domingo, 11 de agosto de 2019

Perder a Terra.






Haja ou não haja, a greve dos camionistas teve já dois efeitos positivos: mostra-nos o grau de dependência que ainda temos dos combustíveis fósseis e mostra-nos até que ponto um país inteiro é vulnerável. Um país, um continente, o mundo inteiro, coisas muito mais vulneráveis e frágeis do que julgamos. Por muito que muitos digam que há pânico apocalíptico nos alarmes constantes, diários, sobre as alterações climáticas, há coisas que já deixaram de ser negadas. O Miguel Nogueira de Brito, grande e portentoso leitor, recomendou-me este livro, Losing Earth, de Nathaniel Rich, saído há pouco (ver isto, muito importante). Li-o entre o final de tarde e o serão, de olhos bem abertos, pois, entre o mais, é muitíssimo bem escrito. Conta-nos como é que tudo o que agora se passa já era sabido desde há muito. Desde o século XIX que existiam indícios de aquecimento global, confirmados nas décadas de 1920 e 1930, reiterados por cientistas eminentes nos anos 50. O livro fala de heróis e vilões, do modo como alguns, como James Hansen e Rafe Pomerance, tiveram a coragem de nunca baixar os braços; do modo como outros, como o infame John H. Sununu, chefe de gabinete de Bush Pai (até ser despedido por desvio de fundos públicos), tudo fizeram para boicotar compromissos que poderiam ter mudado o rumo de tudo, de tudo. O livro não é maniqueísta nem tem a raiva de um ajuste de contas. Provavelmente, como diz Rich, os países que se dispunham a subscrever acordos para limitar as emissões de CO2 não os iriam cumprir, nem estavam sequer dispostos a cumpri-los de boa fé. Mais ainda, o livro não é partidário, e mostra como muitos Republicanos foram dos principais advogados na luta contra o aquecimento global. Mas também mostra como até aí, no plano político, as coisas pioraram, e pioraram muito. Com Dick Cheney, com Donald Trump, com milhões gastos a comprar ou a atemorizar cientistas, com campanhas negacionistas inimagináveis nos anos 70 ou 80. Parece que o mundo está pior, e não apenas no aspecto ambiental. Parece que a América está apostada em perder de vez a liderança moral do mundo. Parece que os sonâmbulos só vão acordar quando for tarde demais. Um livro extraordinário que mostra como chegámos aqui. E agora?
 
 
 

 

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