impulso!
100 discos de jazz para cativar os leigos e vencer os cépticos !
# 87 - DAVE HOLLAND
A
culpa foi outra vez do fulgurante talento de olheiro de Miles Davis, que só teve
comparação no de Art Blakey. Em 1968, numa passagem por Londres, Davis ouviu um
jovem contrabaixista no legendário clube de Ronnie Scott. A cena não era
excêntrica, pois por essa Europa do jazz havia dotadíssimos músicos locais que
faziam um tirocínio de luxo acompanhando as grandes estrelas quando passavam
por lá em digressão. Mas Miles ouviu algo de especial naquele rapaz, de modo
que não se coibiu de o convidar logo ali.
Foi
assim que Dave Holland, um filho da classe operária de Wolverhampton, que aos quatro
anos já dedilhava um cavaquinho e aos 22 ostentava no currículo sessões com
Coleman Hawkins, Ben Webster ou Joe Henderson, desembarcou em Nova Iorque um
mês depois dessa ditosa noite, integrando a formação de Miles Davis imediatamente,
no dia seguinte à sua chegada. “Ele conversou pouco comigo, queria que eu
desenvolvesse as minhas próprias soluções sem ter em conta os contrabaixistas
que me precederam”, resumiu Holland. Que Miles terá gostado dele, prova-o o
facto de passado um ano, em 1969, ter integrado a formação que gravou o angular
Bitches Brew.
Mas
a índole experimental de Dave Holland não acomodou a deriva de Miles pelo rock
e os compromissos estéticos que ela exigia. Daí que em 1970 faz uma viragem de
180 graus e forma o grupo Circle, com o saxofonista Anthony Braxton e o
baterista Barry Altschul que começavam a marcar terreno no então transbordante
e sempre convulso campo do free jazz.
Juntando
o influente flautista Sam Rivers ao Circle, Dave Holland assina em 1973 o disco
“Conference of the Birds” que se tornou, e ainda hoje é, um momento decisivo no
repertório de vanguarda do jazz.
Começou
também com “Conference of the Birds” a longa associação de Holland à etiqueta
ECM, só rompida em 2003, precisamente com “Extended play, live at Birdland”,
data a partir da qual o contrabaixista constituiu a sua própria editora, num
movimento cada vez mais frequente nos artistas que preferem ter em mãos o
controle da produção, da edição e dos direitos.
Poucos
poderão evocar um percurso musical tão díspar e irrequieto quanto Dave Holland.
E tudo isto poderia ter dado num ecletismo frustre se não tivesse resultado no
quinteto com o qual tem trabalhado desde 1998, a partir do disco “Points of
View”, após um período em que procurou várias companhias, nenhuma delas
improdutiva mas também sem que delas resultasse a formidável empatia demonstrada
com os elementos de “Extended play”.
Extended Play, Live at Birdland
2003
ECM 1884/65
Dave Holland (contrabaixo);
Chris Potter (saxofone tenor, alto soprano); Robin Eubanks (trombone); Steve
Nelson (vibraphone, marimba); Billy Kilson (bateria).
A
grande vantagem deste disco em relação aos restantes do grupo, sendo todos
pepitas de um filão que parece inesgotável, é o fulgor de uma actuação ao vivo.
Ao vivo a duração não é um constrangimento e os intérpretes podem desenvolver
parágrafos em vez de frases, mostrando que é na pontuação e na fluidez que está
a arte. Além disso não há nada como uma plateia para puxar pela adrenalina e
espevitar os sentidos. Claro que ambos os motivos podem dar para o torto: os
solos perderem toda a síntese e tornarem-se deambulações erráticas e o
nervosismo entupir a veia criativa. Nada disto sucede em “Extended play”, um
duplo CD no qual se podem fruir duas horas de jazz, com trechos que chegam a
durar vinte minutos, sem a mais pequena redundância. O longo tema de abertura
declara o programa. Com uma estrutura canónica, os instrumentos vão tendo à vez
e em boa ordem os seus compassos de improvisação, momentos de diálogo,
torrentes de energia. A densidade harmónica é a palavra de ordem e a verve é
intensa. O solo de Dave Holland perto do final da faixa é elucidativo do seu
estilo: um dedilhar potente vincando as notas, sempre a libertar traços
melódicos e sobretudo muito funky, demonstrando porque é ele um mestre do ostinato
ou do vamp.“Extended play, live at Birdland” é quase febril nalgumas passagens.
Talvez Dave Holland e os seus companheiros quisessem mostrar com o seu fervor que
Nova Iorque era invencível, nestes quatro dias de concertos, realizados no
final de Novembro de 2001, com a memória da tragédia do 11 de Setembro ainda em
carne viva.
José Navarro de Andrade
"" The band has now benefited from the impassioned tenor sax of Chris Potter who is so immersed in the music theta he dances while he plays. Billy Kilson is a tremedous drummer, and he and Holland have developed a euphotic rapport.
ResponderEliminarQuem diz isto é o Rough Guide for Jazz e sendo assim coloquei o disco.
E fez muito bem! Obrigado.
ResponderEliminarPois, é bom não esquecer os que normalmente são a base .Creio que os CB são normalmente nas "bandas" os músicos mais eruditos.Será assim?
ResponderEliminarNo caso de Mingus e, actualmente de Christian McBride, sem dúvida.
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