Fotografia de Gabriel Mithá Ribeiro
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Quanto
mais dialogo com jovens escolarizados dos bairros suburbanos da cidade da
Beira, em Moçambique, mais me convenço da utilidade da milenar sabedoria
chinesa. Em geral, os discursos dos jovens moçambicanos são, a um tempo,
frontais e críticos do poder político instituído. A matéria-prima de que
disponho é exploratória, não permitindo aferir nada de sustentável. De qualquer
forma, porque esses discursos de senso comum são objectivados na figura do
presidente da república, fica a ideia de Armando Guebuza estar a tornar-se
vítima da clareza e sustentabilidade no tempo do seu próprio discurso,
precisamente entre aqueles que foram crescendo ao ritmo das suas falas. Em
2004, quando chegava ao poder, Armando Guebuza prometia combater a corrupção, a
pobreza e a pobreza absoluta. Agora, quase uma década depois, a história deu as
suas voltas. Concordando ambos com muita clareza – presidente e jovens urbanos
escolarizados – quanto à centralidade da corrupção e da pobreza na gestão
política do país, considerando ainda que o mais velho foi o mestre que – de
modo muito incisivo – indicou tais prioridades aos mais novos, as
interpretações dos resultados das práticas governativas desembocam em caminhos
avessos. Portanto, as intenções originárias do poder esvaíram-se. Captei ainda,
entre os jovens, a tese de que o recenseamento eleitoral, neste momento em
curso em Moçambique, está marcado por deficiências cujo intuito é o de,
supostamente, evitar o crescimento exponencial do número de novos votantes
jovens, o segmento que mais tenderá a optar por alternativas políticas. Mesmo
que apanhadas no ar e discutíveis nos seus fundamentos, estas ideias
traduzem, pelo menos, um fenómeno interessante: o de progressivamente se irem abatendo
sobre a Frelimo (no poder desde 1975) problemas políticos suscitados pelos
excessos de natalidade, posto que o poder governativo não quis ou não soube
gerir de outro modo o assunto do acelerado crescimento demográfico. O facto é
que a matéria pode revelar-se estratégica para a sustentabilidade no poder a
longo prazo de uma mesma força política, além de permitir resolver com maior
eficácia muitos outros problemas cruciais: criminalidade, ensino, saúde,
ambientais, estruturas urbanas, transportes, entre outros. Apesar da forte
empatia com a China, a Frelimo não aprendeu a lição do chinês. O Partido
Comunista da China, por seu lado, vai conservando o poder de modo relativamente
estável também (ou sobretudo) porque regulou a natalidade. Uma população envelhecida
é sempre mais dócil, permitindo que o poder se relegitime com relativa eficácia
a cada nova geração. Com o controlo da natalidade, as crianças estão mais
fortemente debaixo da alçada dos pais e mais velhos. Estes, com muito maior
facilidade, contaminam a rara descendência com os seus fantasmas
históricos que vão preparando os debutantes para a submissão à autoridade do
estado, fantasmas que não são mais do que interditos em torno de ideias,
pensamentos, considerações sobre os governantes. Acontece que tais interditos
são muito mais facilmente quebrados quando as novas gerações crescem sobretudo
entre pares, mais ainda em contextos onde a rua pesa na socialização de
crianças e jovens, em parte, entregues a si mesmos. Retrato dos subúrbios da
África Subsaariana onde me encontro. Um pouco mais a norte, alguns dos regimes
árabes viveram e vivem processos de erosão da legitimidade do poder
equivalentes. Estes podem não ter tanto a ver com o envelhecimento dos homens
do poder, antes com o rápido rejuvenescimento da população. E um poder
cristalizado, secundado pelos de sempre, entre notáveis e mais velhos, revela
grandes dificuldades em se aperceber das características do subsolo
humano de sociedades dominadas em número por crianças e jovens, tanto mais quando
os últimos são acalmados com recurso precisamente à estratégia que mais
activa o seu descontentamento e pretensões reivindicativas: a escolarização.
Não é por mero acaso que, em conjunturas de curta duração, forças políticas
dominantes e sólidas durante décadas podem colapsar que nem baralhos de
cartas por corrosão das fundações. Basta ir ouvindo os jovens urbanos
escolarizados, como os moçambicanos. A sabedoria milenar do mestre chinês é bem
mais eficaz do que as frases feitas – poucas, curtas e claras – do actual
marketing político.
Gabriel Mithá Ribeiro
Pois o problema é a natalidade. O que falta é uma lei obrigatória do aborto e Moçambique será em poucos naos o paraíso na terra.....~lol
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