segunda-feira, 24 de fevereiro de 2025

Estamos marcados por marcas que não são só sucesso nacional, correm mundo.

 


 

Quando a sociedade de consumo corria à velocidade de cruzeiro tinha bastante sentido referenciar-se um bem de consumo, altamente perecível, semiduradouro ou duradouro, destacando uma marca, BIC, OMO, Gillette, Frigidaire, Michelin, Olá, Pudim Boca Doce. Obviamente, com o poder da globalização e no quadro do hiperconsumo, este fenómeno de marcação mudou de paradigma. Cada país tem uma história própria. Como se escreve no livro Marcas Que Fazem Portugal, por Margarida Vaqueiro Lopes, Fundação Francisco Manuel dos Santos, Portugal é um dos Estados-Membros com mais pedidos de registos de marcas, nas últimas duas décadas. Mas temos marcas que nos são profundamente familiares, e algumas delas já conquistaram o mundo, muito antes do quadro da globalização em que vivemos: basta pensar no Mateus Rosé, conservas Ramirez ou o Porto Croft. A marca é uma identidade, uma operação de confiança, um peso pesado no consumo material e imaterial, sente-se apego e segurança, é quase uma antecipação de satisfação.

Estas marcas que percorrem o país e o estrangeiro não andam em concorrência com os chamados produtos brancos. O consumidor que vai ao Lidl, ao Aldi ou ao Continente e procura produtos que têm referência comercial destas cadeias de hipermercados sabe perfeitamente que está a escolher um produto um tanto económico, tecnologicamente perfeito e seguro, estas cadeias comerciais estão permanentemente vigilantes de que um fiasco gera um cenário aterrador.

A autora de Marcas que Fazem Portugal fez uma escolha de dez marcas, é uma seleção que obedece a critérios de sucesso, mesmo que tenha havido paragem ou falência empresarial, deu-se depois uma retoma e a marca é de novo acarinhada e a aparece nos escaparates pelo mundo fora.

Tudo começa com a Bênamor, tem um século, nos laboratórios do Campo Grande apareceu um creme de rosto, é produto da Nally, além do creme do rosto, creme de mãos Alantoíne. A Nally parecia que ia desaparecer nos anos 1980, no início do novo século as coisas mudaram, houve uma retoma bem acolhida por novos consumidores. Nos anos 1930, a Bênamor criou um pó de arroz, juntou-se depois uma água-de-colónia a uma pasta de dentes e depois um petróleo para tratamento antiqueda. Abriu estabelecimento em Espanha e tem um acordo com a TAP para os produtos que integram as bolsas fornecidas aos passageiros em classe executiva.

Quem diz café diz Delta, hoje um conglomerado de dezenas de empresas, é 100% familiar. A história do Rui Nabeiro é por demais conhecida e como revolucionou a vida de quem vivem em Campo Maior. A Delta tem sabido pôr as pedras em todos os tabuleiros, tanto se bebe Delta na cafetaria como em casa graças às máquinas de café expresso. Há Delta com várias siglas, fazem-se parcerias com artistas, às vezes parece não haver limites para a elasticidade de um produto a que se associa popularidade e exclusividade.

O Mateus Rosé tem mais de meio século e em 2022 representava mais de 10% de exportações de vinhos nacionais. É a história do maior sucesso de sempre de uma marca nacional: um vinho rosé fresco, vibrante e ligeiramente gaseificado metido numa garrafa que parece um cantil, Mateus Rosé é Sogrape, a autora fala de ícones que são apreciadores de tal vinho que em Portugal é um tanto mal-amado, os rosés não podem competir com gente habituada a tintos robustos e a brancos frutados. Dado curioso, escreve a autora, o mercado nacional continua a ser muito importante para o Mateus Rosé, com vendas em Portugal a representarem entre 15 a 20% das vendas globais.

Quando já se falava de Olaio no pretérito, este mobiliário que entrou nos lares portugueses entre as décadas de 1930 e 1980, voltou a ganhar vida, a partir da segunda década deste século a Olaio renasceu com a qualidade e exigência de sempre. “Os móveis Olaio – mesas de jantar, consolas, estantes, banquetas, secretárias ou sofás – continuam a ser 100% made in Portugal, o que contribui para valorizar a marca numa altura em que o mercado procura autenticidade e qualidade. Quem está à testa do negócio quer continuar a inovar e cumprir tudo aquilo que promete: qualidade, intemporalidade e exclusividade.

Há um papel higiénico que nunca é tema inadequado em temas de conversa, chama-se Renova, conta-se a história da empresa que tem a sua sede ali para os lados de Torres Novas, a Fábrica de Papel do Almonda, há para ali espírito inventivo que se farta, o papel higiénico preto rompeu com preconceitos, agora não faltam as cores, usa-se na comunicação que se trata da marca de papel higiénico mais sexy do planeta, mais que uma história de sucesso é um case study de prodígio imaginativo.

Já houve a pasta medicinal Couto, o medicinal caiu, chegou a ser um dentífrico de vanguarda, depois apareceram a Colgate e a Pepsodent, a tecnologia desenvolveu-se, a Couto, no presente, mantém a estratégia de não estar à venda na grande distribuição, conhece uma boa percentagem nas expotações, e tem o seu nome associado ao restaurador Olex. “Apesar da pasta Couto continuar a ser o produto de referência -  da fábrica saem todos os anos cerca de 700 mil bisnagas -, agora há também águas de colónia, cremes de barbear, desodorizantes, sabonetes (o único produto feito fora da Couto), géis de banho, cremes hidratantes, colutórios, cremes de rosto e até uma pasta dentífrica com flúor.”

A senda destes produtos que percorrem Portugal e o mundo dão pelo nome de conservas Ramirez, sapatilhas Sanjo ou Vista Alegre, a marca que em 2024 celebrou dois séculos de história, e também a Viúva Lamego, uma fénix renascida, parecia um empreendimento no fundo ganhar vida;  e o Porto Croft é uma das várias marcas desse vinho que é referenciado em obras-primas da literatura mundial, a escolha do Croft , tem a ver com as centenas de anos da marca e da casa vinhateira, tudo isso é contado ao pormenor, os tremendos desafios por que passou a marca, e como se impõe nos mercados internacionais.

A autora, em jeito de conclusão recorda ao leitor que há factos curiosos transversais a todas as marcas: a idade avançada das empresas que detêm cada uma das referências, algumas têm um caráter profundamente familiar, e terem o prestígio sólido de deixarem o passado sem deixarem de olhar para o futuro. E faz-nos a chamada de atenção de que muito provavelmente muitas outras marcas têm a sua atividade muito perto de cada um de nós. Porque as nossas marcas fazem parte de um Portugal que continua a ter muito mais para dar ao mundo do que apenas bom tempo, muitos quilómetros de praia e um povo acolhedor.

Uma boa leitura, do produtor ao consumidor. 


                                                        Mário Beja Santos





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