terça-feira, 31 de agosto de 2021

São Cristóvão pela Europa (149).


 

Em viagem pelas regiões italianas de Veneto e Friuli Venecia Giulia, vi várias imagens de São Cristóvão.

As primeiras, encontrei-as em Treviso na Igreja românico-gótica de São Nicolau, encostada às antigas muralhas da cidade de que o nosso Infante D. Pedro, filho de D.João I e Regente do Reino, foi Senhor com o título de Marquês.

A igreja é do Século XIII e foi construída pelos beneditinos.

No convento anexo iniciou a sua formação religiosa o Papa Bento XI que aliás se chamava Nicolau.

Um fresco gigante, como é tradição:



Um quadro da autoria de Antonio da Treviso:



E um fresco numa das colunas, em trabalho de restauro:




Em Udine há mesmo uma Igreja de São Cristóvão, infelizmente fechada:


 


Finalmente em Gemona del Friuli, pequena cidade de grande movimento comercial no final da Idade Média, local de pernoita para quem se dirigia para o Norte, uma inesperada Catedral de Santa Maria da Ascensão, gravemente atingida pelo terramoto de 1976 e objecto de grande restauro:




Na fachada, uma estátua do nosso Santo de enormes proporções datada de 1331 com sete metros de altura, susceptível de ser avistada de longe:



 

No interior, os vestígios de um fresco de São Cristóvão muito deteriorado. Foi descoberto em 1976 e é da autoria de um pintor local (século XIII-XIV):




 

Fotografias de 9 de Agosto de 2021

 

José Liberato

 




domingo, 29 de agosto de 2021

Outra História, Outras Estórias.

  


Quando eu disse numa roda de amigos, alguns deles antigos alunos do Liceu Filipa, que vinha apresentar um livro do Prof. Adérito Tavares, muitos deles perguntaram: quem, o nosso professor de História que punha música dos Pink Floyd nas aulas?

         

E, passe o pleonasmo, todos foram unânimes em afirmar que Adérito Tavares foi o melhor professor que tiveram na vida, coisa de que não ouso discordar, dizendo também que ele foi – e é – o melhor professor que alguma vez tive na minha vida, em todos os graus de ensino, universitário incluído.

         

Mas Adérito Tavares não foi apenas o melhor professor que alguém pode ter na vida, foi e é um professor de vida, um mestre da vida e do viver de uma forma sadia e, por isso, feliz.

         

Este livro tem por subtítulo «Crónicas do tempo que foge» e, no tempo que nos vai fugindo a todos, a uns mais que a outros, o que Adérito Tavares tem de mais inscrito e de mais admirável é o facto de ser um homem que se cumpriu, que se cumpriu como homem e como cidadão, como professor e mestre, como pai e avô de uma Leonor, cujo nome me comunicou com babado orgulho, quando eu lhe disse ser pai de uma Leonor, que fiz questão que frequentasse o Liceu Filipa de Lencastre, na vã esperança de que ela tivesse um professor como Adérito Tavares, que metesse música rock nas aulas, que a levasse em visitas de estudo que eram um festim de intelecto e alegria, que mostrasse slides com castelos e monumentos tendo o cuidado de advertir «o que vêem em primeiro plano na imagem é o filho do vosso professor de História».

 

Com variações e actualizações, as graças repetiam-se de ano para ano, tornaram-se lenda, imagem de marca, passaram de geração em geração e assim o tempo nos foi fugindo a todos, a uns mais que a outros, pela mão de um homem que se cumpriu a si mesmo em convívio com os seus semelhantes, com um genuíno e vivíssimo interesse por eles, pelas aventuras e misérias quotidianas das pessoas de carne e osso, que são, ao cabo e ao resto, a matéria-prima de que é feita a História e, creio eu, a razão de ser da sua paixão pela História.

 

Adérito Tavares tem o dom de transformar a História numa infindável estória, e foi esse engenho, agora transmitido ao auditório mais vasto dos seus novos leitores, que lhe permitiu cativar muitas gerações de alunos em aulas ouvidas em fascinado silêncio, tendo ainda outro dom, singular e raríssimo, que foi o de manter com os seus alunos uma relação de enorme afecto e de extrema proximidade, que se prolonga por décadas, como aqui vemos, mas, ao mesmo tempo, de enorme respeito mútuo, de civilização posta em prática.

