quarta-feira, 29 de novembro de 2023

Exorcizar o tenebroso sistema português do pobrete mas alegrete.

 




  

O historiador económico Nuno Palma vem atirar-se como gato a bofe a este país pobre, a viver dos fundos europeus, cada vez mais divergente da União Europeia, em que a forças políticas dominantes e os eleitores parecem estar de acordo com este marasmo que nos encaminha para o empobrecimento: As Causas do Atraso Português, Repensar o passado para reinventar o presente, Nuno Palma, Publicações D. Quixote, novembro de 2023. Não vem com meias medidas, zurze muitos e indistintamente: “Quase todas as análises ao estado do país feitas na praça pública pecam por miopia: como desconhecem a profundidade histórica do atraso, cometem erros sistemáticos e anunciam diagnósticos inúteis, quando não prejudiciais. Quem discursa tem também frequentemente um marcado enviesamento político e não declara os seus conflitos de interesses.” E vêm testemunhos a paraninfar esta obra que promete revelar a profundidade histórica do atraso português: é uma pedrada no charco de algum unanimismo académico ou acriticismo cultural que tem secado o debate crítico sobre a História de Portugal; um livro fundamental para perceber o persistente atraso económico português, etc., etc.

Nesta incursão ensaística, o professor catedrático discreteia sobre tempos em que estivemos menos divergentes da demais Europa, dá-nos números sobre a evolução da população portuguesa, entre outras coisas ficamos a saber que Portugal, pelo menos até finais do século XIX, era um país como os outros da Europa Ocidental no que toca às normas sociais e familiares; houve períodos, sobretudo aqueles que estiveram cronologicamente mais em convergência com a demais Europa em que tínhamos instituições em que o monarca ouvia e tinha que respeitar a opinião dita popular, com os tempos de D. João V, tempos de Maldição de Recursos, em que nadámos em ouro, fomos divergindo; entre 1950 e 2000 Portugal assistiu a algo parecido com um milagre económico, isto depois de o autor nos afiançar que o Império não teve um efeito positivo claro e acentuado para o desenvolvimento do país, embora tenha tido uma influência importante na revolução científica; o cúpido Marquês de Pombal, que pôs toda a família a comer na gamela das riquezas existentes e até espoliadas, ao expulsar os Jesuítas, deixou-nos o sistema educativo de pantanas; o ouro do Brasil foi uma maldição, serviu para aparato e consumo de ostentação, deixou para aí umas riquezas em edifícios e obras de arte, o desenvolvimento foi nulo; é importante acabar com essa treta da monarquia liberal, não houve reformas sérias, era um liberalismo por decreto e fachada, segue-se o falhanço da I República, construiu algumas escolas, é certo, mas nada parecido com as que deixou o Estado Novo, uma ditadura que abriu porta à industrialização, recuperou do atraso educativo do país, tinha um corporativismo de fachada, impõe-se olhar o Estado Novo com objetividade, coisa que a historiografia dos vencedores não admite. O regime atual acena em permanência com o conservadorismo, o país pobre e rural, a historiografia dos vencedores (não sabemos se começou em Vitorino Magalhães Godinho, até mesmo António Sérgio, ou Fernando Rosas ou João Medina, o autor não esclarece quais os réus) proclama falsidades sobre Salazar e o Estado Novo.

