Jules Feiffer
David Levine
Robert Crumb
Saul Steinberg
Al Hirschfeld
1. Um grande cartoonista: Jules Feiffer
Entre os grandes
cartoonistas norte-americanos, os meus entusiasmos incluem sobretudo três nomes
cimeiros do cartoon: Jules Feiffer, David Levine e Robert Crumb, sem esquecer um
quarto artista, o novíssimo Art Spiegelmann,[1]
ilustrador judeu do New Yorker – como
os demais atrás citados, com excepção de Crumb – que faria entrar a arte da BD
no mundo da Shoah, com a famosa série de álbuns do Maus. Ainda em relação a estes autores, deveria talvez acrescentar que
uma das minhas mais velhas paixões, e isso desde os anos 60 mantida, através da
leitura semanal do Sunday Times de
Londres, foi Jules Feiffer, de que só me daria conta de ser um famoso
ilustrador e autor de estórias e diálogos na América do Norte, além de
guionista de alguns filmes célebres.[2] Uma
das suas obras mais interessantes, intitulada Jules Feiffer’s America from Eisenhower to Reagan (1982), reuniu a
suas estórias em BD acerca da vida, da política, dos sonhos e malogros
americanos.[3]
Feiffer, nascido em 1929,
no Bronx nova-iorquino, trabalhou com o famoso desenhador Will Eisner[4] desde
os anos 40, sendo autor de variados livros para crianças de grande sucesso
(v.g., The Man in the Ceiling, A Barrel of Laughs, etc.), guionista de
filmes (Carnal Knowledge, de Mike Nickols) e de peças teatrais, além colaborador
activo de grandes jornais e revistas, como Los
Angeles Times, The New Yorker, Esquire, Playboy, The New York Times (1997-2000),
recebendo um Oscar pelo seu desenho animado Munro
(1961), e tendo ainda ensinado arte dramática e desenho em algumas
universidades americanas (Southampton College, Yale School of Drama, Arizona
State University, etc.). Em 1986 recebeu o Pulitzer Prize de humor e em 2004
foi acolhido no Comic Book Hall of Fame. Entre as suas colaborações mais
assíduas e lidas, assinale-se aquela que manteve anos a fio na revista The Village Voice. Da sua antologia Jules Feiffer’s America recordemos alguns dos seus cartoons mais
incisivos referentes aos períodos em que Nixon, Ford e Reagan foram presidentes
da América do Norte.[5] Por
exemplo, aqui temos Nixon, em oito perfis, dizendo: “se o povo americano está
farto do Vietnam… então não falemos mais disso… se o povo americano está farto do
Laos…então não falemos mais disso…se o povo americano está farto de direitos
civis… então não falemos mais disso… de que falaremos então?... de poluição”(p.144).
Depois vemos Nixon, de camisa de dormir
e com um castiçal de vela na mão,
a dialogar com o Pai Natal: “O que é que 1972 nos vai trazer? Mais
inflação…mais desemprego…uma economia estagnada… a mesma guerra de sempre… e
uma desastrosa campanha eleitoral…(Nixon, alarmado, deixa cair a vela). E você
diz que se chama Pai Natal?... E você diz chamar-se Presidente?”(p.160).