         

Há uma outra coisa que gostaria de dizer, e perdoem-me o tom crepuscular de quem vai sentindo o tempo a fugir-lhe, e essa coisa é a seguinte; apesar de tudo o que acabo de afirmar, e de tão amplamente se ter cumprido na vida, Adérito Tavares é um homem de desarmante simplicidade, bastando ver a forma telegráfica com que se apresenta na badana deste livro, livro onde reencontramos muitas das estórias que o ouvimos contar e que, para mim, foi tanto um exercício de leitura, de gratíssima leitura, como de audição de um passado que não quer passar – e talvez o professor Adérito, tão dado à música e às artes de Santa Cecília, compreenda que lê-lo neste livro, escutar a sua voz Adérita e pretérita, foi ouvi-lo nas suas aulas, ouvir alguém que foi e será sempre um menino maravilhado com os reclames luminosos do Rossio à noite, alguém que nunca perdeu o encantamento com o espectáculo do mundo e com o muito que a vida merecidamente lhe deu.

         

Adérito Tavares é um homem feliz, suave e contagiosamente feliz, que se cumpriu e cumpre a si mesmo, mesmo que não faça alarde dessa condição feliz nem tenha a jactância de nos exibir a sua evidente realização pessoal, profissional, familiar e humana.

 

Adérito Tavares é também um exemplo, que sempre calorosamente me impressionou, das virtudes da meritocracia, pois é alguém que, pela sua curiosidade infantil, que nunca perdeu, mas também pelo esforço e pela inteligência, pelo trabalho sério e honesto, teve uma trajectória de vida que hoje nos parecerá fácil, à distância de uma autoestrada rápida entre Lisboa e o interior do país, mas que no seu tempo era imensa, tremenda, e nem contável sequer em quilómetros. Entre a capital e a sua terra, Aldeia do Bispo, no Sabugal, existia um enorme abismo, social e mental, que Adérito Tavares, como sempre, transpôs suavemente, passo a passo, sem acotovelar nem atropelar ninguém e, sobretudo, sem perder a fidelidade às raízes e a felicidade das origens, a que sempre regressa.

 

O professor Adérito, o meu professor Adérito, devolve-nos a esperança de um país democrático e meritocrático, mais justo e solidário, com um ensino público de exigência e excelência, com professores que sabem que ter uma mão cheia de alunos à sua frente nas aulas não é dever, é privilégio, é ter uma oportunidade única, irrepetível, de lhes ensinar, mais do que a matéria de um programa, um exemplo de vida, um exemplo de que é possível ser rigoroso e afável, de que os melhores docentes são respeitados e amados em doses iguais, com vantagens para ambas.   

 

Há uma frase de um grande poeta da Renascença, Guicciardini, que diz mais ou menos isto: «vamos todos morrer; e, no entanto, portamo-nos no dia-a-dia como se fôssemos viver para sempre».

 

          Este livro bem assinala no subtítulo o latino tempus fugit, o tempo que foge, e essa consciência da transitoriedade do tempo, e da nossa finitude no efémero tempo que ao viver se foge, essa consciência, dizia eu, permite-nos ver de forma mais lúcida e clarividente aquilo que de bom e de mau existe no pretérito de cada qual, e a que ousadamente chamamos «biografia».

         

          Na minha biografia sentimental, e na de todos os que tiveram o privilégio de ser seus alunos, a marca do Prof. Adérito Tavares é mais funda e mais perene do que aquilo que ele, na sua consabida modéstia, alguma vez poderia julgar. E, por isso, é isso que hoje lhe venho dizer, aqui e em público, pedindo desculpa a todos pelo pedaço de tarde que vos fiz perder.

         

          Muito obrigado.  



António Araújo

(Feira do Livro de Lisboa, 29 de Agosto de 2021)








quinta-feira, 26 de agosto de 2021

São Cristóvão pela Europa (148).

 

 

As Galerias da Academia em Veneza, pinacoteca de valor superlativo, estão instaladas num complexo anteriormente formado pela Escola da Caridade, a Igreja de Santa Maria da Caridade e um convento da Ordem Canónica de Latrão.

Na transição entre a Igreja e a Escola, há um baixo-relevo de São Cristóvão:



E sem São Cristóvão, uma bela imagem de Veneza com o Palácio Ducal à esquerda:

 


Mas o verdadeiro ícone de Veneza é a Basílica de São Marcos:

 


No exterior, há duas imagens do nosso Santo: um baixo-relevo e um mosaico, este muito difícil de fotografar:

 




No nártex, ou seja na entrada da Basílica, no meio de uma profusão de mosaicos, o nosso Santo:

 




Já terminado este texto, o amigo Ademar enviou a fotografia de um fragmento de mosaico que está no Museu da Basílica e que me tinha escapado:

 


Fotografias de 7 e 8 de Agosto de 2021.