E estamos chegados à época contemporânea, o historiador tem frases grandiloquentes: “Portugal é um país onde o passado pesa muito.” Sendo historiador, o que pressupõe rigor e objetividade e distanciamento, diz com afoiteza que vai ser subjetivo, traz uma proposta de análise e sugestões para acabar com o nosso atraso. “A convergência com a Europa mais rica que vinha do início dos anos 1950 foi interrompida por uma década a partir do 25 de Abril.” Os culpados são por demais conhecidos, as medidas socializantes, as nacionalizações, foi aí que se lançou o Estado social ambicioso que os eleitores consideram que lhes é devido. E Nuno Palma dirá sem nenhuma hesitação que os fundos europeus são uma das causas fundamentais do atraso. “Segundo dados do Banco de Portugal, o país já recebeu 133 mil milhões de euros desde a adesão à União Europeia até inícios de 2023, sendo que o contributo total português para o orçamento comunitário corresponde a um terço desse número. Estes valores excluem o Plano de Recuperação e Resiliência, com um período de execução até 2026, e que importará em mais de 22 mil milhões de euros entre subvenções e empréstimos.” É o novo ouro do Brasil, só serve para empatar. E lança o seu vaticínio assombroso: “No dia em que a UE cortar fundos, finalmente alguma coisa mudará em Portugal. As consequências deste corte serão dolorosas, não há dúvida, mas esse será o primeiro dia do nosso confronto e acerto de contas com a realidade.” Assegura que o país está a definhar e a produzir resultados económicos medíocres, a adiar reformas (sendo que promete desmistificar as razões do atraso económico português, em tempo algum ouviremos de Nuno Palma quais as reformas estruturais que se impõem, é questão que ele passa como cão por vinha vindimada, dá assim uns tabefes às ordens profissionais e chega). Faz um louvor dos verdadeiros liberais, lembra Francisco Lucas Pires, do CDS, não teve sorte nenhuma, naquele tempo não havia espaço para a direita liberal em Portugal. A Constituição também tem culpas no cartório, e subitamente ficamos a saber que este ousado historiador económico manifesta pesar por não ter havido no período revolucionário uma boa cura mesmo com derramamento de sangue, lê-se e não se acredita: “O próprio facto das forças comunistas ou de extrema-esquerda nunca terem tomado o poder, apesar das nacionalizações e reforma agrária, não demonstrou de forma cabal as suas verdadeiras intenções políticas. Se isso tivesse acontecido por algum tempo, ainda que à custa de muito mais sangue derramado, a cultura e memória política do país teria certamente evoluído de forma diferente.” Para que conste.

Somos um país bloqueado, há um partido político dominante do regime, os dois principais partidos da democracia tornaram-se parecidos, a ausência de políticas reformistas decorre da inexistência do eleitorado se rever em movimentos políticos, no quadro existente. Não está otimista, Portugal poderá ser um caso perdido. E é o momento azado de proferir outra máxima, não menos grandiloquente: “Convém não esquecer que nem sempre tudo correu mal na nossa História. Durante a segunda metade do século XX, o país teve duas fases de rápida convergência relativamente à Europa Ocidental. Tudo depende das escolhas que fizermos e das que forem feitas por nós. Portugal tem de se tornar um país adulto e independente, porque viver à conta do exterior, como se faz há décadas, não é um modelo de desenvolvimento viável.”

Os responsáveis atuais não merecem ser perdoados. Condescendente, também deixa escrito que vivemos muito melhor que os nossos antepassados mais distantes.

Nuno Palma deixa-nos uma prenda de Natal, devemos abandonar os nossos luxos parasitas e descobrir que é no Presépio que iremos encontrar o nosso caminho para o desenvolvimento viável e ganhar a nossa independência. Agora chegou a hora de ouvir a opinião do unanimismo académico e dos próceres do acriticismo cultural, a historiografia dos vencedores tem a palavra, espera-se que não se rendam aos cantos de sereia de Nuno Palma.


                                                                                    Mário Beja Santos




terça-feira, 28 de novembro de 2023

São Cristóvão pela Europa (245).

 

 

E termino o périplo pela Áustria ainda no Distrito de Villach-Land.

A igreja de Santo Estêvão em Latschach , construída na segunda metade do Século XV, possui um fresco no seu exterior.

 


 

No município de Arnoldstein, três aldeias têm imagens de São Cristóvão: Siebenbrünn, Hart e Seltschach.

Em Siebenbrünn, uma igreja de peregrinação consagrada a Santa Maria foi construída no Século XV e situa-se numa zona lindíssima no sopé da montanha Steinberg por onde passa a fronteira entre a Áustria e a Eslovénia. Possui um fresco de cerca de 1520 representando o nosso Santo.

