segunda-feira, 31 de agosto de 2020

Sugestões Feira do Livro.









          O que este livro de Vasco Gil Calado tem de bom, muito bom, acima de tudo, é a sua rara honestidade /uma reportagem sobre a obra, aqui). O livro é fruto de uma investigação séria, profunda e informada sobre o uso de drogas na guerra colonial portuguesa. Haveria mais a explorar: relatórios médicos, documentos oficiais (o livro baseia-se sobretudo em entrevistas, ainda que o autor tenha também frequentado os arquivos), o uso de estupefacientes pelos africanos dos movimentos de libertação, sempre relatado nas denúncias dos ataques dos «turras», o enquadramento das drogas no quotidiano dos soldados, contemplando outras dimensões, como a sexualidade (hetero e homo), etc. O mais importante de tudo, como se disse, é a honestidade do autor. Ao invés de forçar a nota e tentar demonstrar à outrance que as drogas estavam disseminadas entre as tropas portuguesas, Vasco Gil Calado conclui que elas tiveram «relevância» mas não excessiva, nem uma dimensão comparável, por exemplo, ao consumo de álcool. Quando um investigador se dedica a um tema controverso e complexo, de acesso dificílimo, e evita resvalar no sensacionalismo Apocalypse Now e na tentativa de demonstração a martelo de uma «tese» bombástica, quando um investigador tem o dom da contenção e do rigor, a sobriedade que a verdade impõe – devemos ficar muito agradavelmente espantados. Um feito muito raro, nos dias que correm. Ah, outra coisa: o livro é muito, muito bom – e muito bom de ler. Assim, dá gosto. 

















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