 

José Liberato




quarta-feira, 25 de agosto de 2021

São Cristóvão pela Europa (147).

 

 

A Basílica de São João e São Paulo é a maior igreja de Veneza. Curiosamente consagrada não aos dois apóstolos conhecidos por esses nomes mas a dois mártires que morreram em Roma:

 


No seu interior um políptico da autoria de Giovanni Bellini dedicado a São Vicente Ferrer (1430-1516), cujas cores foram reveladas por recente restauro.

 



Na Igreja de São João Crisóstomo, ainda em Veneza e também de Giovanni  Bellini um quadro representando  São Cristóvão, São Jerónimo e talvez Santo Agostinho:

 



Ambas as imagens de São Cristóvão são das mais reproduzidas em toda a Cristandade.


Fotografias de 7 de Agosto de 2021.

José Liberato


 

 


segunda-feira, 23 de agosto de 2021

São Cristóvão pela Europa (146).

 

 

Já aqui se falou de cidades onde a presença de São Cristóvão é muito significativa. Munique, Colónia, Nuremberga, Maastricht, estão entre elas.

Veneza está seguramente ao seu nível. A Sereníssima.

República de viajantes. De longo curso no Mediterrâneo, de curto alcance no que respeita aos barqueiros da Lagoa.

 

A igreja da Madonna dell’Orto é um esplêndido exemplar de arquitectura gótica veneziana.

Inicialmente a Igreja foi dedicada a São Cristóvão em consideração às características mercantis do bairro e aos barqueiros que transportavam bens e passageiros pela Lagoa.

Em 1377 foi aqui constituída a Escola de São Cristóvão.

Imagem na fachada da Igreja:




No interior uma tela como uma das imagens conhecidas representando São Cristóvão:




Trata-se de uma cópia de um quadro da oficina de Gianbattista Cima da Conegliano.

 

Na Igreja de San Rocco (São Roque), um célebre quando de Il Pordenone (cerca de 1484-1539) representando São Martinho e São Cristóvão:

 



Fotografias de 7 de Agosto de 2021

 

José Liberato

 

quinta-feira, 19 de agosto de 2021

São Cristóvão pela Europa (145).

 

Cuenca é uma cidade lindíssima e ao mesmo tempo pouco conhecida.

Está situada bem no interior de Espanha e no nordeste na Região de Castilha-La Mancha.

É Património da Humanidade desde 1996.




No Museu do Tesouro da Catedral, instalado no Palácio Episcopal, um magnífico retábulo renascentista representando a Última Ceia:



A figura de Cristo é monumental, os apóstolos dispõem-se em círculo e São João dorme.

Do lado esquerdo São Vicente, do lado direito São Cristóvão, mergulhado no rio até meia perna e segurando um cajado nodoso cuja parte de cima é uma verdejante palmeira:





O retábulo é da década de 50 do Século XVI, deve ter sido pintado para uma igreja da região e é atribuído actualmente a  Martin Gómez El Viejo e a Gonzalo Gómez, sendo os Gómez uma importante família de pintores do Renascimento em Espanha.

 

Ainda na província de Cuenca e nos arredores da cidade de Tarancón existe o Santuário da Virgem de Riánsares, padroeira de Tarancón. Fundado na Idade Média e transformado em residência do Duque de Riánsares, D. Fernando Muñoz, tem uma relação curiosa com a História do Século XIX espanhol.

A Rainha Maria Cristina foi a mulher (e a sobrinha) do Rei Fernando VII. Quando o Rei morreu, sucedeu-lhe sua filha Isabel II com apenas 3 anos, ficando Maria Cristina como regente. Mas esta encanta-se com Fernando Muñoz e casa secretamente com ele. É ela que, como regente, lhe atribui o título.

O santuário foi devolvido à Igreja. No interior da capela, onde está sediada uma irmandade de São Cristóvão, uma imagem do Santo:



Já na província de Madrid, em Colmenar de Oreja, situa-se a Igreja de Santa Maria Maior, construída pela Ordem de Santiago no Século XIII:

 


No seu interior um quadro de Ulpiano Checa (1860-1916), pintor nascido em Colmenar, dedicado ao Santo:

 


Fotografias de 1 e 3 de Agosto de 2021,

 

José Liberato





terça-feira, 17 de agosto de 2021

Agora falando sério.