 



 


Em Hart, a igreja de Santa Ana tem um fresco com a data bem visível de 1668:

 



Finalmente em Seltschach, a Igreja de São Servácio situa-se a cerca de dois quilómetros em linha recta da tripla fronteira entre a Áustria, a Eslovénia e a Itália: tem também um fresco representando o nosso Santo.

 


 

 

                                                        Fotografias de 3 de Agosto de 2023

 

                                                                                           José Liberato





terça-feira, 21 de novembro de 2023

Carta de Bruxelas.

 




                                                            Pour faire chier les juifs

 

Sayid Marcos Tenório, historiador e militante do Partido Comunista do Brasil, convertido ao Islão, autor de artigos como «Terrorismo de Israel contra ONGs de Direitos Humanos» e «Os laços do sionismo com o nazismo», colunista do sítio Brasil 247, sítio de «jornalismo independente, progressista e para todos», comentou na rede social X, as calças de uma jovem mulher raptada pelo Hamas a 7 de Outubro de 2023. A frase de Tenório reza: «Isso é marca de merda. Se achou nas calças», a que se segue um emoji de sorriso.  Se Tenório quisesse apenas humilhar uma mulher imputando-lhe cobardia, a sequência seria a inversa: «Se achou nas calças. Isso é marca de merda».  Aliás, se quisesse tão-somente chamar-lhe cobarde, bastaria o «Se achou nas calças», o resto seria supérfluo. Mas não. Tenório quis começar com a merda para afastar a possibilidade de ser outra coisa – sangue, em resultado de uma violação sabe Deus como ou com quê. O seu comentário era precisamente uma resposta à suspeita de violação. Além disso, o se achou nas calças faz da mulher a responsável pelo acto, não esteve à altura do que lhe sucedeu. Estaria Tenório à altura, se fosse selvática e repetidamente sodomizado? Ou se lhe metessem o cano de uma metralhadora pelo cu acima?

No entanto, marca de merda tem leituras diferentes, consoante o duplo sentido do genitivo. E talvez seja por isso que Tenório, historiador e militante do Partido Comunista do Brasil, adoptou essa ordem. Terá sido Heinz Thilo, médico no campo de Auschwitz-Birkenau, o primeiro a designá-lo como anus mundi, designação que posteriormente foi popularizada pela obra do deportado polaco Wieslaw Kielar, Anus Mundi – cinco anos em Auschwitz. Tenório é tudo menos inocente. Sabe muito bem o que diz. Sabe que a defecação foi um dos meios preferidos pelos nazis para humilhar até ao fim: até igualizar o judeu e a merda. Primo Levi refere em Os que sucumbem e os que salvam que «evacuar em público era angustiante e impossível: um trauma para o qual a nossa civilização não nos prepara, uma ferida profunda infligida à dignidade humana, um atentado obsceno e cheio de pressentimentos; mas também o sinal de uma malignidade deliberada e gratuita.» O caso do oficial nazi que depois de alinhar as prisioneiras obrigou uma mulher, sozinha, a defecar em frente de todas, tendo-a, acto contínuo, abatido a tiro, mostra que compreendeu o valor objectificante do olhar. Reduz a mulher que defeca em público a seu próprio produto: o seu interior, a sua verdade está à vista de todos. Nada é senão aquilo. Por isso, comenta ainda Primo Levi, algumas páginas depois, «antes de morrer, a vítima deve ser degradada, para que o matador sinta menos o peso da sua culpa. É uma explicação a que não falta lógica, mas que brada aos céus: é a única utilidade da violência inútil.» Quem não gostaria de dar razão a Primo Levi? O emoji de Sayid Marcos Tenório mostra, no entanto, outra coisa, mostra como a depravação humana resplandece de alegria no mal. A culpa não é atenuada; é transfigurada numa perversa alquimia.

 

 

João Tiago Proença


França em Julgamento: O Caso do Marechal Pétain.

 


 

Editado pela Penguin, em 2023, o magnífico livro, France on Trial The Case of Marshal Pétain, de 480 páginas, do historiador inglês Julian Jackson é uma obra imprescindível para todos os que se interessam pela política, pela história, pelo direito e pela justiça nas suas intersecções mais profundas.

