Casas Vazias
Fotografia de Filipe Condado
Cores garridas, luzes quentes e direccionadas,
superfícies polidas e refulgentes… algumas imagens de Casas Vazias podiam ser de um catálogo de decoração, outras sugerem
vadiagens entre o pop e o burlesco. Quase nenhuma nos faz chegar ao vazio. A
princípio estranha-se a incoerência. Depois as imagens entranham-se e o
desconcerto pacifica-se.
P
– Há muito pouco vazio nas tuas fotografias, sei que é um comentário que já recebeste
de muita gente que visitou a exposição. «Falta pó…» já te disseram, não foi?
Concordas com estas opiniões que identificam uma aparente contradição entre o
título e o tom da tua exposição? O que achas que leva as pessoas a terem essa
percepção?
É verdade, de facto algumas pessoas não
viram o que estavam à espera mas sim, e sobretudo para mim, viram o que não estavam à espera. Fascina-me a
ideia de ser capaz de mostrar um lado das coisas e das realidades que, numa
primeira instância, nos passa despercebido.
Como dizia Roland Barthes, «a fotografia
ganha existência quando provoca algum tipo de aventura». Penso que esta frase
ilustra muito bem este desafio. De facto, parece haver muito pouco «vazio» nas
minhas fotografias porque o meu interesse concentrou-se nos objectos que
pareciam habitados ou ainda vividos, conferindo-lhe, assim, um carácter mais
misterioso.
As casas também tinham muito lixo e
algumas apresentavam vestígios de ocupação ilícita, mas não era isso que eu
queria mostrar. A fotografia tem este poder como forma de comunicação; como
forma de mostrar uma realidade que é sempre parcial e que é fruto de uma
decisão do autor.
P
– Este projecto surge no seguimento de outro, «Casas Perdidas». Nesse, os
desígnios cénicos eram óbvios: querias fazer suspender móveis sobre empenas de
prédios ruídos para simular uma reocupação imaginária daqueles espaços. Achas
que é o mesmo princípio que está subjacente à manipulação dos objectos que
fizeste nas «casas vazias»?
Sim. Sendo que no projecto «Casas
Perdidas» a manipulação era total.
P
– Em ambos os projectos das casas – perdidas ou vazias – há uma deliberada
manipulação do real. O que procuras na fotografia? Achas que a fotografia te
serve mais para brincar com a realidade do que para tentar captá-la? E em que
medida é que achas isso pode ser um elemento de coerência no teu trabalho?
Não sei muito bem o que é a realidade,
ou melhor, o que é usar a fotografia como meio para captar a realidade. A
própria fotografia puramente documental ilustra ou apresenta uma realidade que
é parcial e muito condicionada pelas decisões do autor... Um dia, um grande
amigo disse-me que achava que a minha fotografia era muito asséptica, muito
cuidada.
Nisto, parece-me haver um fio condutor
no meu trabalho. Interessa-me olhar demoradamente para aquilo que quero
retratar; tenho sempre muita preocupação com todos os elementos e com a sua
composição. A minha fotografia raramente apresenta um instante irrepetível.
Exposição patente na Sala do Veado, Museu
Nacional de História Natural
Até dia 3 de Março
Isabel Corrêa da Silva
Sem comentários:
Enviar um comentário