sábado, 8 de fevereiro de 2014

Os potes etruscos.

 
 
 
 

 
 
           “Lembra-se um de falar no leilão do diplomata Zéa Bermudez, o qual reunia às qualidades do mais excelente homem uma pequena colecção de arte com quatro potes etruscos.
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Ao ouvir falar pela primeira vez durante toda a sua longa carreira parlamentar em quatro potes etruscos, mas recaindo imediatamente em si com maravilhosa presença de espírito, Câmara e Governo menearam as cabeças familiarmente, como se cada um dos legisladores não tivesse feito desde muito pequeno outra coisa senão jogar a púcara com potes desses.
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Houve  um assentimento geral na assembleia, e os gestos e as vozes exprimiram com unanimidade:
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-         Oh! Sim !... os potes etruscos... conhecemos perfeitissimamente !
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-         O país, Sr. Presidente, não pode consentir que preciosidades de tão inestimável valor artístico saiam do Reino para ir enriquecer os museus estrangeiros.
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-         Apoiado ! apoiado ! – opinou o Sr. Presidente do Conselho, convicto, e subitamente iluminado pela providência como um vidente da Etrúria em potes.
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E a Câmara em peso, por todos os votos menos um, votou um crédito suplementar de 5 contos de réis. Para quê, senhor? Para proteger a arte nacional, que nem escolas tem, nem mestres, nem discípulos, nem modelos, nem livros, nem coisa nenhuma, alem do Sr. Conde de Almedina, e a qual a Câmara, ao cabo de vinte anos de esquecimento ou de desdém, se lembra de patrocinar afinal com 5 contos extraordinários ! Cinco contos por quatro cacos feiíssimos, meu rico Senhor!...”
 
(Ramalho Ortigão, As Farpas, 1883)
 
 

 

 
 

2 comentários:

  1. Exemplar.
    Se acaso aconteceu, os potes ainda estão para aí, por outro lado se tivessem gastos os 5 contos noutra coisa qualquer por insignificante nada teria ficado.
    É o que vai acontecer caso os Mirós sejam vendidos.
    O Estado gastará num minuto os milhões como sempre o soube fazer.

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  2. E a história dos vasos gregos que estão em exposição na reitoria da UP? Também é exemplaríssima, pois, como os mirós, também os vasos entraram na posse do estado 'derivado a' um roubo colossal e desavergonhado.

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