Abençoado pelo maior historiador de Vichy, Robert Paxton, que o qualifica como um atraente livro, escrito com mestria, trata-se, de facto, de um relato muito completo e enquadrado, de ritmo absolutamente magistral, do julgamento de Philippe Pétain, em 1945, pelas acusações de traição e colaboração com a Alemanha nazi.



Pétain nasceu em 1856 de uma modesta família de camponeses perto de Calais e viu o exército como um caminho para o progresso, formando-se na prestigiada academia de Saint-Cyr. A maior parte da sua carreira militar foi “respeitável, mas normal”, nunca ultrapassando o posto de coronel. A Primeira Guerra Mundial proporcionou-lhe a oportunidade perfeita para demonstrar as suas excepcionais capacidades organizacionais e o seu temperamento como comandante.

A sua defesa de Verdun em 1916, vista pelos franceses como a batalha definidora da Primeira Guerra Mundial, e a sua afinidade com os soldados elevaram-no a herói militar e a uma popularidade notável. Agraciado com o título de Marechal, por serviço excepcional na guerra, era o único Marechal de França vivo em 1945.

A sua elevada estatura, os seus penetrantes olhos azuis, os cabelos brancos como a neve e o seu célebre “semblante de mármore” criaram uma aura em seu redor e granjearam-no a um estatuto mítico.

Após a humilhante derrota militar de 1940, Pétain tornou-se chefe do Estado francês sediado na desocupada Vichy e o seu regime foi reconhecido como um governo legítimo pelos EUA, pela União Soviética e pelo Vaticano, entre outros.

Desprezando os políticos tradicionais, Pétain tentou remodelar a França à sua própria imagem, modificando os slogans republicanos de Liberdade, Igualdade e Fraternidade para Trabalho, Família e Pátria.

O general Charles de Gaulle, um antigo “filho amado do Marechal” que ergueu a bandeira da França Livre em Londres, foi denunciado pelo regime de Vichy por traição e condenado à morte à revelia.

Assim, com a vitória dos aliados, o destino de Pétain tornou-se um problema a resolver, sobretudo, depois do seu regresso a França, indesejado por de Gaulle, mas a que o Marechal não se escusou.

Dessa forma, o maior herói francês da Primeira Guerra Mundial, o vencedor de Verdun, começou a ser julgado no Palácio da Justiça de Paris, a 23 de Julho de 1945 e terminou, com apreciável celeridade, a 15 de Agosto enquanto a guerra ainda lavrava no oriente (coincidindo o seu fim com o fim do julgamento).

 A acusação a Pétain defrontou-se com o clássico problema de não existir propriamente uma incriminação à medida dos seus actos. Com a criatividade habitual dos juristas foi burilado o conceito de indignidade nacional que acarretava a uma espécie de morte cívica e acusado pelo crime de traição durante a Segunda Guerra Mundial, considerando a colaboração com a Alemanha nazi incluída no artigo 75 do Código Penal.



Para o julgamento foi criada a Haute Cour de Justice o que levantou, igualmente, problemas de composição uma vez que o corpo jurídico tinha, na sua grande maioria, estado ao serviço de Vichy (embora, no seu decurso, com resistências diversas à sua política judiciária). Para presidir ao julgamento era competente, por inerência, o primeiro presidente da Cour de Cassation que, após sete recusas, ficou a cargo de Perre Mongibeaux, tido como calmo, prudente e pouco dado ao trabalho e que tinha prestado, como todos os outros, o juramento de lealdade a Pétain em 1941, mas que no dia da Libertação surgiu no Palácio da Justiça envergando a tricolor da resistência.

 Aos três juízes togados juntavam-se doze jurados que tinham de ter participado na resistência e doze parlamentares contrários a Pétain. A imparcialidade deste conjunto suscitava dúvidas até aos próprios resistentes tendo um desabafado “estou feliz por participar no julgamento, mas não quero participar num assassinato”. O processo penal que comporta sempre riscos para o poder como contrapartida do poder de legitimação da justiça comportava indubitavelmente, neste caso, menos riscos que o habitual.