Depois, um gorila com a cara de Nixon, empoleirado no Capitólio, vai desfazendo
tudo, enquanto a multidão, reunida em redor, comenta: “Ele está a mastigar o Congresso…
está a devorar o Tribunal… está a desfazer a Constituição…é melhor a gente
ver-se livre dele!... não podemos!... porque não?... porque isso despedaçaria a
nação!”(p.165). Depois, temos Ford a conversar com Henry Kissinger: “Henry,
haverá alguma coisa errada comigo?... Nada, sr. Presidente… Então como é que eu
estou mais à vontade com ditadores fascistas do que com chefes de Estado
democráticos?... Fazemos bons negócios com ditadores, sr. Presidente… Mas como
é que estou mais à vontade com ditadores fascistas do que com ditadores
comunistas?... Fazemos melhores negócios com fascistas do que com comunistas,
sr. Presidente… Mas isso não me tornará insensível aos direitos dos povos?… Que
direitos, que povos, sr. Presidente?… Não conheço os direitos civis humanos… estou
a ficar com dor de cabeça…Um momento, sr. Presidente (Kissinger afasta-se e
chega outro político: Como vai Jerry? o Henry mandou-me ter consigo…)”(p.170)
2. David Levine, o
Daumier americano
David Levine (Brooklin,
NY, 1926-29-XII-2009)[6] nasceu em Nova Iorque sendo filho de
Harry Levine, dono duma fábrica de roupas, e de Lena, enfermeira e militante
política de simpatias comunistas. David estudou pintura no Instituto Pratt e
depois seguiu aulas na escola de arte da Universidade de Temple, em Filadélfia
(1946), servindo no exército, logo a seguir ao fim da guerra, completando
depois os seus estudos artísticos na Tyler School. Colaborou em jornais
técnicos, fez aguarelas e pintura, fundando em 1958 um grupo de artistas, o
Painting Group. Nos anos 60 publica ilustrações de índole política na revista Esquire, assim como na The New York Review of Books desde que
esta foi fundada, em 1963, ilustrando-a com mais de 3.800 caricaturas de
figuras literárias, políticas, mediáticas, etc., assim como em jornais e
revistas, no New York Times, Rolling Stone Magazine, Washington Post, The Nation, The New Yorker,
Time (entre as quais, em 1967, o Presidente
Johnson como um rei Lear desesperado e furioso), etc. Está representado em
galerias de arte e museus por todo o mundo, editando em 2008 uma colecção de
cartoons de presidentes americanos por mais de cinco décadas. No prefácio à sua
colecção de figuras literárias, John Updike viu em Levine uma continuação de
Daumier e Tenniel.[7] O seu traço é sempre seco,
como que feito com a ponta duma caneta acerada – na New Yorker dar-se-ia, porém, ao luxo de acrescentar cores aos seus
retratos, suavizando-os –, com uma total falta de complacência para com as
personagens por ele caricaturadas e uma curiosa preocupação de relevo, obtido
por um processo algo oitocentista, pela repetição de riscos cruzados, tudo sito
numa atmosfera de cabeças excessivamente grandes e sombriamente expressivas. No
caso da caricatura de Pessoa, por exemplo, o exagero típico do cartoonista está
no chapéu do poeta, demasiado grande. Uma das suas vítimas favoritas era Nixon,
que Levine desenhou pelo menos 66 vezes, sendo em algumas Deus, um feto ou o
capitão Queeg. No obituário do New York
Times, Bruce Weber sublinhava que as suas caricaturas nunca pareciam
extravagantes, como no caso das de Al Hirschfeld, ou neuróticas, como no caso
de Feiffer, porquanto não se sentia atraído pelo macabro ou pelo excessivo,
sendo antes, em toda a sua carreira, um artista distinto e comentador, já que a
“sua obra não era só irónica mas séria, não só mordente mas profundamente
informada”, o que o tornava o continuador de Daumier e Thomas Nast.[8] Os
seus desenhos foram sempre feitos a partir de fotos dos caricaturados, e só
executava os cartoons após ler o artigos nos quais aqueles iam ser publicados.
