domingo, 21 de abril de 2013

Mugshots.


     



 
 
 
 
 
 
 
  Os americanos têm uma autêntica obsessão voyeur por retratos policiais. De frente e de perfil, os mugshots (ou mug shots) integram a paisagem visual dos Estados Unidos. Os retratos dos famosos são reproduzidos em canecas, t-shirts e mil e um objectos. Antigamente (creio que já não se usam), existia um tipo de retratos policiais interessantíssimo, os mirror mug shots, em que, numa mesma imagem, graças a um jogo de espelhos, se conseguia captar as três dimensões do rosto de um detido: de frente, perfil esquerdo, perfil direito. A mania é tal que, num interessantíssimo tour pela cultura visual americana, Mark Rawlinson dedica um capítulo (pp. 125s) às imagens da criminalidade, dividindo-o em dois temas: mug shots e cenas de crimes violentos. Destas últimas, uma das mais impressionantes é do grande Weegee, de que já falámos aqui várias vezes. Datada de 1941, intitula-se Their First Murder. Foi publicada no livro de Weegee The Naked City (1945) e mostra um conjunto de adolescentes a contemplar, em festiva curiosidade, o corpo baleado de um autor de pequenos delitos. No meio, uma mulher, familiar do morto, chora a sua perda, enquanto ao seu lado crianças de Brooklyn acotovelam-se para aparecer na imagem. Não se vê o corpo, nem uma pinga de sangue salpica a objectiva.
 
Weegee, Their First Murder, 1941


 
 

         A mesma curiosidade algo mórbida, mas agora com traços muito mais perigosos, fez nascer um colossal banco de imagens (http://www.justmugshots.com/) onde, em poucos segundos, se pode localizar o mug shot de quem quer que seja. Basta ter sido detido, basta ter sido fotografado numa esquadra, e a sua imagem aparece ali, devidamente referenciada. A polícia fornece as imagens? Onde está a presunção de inocência? A abrir o site, os autores defendem-se, alegando «the right to be informed». O direito de ser informado? Salvo casos excepcionais (figuras públicas, etc), ninguém tem o direito de ser informado sobre se A ou B foi detido, identificado e fotografado pelas autoridade policiais. Mais um reflexo do assustador populismo penal que está a fazer despertar o que de pior existe no coração de uma certa América.
 
 
António Araújo


 

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