No primeiro dia do seu julgamento, Pétain, de 89 anos, leu uma declaração, integralmente transcrita no livro, escrita pelo seu brilhante advogado Jacques Isorni (o mais novo da equipa de defesa, mas o que mais se destacou) onde começou por negar legitimidade à Haute Cour para o seu julgamento referindo que “pela sua composição não representa o povo francês” e que se dirigia “apenas ao povo”. Acrescentou ter herdado uma “situação catastrófica que não foi criada por mim” e que o armistício foi um “acto necessário de salvação nacional” e que “todos os dias, com uma espada na garganta, combati contra os pedidos do inimigo”. Lançou uma incisiva farpa, da sua autoria, mencionando que “o facto de já não estar no exercício do poder significa que alguns esqueceram o que escreveram e disseram” e que pretendeu “preservar uma França que sofria, mas estava viva. O que teria sido ganho libertando uma França em ruínas, uma França de cemitérios?”. E terminou, em grande estilo, entregando-se a Deus e à posteridade, oferecendo-se às mãos do seu País.

 A declaração de Pétain defendia a teoria da espada (de Gaulle) e do escudo (Pétain) e como observa Jackson, estava repleta de meias verdades e evasões, ignorando o seu papel no ataque a judeus, maçons e comunistas e na prisão de antigos líderes políticos, muitos dos quais estavam no tribunal. 

Durante o resto do julgamento, Pétain permaneceu, quase totalmente, em silêncio, recusando-se a ser interrogado e cochilando, ocasionalmente, por causa do calor sufocante que se fazia sentir.

No total, 63 testemunhas prestaram depoimento num tribunal muito pequeno para o extraordinário interesse que despertava. Incluíam a nata do sistema francês: um antigo presidente da república, cinco antigos primeiros-ministros, generais, diplomatas e funcionários públicos e até um príncipe Bourbon. Como reconheceu o juiz no início do julgamento, o arguido despertou os sentimentos mais contraditórios, uma “espécie de amor” entre os seus apoiantes e uma “hostilidade extremamente violenta” entre os seus adversários e numa tirada premonitória considerou que “a história julgará um dia os juízes e julgará, certamente, a atmosfera na qual este julgamento vai ser conduzido”.

Em France on Trial o historiador Julian Jackson transporta-nos para um julgamento maior do que o próprio Pétain, envolvendo toda a França e as feridas da ocupação nazi.

A verdade é que o maior crime do regime de Vichy, as leis raciais do regime que autorizavam a polícia francesa a internar judeus e depois a entregá-los aos alemães para serem deportados para as câmaras de gás, nenhuma menção teve no julgamento e nenhuma testemunha judaica testemunhou em tribunal (“queríamos falar, mas ninguém nos ouvia” disse Simone Veil). O célebre aperto de mão entre Pétain e Hitler, ocorrido a 24 de Outubro de 1941, na zona ocupada, foi mais discutido na sua intensidade e envolvência que o destino dos judeus…

Cumprindo um dever pesado, mas rigoroso a acusação pediu a pena de morte de Pétain e nas suas alegações finais, Jacques Isorni (celebrizado numa foto em que aparece como um arcanjo por trás de Pétain) contrapôs a ideia que Pétain estava, de facto, a expiar uma culpa colectiva, se Pétain era culpado, a França também era: “o armistício foi acolhido com uma enorme sensação de alívio que talvez não fosse heroica…foi bem recebido porque acabava a batalha” e “se devemos ouvir os que foram perseguidos, também devemos ouvir os que foram protegidos”.

No entanto, o júri considerou Pétain culpado das acusações proferidas contra ele e condenou Pétain à morte (aparentemente por 14 votos a favor e 13 contra, onde se incluíam os três juízes togados) e com o voto, extremamente raro, de que a sentença de morte não fosse executada.

 Mais tarde, De Gaulle manteve essa recomendação e Pétain passou o resto da vida preso na Île d'Yeu, na costa da Bretanha, onde morreu em 1951.