Fernando Pessoa
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Sartre
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Richard Nixon
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3. Robert Crumb, o artista da contra-cultura e o seu gato
pícaro
Recordo também Robert
Crumb, talentoso ilustrador, nascido em Filadélfia em 1943, que, desde os anos
60, através duma tradução francesa do Gato
Fritz e do filme que dele tirou Ralph Bakshi (Fritz the Cat, 1972, Warner Brothers), uma excelente adaptação das
aventuras do gato pícaro, felino sexualmente faminto, modelo para toda uma
geração beatnik interessada em
encontrar na BD o equivalente aos aventureiros sexualmente desinibidos e
bastante contestatários de Jack Kerouac e A.xGinsberg. Com Crumb estamos,
talvez, diante do maior talento da BD norte-americana, o maior artista dos jornais
ilustrados da contra-cultura, o mais forte inventor de mitos, modas, atitudes e
catalogador de manias, taras, angústias e obsessões sexuais americanas, a
começar pelas suas, espécie de versão desenhada de homens da beat generation como Kerouac, Ginsberg e
até Burroughs, o mais puro produto dos fabulosos “anos 60” .[9] Uma
edição recente do essencial da sua obra constituirá, deste modo, um monumento
gráfico que o futuro não poderá deixar de visitar: chama-se The R. Crumb Coffee Table Art Book.[10]
Crumb nasceu no seio duma
família desunida de Filadélfia, na qual viu a luz dos seus dias em
30-VIII-1943, sendo seu pai sargento da marinha. Um dos seus irmãos, Charles,
acompanhá-lo-ia inicialmente na sua saga de criador de revistas ilustradas da
contra-cultura, desde os anos juvenis, começando por vender os produtos da sua
imaginação artística à porta do liceu que frequentavam, embora sem grande
sucesso e magros lucros. A família deslocou-se entretanto para a Califórnia e,
depois, para o Delaware e, por fim, para Cleveland, no Ohio. Crumb passou a
desenhar cartões de parabéns, com a ajuda dum amigo, Marty Pals, ao mesmo tempo
que frequentava um grupo de intelectuais boémios, entre os quais encontraria
aquela que seria a sua primeira mulher, Dana Morgan. Entre os seus amigos
achava-se uma figura destacada do Mad,
Harvey Kurtzman, que ficaria desde então associado à sua carreira de artista.
Os seus desenhos publicam-se em algumas revistas do movimento intelectual underground, como Yarrowstalks, até que decide partir para a Califórnia, editando ali
o primeiro da sua célebre revista Zap
Comix (1968).
Nasciam então algumas das
personagens que se associam à sua carreira, como Mr. Natural e o Gato Fritz. O
sucesso das revistas da contra-cultura favorece a sua actividade, aparecendo o
seu nome no Zap, ao lado de outros
artistas de fama como Robert Williams, Victor Moscoso, Harvey Kurtzman, etc.
colabora noutras revistas como East
Village Other, Gothic Blimp Worrks,
Motor City, Yellow Dog, etc., passando os seus desenhos a terem larga procura.
Ralph Bakshi adapta ao cinema de animação as aventuras do seu personagem mais
famoso do movimento da contra-cultura underground
da época, o felino Fritz o Gato, aliteratado, trapalhão, obcecado sexual,
obsceno e delirante caçador de gatas, que salta dos comics para o famigerado filme Fritz
the Cat, a primeira fita do género a ser classificada com a menção “X”, ou
seja, como pornográfica. A verdade, porém, é que, acabado o filme, Crumb se
manifestou decepcionado com ele, preferindo dar o seu Fritz como doravante
morto, por via dum atentado semelhante ao que matara Trotsky, i.e., atingido por
uma picareta no crânio... [11]
Os anos 70 foram difíceis
para Crumb. Além de perder os direitos de algumas das suas criações, como o Keep on truck, teve batalhas legais com
os serviços de impostos e vários outros embaraços e dificuldades que tornariam
as suas obras mais amargas e agressivas. Nos anos 80 tornou-se editor de
publicações ilustradas, acabando por desistir da direcção das revistas,
contentando-se em desenhar as suas capas. Em 1994, um documentário sobre a sua
vida e obra deu-lhe certa notoriedade nacional. A sua colaboração na
prestigiada revista The New Yorker
consagraria esta sua ascensão ao estrelato como cartoonista-mor da
contra-cultura. Algumas produções na pintura e na escultura alargaram,
entretanto, a sua paleta de actividades como artista, assim como a sua fama
subitamente estabelecida valeu-lhe elogios e prémios mas, também, ataques e
