domingo, 13 de outubro de 2013

Tara perdida.

 
 
 

 











O cadáver de um dos irmãos Collyer

 


 
 
 
A história dos irmãos Collyer é conhecida e demasiado bizarra para ser contada em detalhe. Em 1947, devido a queixas dos vizinhos (é sempre o mau cheiro que espoleta a denúncia…), a polícia de Nova Iorque tentou entrar em casa dos manos Collyer. Nem conseguiu abrir a porta, tal era a quantidade de tralha acumulada até ao tecto. Tiveram de penetrar naquela caverna de lixo e memórias através de uma entrada situada ao lado. Lá dentro, acumulavam-se 130 toneladas de objectos vários, entre quadros a óleo e pianos, fotos marotas de pin-up’s, restos de comida, ratos e baratas, larvas, muita bicharada oportunista, até ministros de Estado e deputados da Nação. Um dos cadáveres Collyer só foi encontrado ao fim de dezoito dias de escavações. Acumular tralha é um defeito mental que quase todos temos. Conheço um, há muitos e bons anos, que leva a coisa ao extremo, mas vive pelo Oriente (nos anos trinta, a vizinhança dos Collyer afirmava aos repórteres que os irmãos viviam numa espécie de «luxo orientalista»…). Outro, que prefere jornais velhos, é também grande amigo, até sou padrinho de uma das filhas. Agora, muito perto de mim, e como ainda no outro dia conversava com a minha querida amiga Fátima, defronto-me com o mesmo problema, tropeçando em tralha diariamente. No meio do lixo, às vezes, caçam-se preciosidades. A acumulação de tralha (a que os americanos chamam hoarding) entrou recentemente para o catálogo oficial das doenças e das perturbações mentais. Diz-se que 2 a 5% dos norte-americanos padecem desse mal, mas creio que, no fundo, quase todos nós (excepto a Patrícia!) temos o bichinho do lixo, sofrendo do vício, ou tara perdida, de ir juntando o inútil, na esperança insana, justificada curiosamente por argumentos racionais, utilitaristas e pragmáticos, de que um dia talvez aquilo seja necessário, valioso… Às vezes, é muito valioso, a ponto de o problema do despejo destas casas com decoração hiper-maximalista ter sido analisado num artigo recente do NY Times. Tralheiros de todo o mundo, uni-vos!
 
 




2 comentários:

  1. Eu, hoarder, filha de outra hoarder, me confesso. E agora?! Há hoarders anónimos? Pelo que leio, a coisa é deveras preocupante...
    Socorro!

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  2. "Os Americanos chamam hoarding..." Como será que os Ingleses chamarão ao fenómeno ? E em que lingua ...? Fico curioso em saber.

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