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Há poucos
dias, na sua página do Facebook, a Joana Delgado referiu-se a Architecture of Density, um dos projectos
do fotógrafo alemão Michael Wolf. Imagens de edifícios em Hong-Kong que parecem
abstracções futuristas. Tecidos estampados em cimento armado, papéis de parede?
Visões captadas ao microscópio de estruturas celulares minúsculas, o que talvez
não ande longe da realidade vivida ali, na aspereza daquele betão todo. Minúsculas partículas, se olharmos cada unidade;
gigantescas obras, se observarmos o todo dos edifícios. Provavelmente, Architecture of Density é a
aproximação mais conseguida às máquinas
de viver de Corbusier. Outro projecto de Michael Wolf, 100x100, mostra o
interior mínimo das casas de Hong-Kong. Para nós, espaços claustrofóbicos. Para
os que lá vivem, talvez não. Aqui vou ser
feliz, dizia um anúncio de uma imobiliária. Para os moradores daquelas casas,
talvez seja mesmo verdade.
Todos
recordam um vídeo do YouTube em que um morador de Hong-Kong, Gary Chang, ele
próprio arquitecto, mostrava com orgulho o interior da sua casa, que se
desdobrava em múltiplos compartimentos através de uma engenhosa estrutura. Uma
trabalheira pegada, andar todo o santo dia a fazer e desfazer o
escritório, desmontar a cozinha, armar o quarto de dormir. Lembra-se dessa
casa às fatias? Vinte e quatro assoalhadas, ao todo! Parecia uma caixinha das Polly Pocket... Mas, para quem lá vive, talvez haja
espaço para a felicidade possível. O modo como vivemos o espaço depende muito
de cada um: é a dimensão oculta,
sobre que escreveu Edward T. Hall. A proxémia é diferente, muito diferente, para
um esquimó ou um nómada do deserto ou para um morador de Tóquio, que cuida meticulosamente do
seu bonsai como se tratasse de um
jardim imenso. Na densidade arquitectónica de Michael Wolf há uma saturação
nauseante: é muita gente junta, um excesso de habitação. Tanta gente junta, mas de gente não há sinais. De facto, não se vislumbra um
ser humano sequer, poucos vestígios existem da presença do homo sapiens. As imagens são silenciosas e evocam o mais completo
anonimato, a desumanização total. Já se comparou o trabalho de Michael Wolf ao
de Andreas Gurski, também ele um mestre na captura da desmesura. Da desmesura padronizada, aquela que torna o mundo um lugar estranho, ainda mais estranho.
António Araújo
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