remoques virulentos vindos dos meios mais diversos, desde os movimentos
feministas a grupos radicais que lhe encontravam intenções racistas ou piores,
tendo havido mesmo uma edição pirata dos seus desenhos sobre negros, intitulada
“When the Niggers Take Over America”, patrocinada por um movimento que lhes era
hostil... Houve ainda a tentativa de se provar que a sua sexualidade era
misógina ou claramente antifeminista, como no caso das suas celebradas figura
de mulher super-sexuadas, negras ou brancas, que enxameavam as suas páginas,
fêmeas planturosas, muito bien en chair,
que Crumb celebrava com desbragada voluptuosidade.[12]
Em contrapartida, alguns
críticos de arte, como Robert Hughes, sublinharam a filiação de Crumb nuam
linha de grandes artistas satíricos, gráficos e literários, que incluía Dürer,
Rabelais, Swift, Brueghel, Goya, etc. A meio da década de 90, acompanhado pela
sua mulher – e também artista de BD – Aline Kominsky, Crumb emigrou para
França, fixando-se em Sauve, terreola do Languedoc-Roussillon, juntamente com
uma filha, Sophie, e um filho, Jessie.
Recentemente,
entrevistado pelo semanário francês Le
Nouvel Observateur, Crumb resumia a sua carreira deste modo: “Fui educado
na América dos anos 40-50, e num meio no qual a BD tinha um lugar importante na
diversão das crianças. O meu irmão Charles, ainda era mais doido do que eu. Só
estávamos expostos à cultura de massas. Os nossos pais, que faziam parte da
franja inferior das classes médias, não manifestavam qualquer interesse pela
literatura, as artes ou a música clássica. A minha mãe comprava-nos bandas
desenhadas: O Pato Donald, a Luluzinha e esse género de histórias. Também
víamos imenso a televisão. (...). O meu irmão tornou-se um obcecado pela BD,
desenhando sem parar as suas personagens e criando os seus próprios jornais de
BD. Ele era o meu irmão mais velho e muito dominante: depressa me pôs a
desenhar também. Eu era uma criança passiva, influenciável e inteiramente sob a
tutela do meu irmão Charles até à idade de 19 anos! Estou certo de que nunca
seria desenhador sem esta forte presença fraterna durante os anos da aminha
infância e da minha adolescência. Charles suicidou-se aos 50 anos, em 1992. Mas
este estava orgulhoso com o meu sucesso, como um professor que vê o seu melhor
aluno atingir a glória e a celebridade.”[13]
Além do já referido The R. Crumb Coffee Table Art Book, de
proporções excessivas apesar do seu título, editada em 1997, algumas obras
reproduziram as suas ideias sob a forma de entrevistas, como R. Crumb – Conversations (2004), editada
pela Universidade do Mississipi, e um estudo de D. K. Holm com o título de Robert Crumb (2003), uma edição de
Pocket Essentials. Assinale-se ainda um The
R. Crumb Handbook (Londres, 2005). Deve-se ainda a Crumb as magníficas
ilustrações do livro sobre Kafka de David Zane Marirowitz.[14] Em
2009 surgiu o seu álbum bíblico The Book
of Genesis, que seria saudado por Malcolm Jones na revista Time e por Harold Bloom no quinzenário The New York Review of Books.[15]
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4. Saul Steinberg
Ficaria
decerto incompleta esta resenha rápida dos maiores artistas gráficos do cartoon
americano sem uma referência ao extraordinário artista que foi Saul Steinberg
(1914-1999), nascido na Roménia e imigrado para os E.U.A (1940), naturalizado
no ano seguinte, altura em que serve na marinha americana, depressa se
tornando, desde o final da guerra, um dos expoentes máximos da arte
cartoonística do seu novo país, a ponto de lhe ter sido confiada a execução dos painéis frontais do pavilhão
dos Estados Unidos na Exposição Universal de Bruxelas, em 1958 – onde a sua
fantasia logo confrontava a gravidade
retórica do pavilhão soviético em face –, com o seu estilo de elegância
trocista e a graça cáustica deste judeu romeno naturalizado cidadão dos States. Os seus diversos álbuns de
desenhos estão repletos de desenhos de estilo inconfundível, executados com uma
pena aguçada, exprimindo-se de modo extravagante e inesperado, troçando das
ideias feitas e adaptando formas convencionais – v.g., as impressões digitais –
em metamorfoses surrealistas, assim como dando às palavras sentidos e formas
inesperados. Colaborador regular da New
Yorker, desde 1941, e autor de varias capas desta famosa revista cultural,
Steinberg é inseparável da arte da América, caldeada na sua experiência de
judeu europeu imigrado para a sua nova pátria além-Atlântico.
