Tempos estranhos estes que nos querem fazer pensar duas
vezes antes de desejar “Feliz Natal!”. É o politicamente correto que confunde
tolerância com intolerância, derramando um fel corrosivo na empatia espontânea.
São os amigos que perderam os que lhes são mais queridos. São os próximos e
menos próximos que sabemos, tantas vezes sem se queixarem, que estão a passar
por dificuldades. São os vizinhos, os rostos, as pessoas com que nos cruzamos,
que sentimos que não estão bem. É o consumismo que nos divide. Que nos divide
por fora. Os que podem. Os que não podem. Mais ou menos. Que nos divide por
dentro. Generosamente culpados. Culpadamente generosos.
E o futuro próximo que é imprevisível, “disseram nas
notícias”.
Esta semana vi um filme que é um murro no estômago. Um
retrato impressivo de vidas amargas, que sabemos que são vividas, com que nos
cruzamos, com que vivemos. “Nunca Nada Aconteceu” de Gonçalo Galvão Teles é um
olhar penetrante sobre o que acontece e não podemos ou não queremos falar. Não
se fala de suicídio nas notícias. Não se fala de desemprego, a não ser nas
estatísticas. Não se fala de infidelidade, a não ser na vida dos outros. Não há
jovens, e menos jovens, infelizes nas famílias. E muito menos nas redes
sociais.
O paradoxo é este receio. Esta autocensura que se vai
formatando. O medo em dizer: Feliz Natal! Desejar um feliz Natal não é uma
obrigação. É uma liberdade. E das maiores. A liberdade que temos de, por muito
que o ano tenha desgastante, de desejar bem aos outros. E a nós. A liberdade
que temos de ter esperança no futuro, por mais imprevisível que seja.
No final de uma relação amorosa, teremos sempre Paris. No
final de um ano, por mais difícil que seja, por mais incerto que seja o que
está para vir, podemos sempre dizer aos que mais gostamos, aos amigos, aos que
nos ajudaram, aos que ajudamos, aos que com quem nos cruzamos, aos que estão
longe, o quanto lhes queremos bem. Podemos sempre dizer, a todos: Feliz Natal!
Teremos sempre o Natal.
Nuno Sampaio 21.12.21
Sem comentários:
Enviar um comentário