir ver (foi o melhor
que fiz: ver para crer). Desço acelerado e vou a casa do Fernando Paços,
perguntar se ele sabe alguma coisa. Se sabe não diz. Mas confirma. Acompanho-o
à farmácia de Queluz Ocidental e depois (ele aconselha-me que não vá a Lisboa,
pois não conseguirei passar – mas eu conheço outro sítio para entrar, ou sair,
da minha terra e caminho acelerado. Muitos carros, em fuga discreta?) para cá.
Em Queluz, já vejo lojas fechadas, outras a fechar à pressa e uma data de
tontos a abastecerem-se para o ano todo... oiço que um tal comprou mais de cem
pães. Rica açorda (ou negócio) deve ter feito com eles. Cafés fechados. Há
comboios. Meto-me num para a Amadora, depois sigo a pé. No Bairro do Bosque
(sempre o intenso movimento de carros a saírem), ainda consigo meter um copo.
Não há jornais. Rostos, com as janelas fechadas, assomem entre cortinas. Tudo
me dá a ideia de receio (mas em Queluz vi alguns magalas a planar, o que me
deixou intrigado). Venho a pé até às portas de Benfica e o ambiente é o mesmo:
fila de carros a safarem-se, comércio encerrado, mulheres com sacos de plástico
cheios, tensão. Meto-me num autocarro da Carris, de Benfica para o Chile e
fico-me um tanto a rir do Paços, que em Lisboa e a andar para o centro já eu
vou. No Chile, só uma taberna aberta: bebo mais um copo, estou nas lonas.
Animação. Um tipo ao meu lado compra 8 maços de Português Suave, também está a
açambarcar ou a fumar aquilo diariamente habilita-se a um cancro nos pulmões em
beleza e rápido. Aparece gente com jornais (A Capital) e sei que estão a vender
para os lados do Império. Vou logo lá, sento-me num degrau e sei as primeiras
notícias. Tá bem! Resolvo ir a casa do Henrique, ver se ele estará. Na Carlos
Mardel, uma senhora num 1º andar pergunta-me onde vendem jornais. Digo e
ofereço-lhe o meu. O marido, que vinha à rua, fica com ele e eu fico reduzido a
30$00. Começo com sede e angústias. Estou em jejum e já andei um bom bocado.
Penso ainda ir ao Manaças (António) mas desde a última vez, desde a nossa
última conversa, ele não me está a apetecer. E depois, o importante deve estar
a acontecer na Baixa. Enfio ao Montecarlo (fechadíssimo) mas consigo topar um
tipo a bater à porta da Mourisca (também fechada) e entrar. É que há gente.
Vou, bato, o Costa Loiro está a forrar vidros por dentro com papel, talvez com
receio dalgum obus. Peço-lhe vintes e ele despacha-me. Meto à Rua Viriato e vou
até ao quartel de Santa Marta (todas as tascas fechadas até ali). Dá-me vontade
de rir ver os cabeças de nabo reunidos lá dentro, a falarem uns com os outros
(é que obedeceram às ordens?). Mas logo ao lado há uma tasca restaurante, porta
meio aberta, com gente e muito movimento (guardas a beber, outro a telefonar
para casa e sossegar a mulher (?), diz que não há azar). Bebo uma Sagres e como
uma sandes. E avanço para a linha de fogo, que não sei onde é. Metros andados,
ouvem-se ao longe tiros e rajadas de metralhadora. Tipos que fogem. Mas onde
será o tiroteio? Como a coisa parou, continuo a andar. Até que encontro, já não
sei onde, o Almeida Santos e um tipo que é revisor no Diário de Lisboa ou no
Popular, já não sei. Metemo-nos num táxi que sobe pela Calçada do Carmo. Mas
logo populares avisam (ah, entretanto, perto do Tivoli, já tinha comprado um
Diário de Notícias, com mais informes) que a rua está bloqueada. O carro faz
marcha-atrás e mete (por onde?) para o Bairro Alto. Bebemos não sei o quê numa
tasca, o revisor vai à vida, o Almeida Santos pira-se e eu avanço para os lados
do Carmo. Na Rua da Misericórdia, muita gente, tropa e um tanque de respeito. Da
janela da Redacção da República, o Vítor Direito e o Afonso Praça (aquele
grita-me: “estás muito bonito hoje!”, eu levava o sujíssimo albornoz que me deu
o Artur), noutra varanda o Álvaro Belo Marques, a quem pergunto: “como é que se
entra para aí?”, porque a porta da escada da República está fechada. “Vai pelas
traseiras!”. Vou mas também está fechada e logo à esquina aparece um vendedor
com a última da República. É um verdadeiro assalto. Aí fico a saber dos chefes
(Costa Gomes e Spínola) e o alvoroço é enorme. Já não sei bem: se vim ao
Rossio, se de repente notei uma grande correria para o Terreiro do Paço. Sem
perceber nada do que se passa, sigo a onda. No Terreiro do Paço, começa a
chover. Há correrias e encontro uma rapariga que me conhece muito bem mas não
topo logo. É a Maria João, a engenheira química, amiga do Henrique, com outro
rapaz. Ficámos abrigados da chuva debaixo das arcadas, depois convenço-os a
irem beber um copo ao Terreiro do Trigo (Campo das Cebolas?), não sei já se
estava aberto se não. Ela tem o carro no Camões e para aí vamos. Mas o Chiado
está cheio de gente, que quer assaltar a Pide. Já não sei se ouvi tiros. Vi
ainda as (uma?) ambulâncias, depois quase à porta da Brasileira um rapaz ou
homem com a mão cheia de sangue (seco?), que tinha agarrado num rapaz ou
rapariga. Começam a chegar fuzileiros, há mais correrias, a Maria João e o
rapaz perderam-se de mim. Cheira-me que já chega. Agarro um táxi e arranco para
casa da São. Pela TV vi depois o resto. Foi bonito e foi rápido. Já posso morrer
mais descansadinho.
Luiz
Pacheco, aqui
quarta-feira, 24 de abril de 2019
Chamo-me Leovigildo, de Maria do Carmo Rodrigues.
Chamo-me Leovigildo.
Nome feio ou bonito, não sei. Diferente. Entre os rapazes da escola, mais
ninguém se chama assim. Era o nome do avô do meu pai, que foi um homem generoso
e inteligente, segundo me contaram.