De Steinberg disse o
autor de As Bruxas de Eastwick que
não tinha sotaque mas sim uma “tendência não-americana para a precisão
epigramática”, o que não o deixa de o ligar a uns quantos outros exilados
romenos do século XX, como Brancusi, Tzara, Ionesco e até Cioran.[16] Tendo feito o seu doutoramento em
arquitectura, na Itália (1940), dessa arte que nunca praticou guardaria,
contudo, a obsessão das linhas essenciais de construção espacial e dos seus
infinitos labirintos, partindo tardiamente para a América (em 1940), tal como
Nabokov ou Milos Forman, o que lhe tornou urgente inventariar uns quantos
emblemas essenciais do Sonho (ou do Pesadelo) Americano, como cow-boys, mulheres de botas e chapéus de
plumas marciais e Mickey Mouses armados e implacáveis, automóveis góticos e
edifícios alucinantes que ele descrevia com a sua caneta de ponta fina, linear,
arquitectural, especialmente apta a descrever um mundo freneticamente habitado
por gentes, cenários e animais grotescos, gente que vive em gavetas, no meio de
cidades tentaculares, desumanas, onde imperam viaturas disformes...[17]
Steinberg foi, em suma, o
arquétipo do intelectual europeu que passeia a sua visão critica, ácida e
sempre céptica por um mundo novo cheio de fantasmas, bruxas, duendes, monstros,
objectos extravagantes e excessivos – nada mais sintomático do que o tamanho e
a exageração retórica das carroçarias e do design
dos automóveis americanos, desde os veículos mais “normais” às limusines demasiado longas –, casas
góticas e tribos exóticas, entre as quais os native Americans não seriam decerto as menos bizarras. Enquanto Norman
Rockwell pintava o dia-a-dia e os dramas maiores e menores do seu país como uma
visão serena e indulgente, ainda que simpatizando, obviamente, com a acção dos
que se batiam pelos negros ou contra a intolerância, numa perspectiva toda
rooseveltiana – não foi ele que deu forma as famosas “Quatro Liberdades” da
América (“Freedom of Speak”, “Feeedom from Want”, “Freedom to Worship” e
“Freedom from Fear”, recentemente reeditados em selos postais americanos? –,
Steinberg lembrava mais a visão que de Nova Iorque nos deu Céline no seu
romance cruelmente realista Viagem ao Fim
da Noite. Uma derradeira referência a um álbum feito de colaboração com a
fotógrafa da agência Magnum, Inge Morath, entre 1959 e 1963, e editado com o
título muito adequado de Masquerade,
em 2000[18]:
trata-se de uma série de fotos divertidas e algo enigmáticas de várias pessoas
com máscaras de cartão, papel de sacos embrulho na cabeça, em atitudes algo
misteriosas, com um fundo surrealista evidente, algo misterioso, numa atmosfera
mais tipicamente steinberguiana.