O livro de Jackson mostra como os ecos do julgamento de Pétain se repercutiram na política francesa até hoje e os seus apoiantes, especialmente entre a extrema direita francesa, continuaram a retratá-lo como uma figura quase semelhante a Cristo, que se sacrificou pela sua nação.

As sondagens que, de forma continuada, desde os anos 80, revelam que 60 por cento da população defende o armistício e os pouco mais de vinte por cento que condenam completamente Pétain são números que dão que pensar.

Serão os franceses filhos de quarenta milhões de Pétainistas ou filhos da resistência? Fica sempre à reflexão a poderosa frase de Talleyrand segundo a qual a traição é apenas uma questão de datas e, talvez, de vencedores e vencidos.

A extraordinária tessitura deste livro, no cruzamento da sempre conturbada relação entre a política e a justiça, levanta poderosas questões morais que quase todos os vulgares cidadãos franceses foram forçados a enfrentar durante quatro anos de Vichy e que permanecem actuais: o que esperar dos funcionários perante um regime destes: a submissão ou a demissão? A obrigação de obedecer à lei é absoluta? Neutralidade significa colaboração? Qual deve ser o veredicto de uma geração que julga a precedente sem demonstrar, ela própria, o seu heroísmo? 

O livro de Julian Jackson não pretende, nas suas palavras, reabrir o julgamento para tentar provar que Pétain foi tratado muito duramente ou pouco duramente, mas comprova a perspectiva de François Mauriac, atento observador deste evento, quando referiu “para todos, o que quer que aconteça, para os seus admiradores, para os seus adversários, Pétain vai continuar a ser uma figura trágica, apanhado entre a traição e o sacrifício…um julgamento como este nunca acaba e nunca vai ter fim”.   

 

                                                                                            Luís Eloy Azevedo





domingo, 19 de novembro de 2023

São Cristóvão pela Europa (244).

 


 

Só no município de Finkenstein am Faakersee, no distrito de Villach-Land, Estado austríaco da Caríntia, encontrei cinco localidades com imagens de São Cristóvão.

O lago Faaker é lindíssimo e todas esta povoações estão na sua proximidade.

 


As localidades são Faaak, Pogöriach, Untergreuth, Mallestig (bairro da sede do município) e Korpitsch .

A igreja de São Jorge em Faak foi construída na primeira metade do Século XV e adquiriu a sua forma actual em 1499. No exterior um mural dedicado a São Cristóvão:





Pogöriach, nome de origem eslovena o que se justifica por se localizar a cerca de 5 quilómetros da fronteira, a Sudoeste do lago Faakersee.

A igreja da Santíssima Trindade possui um mural consagrado ao nosso Santo com a peculiaridade de nele estarem representados tanto o lago como a montanha Mittagskogel que se situa na fronteira entre a Áustria e a Eslovénia.

 



A Igreja dos Reis Magos em Untergreuth foi completamente reedificada após as arremetidas turcas e reconsagrada em 1486

 



Em Mallestig, a parte sul da sede do município de Finkenstein am Faakersee, a Igreja de Santa Margarida exibe um belo fresco de São Cristóvão datado de 1520, ladeado por uma Crucificação e por Santa Margarida:

 



Em Korpitsch, finalmente há duas igrejas com imagens de São Cristóvão!

A Igreja de Santa Inês:

 



E a Igreja de São Job, construída no fim do Século XV renovada em estilo barroco:



 


 

                                                        Fotografias de 3 de Agosto de 2023

 

                                                                                        José Liberato

sexta-feira, 17 de novembro de 2023

São Cristóvão pela Europa (243).

 

 

Continuo nos distritos austríacos de Villach-Land e de Klagenfurt-Land.

Em Selpritsch, a igreja de Santo André, terminada em 1482 segundo inscrição numa pedra, possui um fresco representando São Cristóvão. Em mau estado:

 



 

 


Em Tibitsch, a pequena igreja de São Jorge, do Século XVII, tem um mural recente do nosso Santo:

 


 

A igreja de montanha de Wöllan situa-se numa zona de grande beleza e é dedicada a São Pedro e São Paulo. Data do Século XV e tem também um mural representando São Cristóvão.