 



 

Isto torna as coisas bem mais concretas: segundo o Climate Central, uma non-profit gerida por uma data de cientistas e comunicadores de ciência norte-americanos da área do clima, as projecções realistas já para 2030 (daqui a 9 anos!) põem praticamente toda a reserva natural do Tejo e a lezíria junto a Samora Correia e Benavente abaixo do nível da água. A zona do Montijo e de Alcochete vai ser uma península com menos 1/10 do território. O Barreiro também vai perder o cotovelo a noroeste. Parte do areal de Carcavelos vai à vida e o mesmo para Tróia e a Comporta. A Ria Formosa entre Faro e a Fuseta quase vai desaparecer. Junto à foz do Mondego e à Figueira da Foz, uma enorme área até Montemor-o-Velho também se vai. De Ovar até para lá de Ílhavo, boa parte da costa ficará abaixo do nível do mar. Tudo isto nos próximos 9 anos. E claro, se não forem construídos ou elevados vários diques e outras obras de engenharia.

Se quisermos ver no mapa, também, as partes de Portugal que sofrerão com cheias anualmente já em 2030, então temos entre Caminha e Viana do Castelo, Esposende, Vila do Conde, Matosinhos, a Foz do Douro, Espinho, Aveiro, Belém entre a Fundação Champalimaud e o Padrão dos Descobrimentos, o Terreiro do Paço e o Cais das Colunas, o Beato até ao Museu do Azulejo, boa parte do Parque das Nações entre o Oceanário e a ponte, praticamente todas as praias da linha de Cascais, a Costa da Caparica por inteiro, o Estuário do Sado, Lagos e Portimão.

Tudo isto não impede que algo seja feito para reduzir ou mesmo eliminar o impacto do aumento do nível do mar e das cheias. Mas isso significará um grande investimento ao longo de toda a costa portuguesa. Fiz uma pesquisa rápida e vi que está previsto o investimento de 470 milhões nestes mesmos 10 anos só para a requalificação do litoral entre Caminha e Espinho. Não sei e gostaria de saber o que se planeia para o resto do país e por quanto dinheiro (nomeadamente do PNI 2030). Quem m'ajuda?

Para mim, é um choque ver que tantas das zonas do país que mais gosto de visitar poderão/poderiam desaparecer em apenas 9 anos, se nada for/fosse feito. E é outro choque ver que, segundo as projecções, é muito curta a diferença entre as projecções mais moderadas e as mais pessimistas quanto às zonas afectadas pelo aumento do nível do mar e de cheias.

Deixo-vos o mapa: https://coastal.climatecentral.org/map

(O Climate Central salienta que estas projecções são baseadas na evidência científica actual e que vai sendo, como toda a evidência científica, reavaliada.)

 

Rui Passos Rocha




São Cristóvão pela Europa (144).

 

 

Imagens e pinturas de grande dimensão representando São Cristóvão encontram-se em muitas igrejas e catedrais de Espanha. 

Algumas foram destruídas, outras permanecem ocultas debaixo de pinturas sobrepostas.

Era isto que acontecia em Moral de Calatrava na província de Ciudad Real. Foram realizadas há pouco tempo obras de remodelação na importante Igreja de Santo André:




Numa das paredes da Igreja existia um altar dedicado a Nossa Senhora do Carmo:

 


Mas a remoção da cal permitiu encontrar nesta parede um São Cristóvão de grandes dimensões, provavelmente do Século XV ou XVI:

 



Infelizmente perdeu-se a parte de baixo da imagem bem como uma faixa horizontal danificada por uma instalação eléctrica executada quando não se conhecia ainda a pintura. Nota-se ainda que o Santo segura na mão direita uma mó.

 

Em Mota del Cuervo, já na província de Cuenca, existe uma Ermida de São Cristóvão cuja imagem principal é processionada regularmente:






 

Fotografias de 31 de Julho e 1 de Agosto de 2021.

José Liberato



 

segunda-feira, 9 de agosto de 2021

São Cristóvão pela Europa (143).

 

Na Região da Mancha, províncias de Ciudad Real e Cuenca, existem várias pequenas ermidas de devoção a São Cristóvão.

São pontos de confluência de confrarias, as suas imagens são usadas em procissões anuais em celebração do Santo. Agora interrompidas.

É o caso em Villarubia de los Ojos, no início da planície manchega:

 


Também é o de Horcajo de Santiago:






Fotografias de 31 de Julho e 2 de Agosto de 2021

 

José Liberato