Masquerade
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5. Al Hirschfeld, o Fred Astaire da pena de tinta
Um outro grande artista
gráfico americano merece ainda ser referido: o prodigioso desenhador,
caricaturista do mundo do cinema e do teatro chamado Al Hirscheld (1903-2003),
o “Fred Astaire da pena e da tinta” que, durante 50 anos, fez as caricaturas
das artes e espectáculos do New York
Times.[19] Numa versão recente do
famoso Fantasia dos estúdios Walt
Disney incluiu-se um desenho animado seu, com a música da Rhapsody in Blue de Gerswhin. Em 1991, já arquicélebre, Hirschfeld
foi o primeiro artista gráfico americano a ter selos dedicados à sua arte, com
caricaturas de Bucha a Estica, e doutros atores. O êxito desta série filatélica
foi tal que, em 1994, o United States Postal Service lançou uma nova série,
agora com retratos de estrelas do mudo, Charlot, Rudolfo Valentino, os
“Keystone Cops”, Harold Lloyd, Pamplinas, etc.
João Medina
[1] As obras mais recentes de Art Spiegelmann são
Bons Baisers de New York, pref. de
Paul Auster, Paris, Flammarion, 2003, com a sua colaboração na famosa revista The New
Yorker, incluindo a capa sobre o Pai
Natal que a revista censurou por o representar a urinar na neve (pp.26-7) e o
enorme álbum (25x36cm) In the Shadow of
No Towers, s.l., Pantheon, 2004, ilustr., dedicado ao atentado contra as Torres
Gémeas de Manhattan.
[2]
Lembremos alguns álbuns de desenhos de Jules Feiffer: Jules Feiffer´s America: from Eisenhower to Reagan, Nova Iorque,
Knopf, 1982. The Explainers, Nova Iorque, The New American Library, 1964 .The Penguin Feiffer, Hardmosndsworth,
Penguin Books, 1964. Hold Me!,
Nova Iorque, Random House, 1962.
[3]
Destaquemos deste volume, Jules Feiffer’s
America from Eisenhower to Reagan (Nova Iorque, Alfred Knopf, 1982), alguns
dos seus temas centrais ou mais recorrentes: o amor (pp. 39, 41, 44), o sexo e
a política (p.39), os negros (pp.52, 108), a Bíblia como livro (p.36), a dança
(pp.46, 50, 89, 92, 104, 107, 128, 131, 136, 206/207, 214, 292/293, etc.), o
Pai Natal (p.244), ser criança (p.186), o Tio Sam (p.118), Ford e Kissinger
(pp.171/173, 191/193), Fred Astaire (p.185),
Eisenhower (p.24), Kennedy (pp.47, 67), Nixon (pp.46, 116, 117, 133,
143, 145, 159, 160/163), L. B. Johnson (pp.81/2, 92, 109, 115), Jimmy Carter
(pp.197/8,204, 223), pacifismo (p.66), etc.
[4] Will
Eisner (1917-2005), criador do famoso herói da BD Spirit (1946), tendo tido Feiffer como seu colaborador, autor de
vários romances gráficos (A Contract with
God, The Building, Moby Dick, etc.) e duma BD dedicada à célebre
falsificação redigida com fins anti-semitas, Os Protocolos
dos Sábios de Sião, intitulada The
Plot, Nova Iorque e Londres, W.W. Norton & Company, pref. de Umberto
Eco, pp.V-VII, ele mesmo autor dum romance sobre o mesmo falsificador, O Cemitério de
Praga.
[5] Veja-se Jules Feiffer’s America from Eisenhower to
Reagan: pp.15-123 (Eisenhower), pp.125 ss (Nixon), pp.195-227 (Jimmy Carter),
pp.169-193 (Ford) e pp.229 e ss (Reagan).
