terça-feira, 29 de novembro de 2016

Na morte de Fidel (poema).














Na morte de Fidel



É urgente um verso vermelho
que suspenda a animação deste desastre
pensado para durar depois do inverno


É urgente um verso vermelho
com todas as cores do arco iris
e o vento natural do universo


É urgente um verso vermelho
que ponha de novo em movimento os comboios da imaginação
azeite puro em manivelas de razão quente
o peso da história de novo levíssimo
a rodar sobre perguntas livres e ruínas vivas
a paisagem mudar primeiro lentamente
enquanto vão entrando vozes ainda submersas
e corpos mal refeitos da desfiguração da guerra e do comércio
das crateras e promoções


É urgente um verso vermelho
que desate os nós da memória e do medo
e resgate os rios da rebeldia
a palavra cristalina inabalável
inconfundível com as mordaças sonoras
à venda nos supermercados da ordem


É urgente um verso vermelho
para anunciar barco polifónico da dignidade
pronto a navegar
os rios libertos das barragens calcinadas
dos sistemas de irrigação industrial da alma


É urgente um verso vermelho
uma luz manual portátil que vá connosco
sem esperar a que virá no fundo do túnel se vier
porque a cegueira da viagem é sempre mais perigosa
que a da chegada
talvez só entrega
talvez só paragem


É urgente um verso vermelho
que trace um território inacessível
aos vendedores de mobílias espirituais
e turismo de acomodação


É urgente um verso vermelho
vinho de bom ano para acompanhar
sonhos sãos e saborosos
preparados em brasas de raiva e a brisa da alegria


É urgente um verso vermelho
sem solenidades nem códigos especiais
para devolver as cores ao mundo
e as deixar combinar com a criatividade própria dos vendavais







Boaventura de Sousa Santos, aqui



 




 

6 comentários:

  1. Nada como a morte de um ditador para confirmar a quantidade de gente que está disposta a negociar a Liberdade e a democracia. Mas com má poesia fica mais difícil.

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  2. Baco e o seu elusivo bafo
    Escreve torto
    Inebriado e impudico
    Sua elegia fatal

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  3. Ah, gosto do chapéu,
    Como fica bem - o "chapéu"
    Ao presumido poetastro...

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  4. É urgente enviar este homem para a Coreia do Norte.

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