2 de Agosto
O erguer da cama, no
último dia da Brava, foi às 5am para apanharmos o Fast Ferry que supostamente
rumaria à ilha do Fogo pelas 7 e no entanto só largou às 10:30.
Em S. Filipe,
reencontrámos o sr. Emílio, que nos fora recomendado já em Santiago. Eu queria
alugar carro, mas dissuadiram-me, pois seria melhor contratar um guia local
para o passeio ao vulcão. Acabei conformando-me. O sr. Emílio delegou a tarefa
no filho, o Júnior, de 21 anos.
Afinal a estrada está
magnífica e, ao contrário das outras ilhas, muito bem assinalada e eu poderia
de facto ter alugado carro. Há vantagens neste modelo, porém. O nosso guia
herdou do pai o fino trato, a simpatia e a vontade de mostrar a sua ilha sem
no-la impor.
Sobe-se até ao cimo da
cratera (1700 metros de altitude), sem nunca se avistar o cimo da montanha. Ele
aparece-nos de surpresa quando atingimos o topo, como se à Vista do Rei das
Sete Cidades. Entramos numa chã (a Chã das Caldeiras) rodeada de uma cumeeira
em toda a volta e, em frente, emergindo dela, ergue-se um soberbo cone,
grandioso, imponente na sua forma elegante, e sobretudo impondo respeito pelo
vigor vulcânico da lava, da jorra (o nosso cascalho ou bagacina) e dos
pedregulhos, tudo com sinais vivos de erupções nada afastadas no tempo (a
última, no pico pequeno, em meados de noventa).
Para além da beleza
geométrica do triângulo, é a imensidão e o relevo da cratera que impressionam.
Por estranho que pareça, o cone não parece chegar aos 1100 metros que tem sobre
os 1,700 em que assenta, embora o total ultrapasse em 500 a altitude do nosso
Pico.
Há um pequeno povoado
de umas quase duas mil pessoas. Uma escola, duas adegas produtoras de vinho
(visitámos a do famoso Chã branco, de que ficámos fiéis devotos (por incrível
que pareça há vinhas – ou pés de videira dispersos – no meio da imensa
pedraria), uma igrejinha, um campo de futebol com um piso de jorra (pobres
joelhos dos jogadores quando aterram) e até dois modestos restaurantes.
Escolhemos um numa casa particular e comemos praticamente na cozinha. A
pequenada brinca à nossa volta, locais entram e saem com grande à vontade,
saúdam sempre os presentes, mangam com a cozinheira, brincam com as
crianças. Alguns deles são guias e vêm acompanhados de turistas chegados
de uma escalada à montanha, que tem de ser feita logo às seis da manhã (quatro
horas de subida e duas de descida). Mais tarde é impossível por causa do calor.
Para mais, lá em cima o chão é quente. Com o sol a pino, seria de fritar.
A montanha está sempre
toda descoberta. Dizem-me que permanece assim. Aqui nunca há nuvens. É como a
paisagem da Madeira: igual de manhã à noite. Para obtermos nuances, há que
viajar pela cratera em cata de ângulos novos, porque as cores estão já lá todas
nas pedras, não advêm da luz que as banha, nem se desdobram em matizes. Por
isso este Fuji Yama é isto que aqui está, vigoroso, hercúleo, mas impávido e
sereno. E sem as poses de trombudo ou irado, nem os caprichos do seu primo
Pico, dos Açores, que nos irrita fazendo negaças e encobrindo-se, mas também
nos delicia com o seu strip-tease da roupagem de nuvens, por vezes com
tantas camadas quantas as saias das mulheres da Nazaré e por isso matizam a luz
do sol à medida que se desnuda ou se cobre.
Uma outra diferença é a
ausência do acentuado perfil do pico salientando-se sobre a ilha por causa das
dimensões da cratera. O todo da sua altitude só de um ângulo da ilha se obtém e
só o captei do avião. A silhueta da montanha não consegue, porém, a imponente
elegância da sua congénere açoriana. O portento do cenário do Fogo disfruta-se
é na sua cratera, uma festa para os olhos, um mergulho num interior da terra
desventrado a torrar ao sol. E não a apreciei por inteiro porque seria
necessário pernoitar. Já tínhamos organizado a viagem quando soubemos dessa
possibilidade. Fica essa vontade acrescentada ao já assente desejo de voltar.
Onésimo Teotónio de Almeida
Belas fotografias! Pode crer que são das mais bonitas que tenho visto do imponente e
ResponderEliminaralgo assustador vulcão da ilha do Fogo. Um abraço amigo
Ondina