[6] Veja-se o seu obituário “David
Levine, biting caricaturist, dies at 83” , por Bruce Weber, New York Times: 29-XII-09. No jornal Le Monde, o obituário “David Levine”, por Yves-Marie Labbé,
2-I-2020, p.17. – Garry Wills, “On David Levine (1926-2009)”, The New York Review of Books,
11-II-2010, p.4. O crítico lembra que Levine abordou um leque imenso de
temas e, no tocante a figuras, representou pessoas desde Jonathan Sumption até
F. Pessoa (este em 1972), acrescentando: “Levine foi um homem de alta
inteligência, vastas leituras e sólido treino artístico.(...). Mas, mais do que
isso, tinha grande penetração psicológica quanto aos seus assuntos.” Veja-se a sua obra, escolhida e apresent. por
John Updike, Pens and Needles. Literary
caricatures by David Levine, Nova Iorque, Dorset Press, 1989 (o seu
conhecido cartoon de F. Pessoa não vem reproduzido nesta antologia de figuras
literárias).
[7] Pref. de J.Updike a David Levine, Pens and Needles, p.VI.
[8] Bruce Weber, obit. citado, The New York Times, 29.XII-98.
[9] Um dos seus colaboradores mais conhecidos foi o
cartoonista da série American Splendor,
Harvey Pekar (Cleveland, Ohio, 8-X-1933 – id.,12-VII-2010). Houve uma adaptação
ao cinema da sua série de BD American
Splendor, em 2003, dirigida por Shari Springer Berman, Robert Pulcini et
alii, adaptando diversas estórias da vida quotidiana em Ceveland (Ohio)
descritas por H.P. nas suas revistas de BD. O DN deu destacado obituário, em 14-VII-2010, assim como a revista Time, em 26-VII-10 (artigo de Joe Sacco)
e Babelia, suplemento de El País, em 24-VII-10 (art. de Antonio Muñoz Molina, p.8). Há uma ed. espanhola das
suas BDs, intitulada American Spendlor:
los Cómics de Bob e Harvey Prekar y Robert Crumb, La Cúpula.
[10] R. Crumb, The R. Crumb Coffee Table Art Book, s.l, Back Bay Books, 1998,
ilustr. Esta obra, de dimensões invulgares (28 x 34 cm ), não inclui Fritz the Cat, que pode ser encontrado
na obra de R. Crumb, Head Comix,
Paris, Éditions Actuel, 1971, pp.73-95. Sobre R. Crumb veja-se a ilustração
(capa da New Yorker) e a nota
biográfica que lhe dedico no “dossier” do nº 12 da revista Clio, pp. 278-279.
[11]
Vejam-se as páginas com a sua aventuras de Fritz em R. Crumb de Head Comix, Paris, Actuel,1971, pp.73-95.; as mesmas páginas, em
inglês, no R. Crumb Head Comix, Nova
Iorque, Simon & Schuster, 1988, 10
pp. não paginadas, e no The R. Crumb
Coffee Table Art Book, pp.96 (capa duma revista) e pp.50-53 (um episódio de
Fritz).
[12]
Exemplos no The R. Crumb Coffe Ttable...
já citado: pp.108 (uma negra), 111, 113, 112 (uma negra e uma branca muito sexies), etc. Um texto de R .C. sobre as suas mulheres sexies de grandes pernas, fortes nádegas
e seios protuberantes que ele desenhou desde os 17 anos: p.109, cf ainda
pp.124-128 e 224 ss (mulheres grandes e suas vantagens).
[13] Robert Crumb, “Mes âges d’or”, Le Nouvel Observateur,
Paris, 17-VII-2008, pp. 22-25; p.22.
[14]
Robert Crumb (desenhos) e David Zane Mairowitz (texto), Kafka, Arles, Actes Sud, 1996 (trad. francesa do livro de David
Zane Mairowitz intitulado Kafka for
Beginners, de 1993).
[15] R.Crumb, The Book of Genesis illustrated by R.Crumb, Nova Iorque e Londres,
W.W. Norton e Company, 2009 (dedicado a Aline). – Malcolm Jones, “In the beginning
was the word...Now come the drawing”, Time,
2-XI-2009, pp.60-51. – Harold Bloom,”Yahveh meets R.Crumb”, The New York Review of Books, vol. LV, nº19,
3-XII-09, pp.24-25. Bloom, depois de lembrar os grandes pintores da Bíblia,
como Miguel Ângelo, Tintoretto, Rembrandt e Blake, vê a versão do Génesis de
Crumb em BD como uma versão na linha de Ben Shahn, passando sobretudo a
considerar Iavé como uma figura literária, uma personagem como Panurgo, Sancho
Pança ou Falstaff. E o crítico da Time saúda
nesta versão bíblica de R.C. uma cuidadosa versão feita com “meticuloso realismo”,
realismo que “restaurava o mistério no coração da lenda.” (p.61); e observa que
esta versão do famoso texto funciona tão bem porque não é reverenciosa: “Crumb
consegue um milagre todo seu; fazendo duma das mais velhas histórias do mundo
uma coisa nova.” (loc. cit.).
[16] John Updike “On Saul Steinberg (1914-1999)”, The
New York Review of Books, 24-V-1999,
pp.12-13.
[17]
Veja-se, v.g., o seu álbum de desenhos The
Passport, Nova Iorque, Harper & Brothers, 1954, paginação não numerada.
Steinberg publicou ainda duas outras recolhas de desenhos: Saul Steinberg: The Discovery of America (Nova Iorque, Alfred
Knopf, 1992) e The Labyrinth (Nova Iorque,
Harper, 1960).
[18]
Veja-se Saul Steinberg e Inge Morath (fotos), Masquerade, Nova Iorque, Viking Studio, 2000, não paginado.
[19] O
meu estudo sobre Charlot, no livro Cinema
e História (Lisboa, Centro de História da Universidade de Lisboa, 2004), inclui,
em extratexto, uma magnífica ilustração de A. Hirschfeld sobre o filme O Grande Ditador. Veja-se ainda David Leopold, Hirschfeld’s Hollywood. The film Art of Al Hisrchfeld, pref. de L.
Gelbart, Nova Iorque, Harry N. Abrams,
2001, ilustr., nomeadamente as seguintes ilustrações: Bucha e Estica (pp.12, 37
e 46), Gene Kelly e Debbie Reynolds na famosa cena cantando e dançando “Singing
in the rain” (p.23), Charlie Chaplin (pp.27, 54, 55), Ernst Lubitsch (p.34),
Peter Lorre no M de F. Lang (p.43), os
Irmãos Marx (pp.44, 45), Cary Grant (p.68), Fred astaire (p.71), Woody Allen
(p.82), Spielberg dirigindo uma cena do Salvando
o Soldado Ryan (p.87), Hollywood
(p.90), Al Hisrchfeld (p.92). No Fantasia
2000 (prod. Walt Disney Home Video,
75 minutos, 2001, sobre peças musicais de Chostakovitch, Respighi, Gershwin,
etc.), o Rhapsody in Blue (1924) de
George Gershwin (Brooklin, N. Iorque, 1898-Hollywood, 1937) é ilustrado com
deslumbrantes desenhos de Hirschfeld.
Obrigado por este post. Conheço alguns dos autores, outros não. Cresci com BD francófona e em cartoons era o Wolinksy, o Sempe, o Reiser... acho que me marcaram. Os americanos vieram depois. O Maus do Art Spiegelmann é uma obra prima... Se não conhece, recomendo mesmo o From Hell do Alan Moore, isto no género "graphic novel". E pronto, uma vez mais obrigado pelo post.
ResponderEliminarIsto é que é 'serviço público'!
ResponderEliminar:)