 

 

Finalmente em Treffen, a Igreja de São Maximiliano tem um fresco de São Cristóvão muito danificado:

 



 

                                                            Fotografias de 1 e 2 de Agosto de 2023

 

                                                                                                    José Liberato

quarta-feira, 15 de novembro de 2023

Cartas de Bruxelas.



 

                                                                                           Ah! Os ricalhaços!

 


           Segundo a comunicação social, foi afirmado numa manifestação de apoio à causa palestiniana, realizada no Porto, que «Quem quer um Hamas desarmado quer vê-los passados a ferro, assassinados. Quem vive em Gaza não tem escapatória. Quem vive em Israel são os ricalhaços.» Não é de hoje nem de ontem. O judeu e o dinheiro é um tema que enche volumes em bibliotecas. Serve para todos os ressentimentos. Os financeiros judeus era o santo-e-senha do grupo, a bandeira à volta da qual se reunia o rebotalho. O social-democrata austríaco Ferdinand Kronawetter terá dito que o anti-semitismo era o socialismo dos idiotas (Der Antisemitismus ist der Sozialismus der dummen Kerls), usou a expressão para caracterizar a política populista de direita do presidente da câmara municipal de Viena, Karl Lueger, que elaborou uma tipologia, não muito sofisticada, dos judeus: Geldjuden, para os judeus da bolsa e do capital, Betteljuden, para os judeus imigrantes pobres, e Tintenjuden, para os judeus jornalistas. A expressão foi popularizada pelo chefe do SPD alemão, August Bebel. É transparente, demasiado transparente, a cobiça frustrada, o sentimento de ficar à porta que tão rapidamente se transforma em inveja existencial e homicida. Uma inveja que chega a assumir a forma da projecção. Em 7 de Outubro de 1985, o paquete italiano Achille Lauro foi sequestrado por um comando de terroristas da Frente da Libertação da Palestina; andaram de um lado para o outro com o navio até aportarem no Egipto. Mas antes, a 8 de Outubro, depois de anunciarem que iriam executar reféns se as suas exigências não fosse atendidas (a libertação por Israel de 50 prisioneiros), mataram Leon Klinghoffer, um judeu com passaporte americano. Reformado, de cadeira de rodas, 69 anos de idade, foi executado com um tiro na cabeça. Faruq al-Qadumi, à época porta-voz da OLP, afirmou, que talvez tivesse sido a mulher, Marilyn Klinghoffer, uma doente terminal, a matar o marido – para receber o dinheiro do seguro.

Ah! Os ricalhaços!


                                                                                        João Tiago Proença



terça-feira, 14 de novembro de 2023

São Cristóvão pela Europa (242).

 

 

O último distrito austríaco visitado no Verão deste ano foi o de Villach-Land, o distrito que rodeia a Área Metropolitana da cidade de Villach.

Em Kerschdorf, a Igreja de Santo Ulrich tem um belo mural representando São Cristóvão:

 


No município de Sankt Jacob in Rosental encontrei imagens em três localidades.

Em Maria Elend, a Igreja de Santa Maria, construída por beneditinos, gótica e depois transformada em estilo barroco, tem um altar de meados do Século XVIII consagrado a Santo António. Ajoelhado, recebe a visita do Menino Jesus que lhe entrega um lírio. Ladeando o quadro central, da esquerda para a direita imagens em madeira de São João Gualberto, São Filipe, São Tiago e São Cristóvão.

 



 

Também no interior da igreja, podemos ver um magnífico altar com abas, de cerca de 1500. No centro, Maria com o Menino Jesus sobre um crescente. À sua esquerda São Roque apontando os vestígios da peste na sua perna, à sua direita São Sebastião tendo na mão as flechas do seu martírio. Nos lados, doze dos Santos auxiliares. Em cima á nossa direita, São Jorge, São Cristóvão e Santo Eustáquio.

 

 




Em Schlatten, a Igreja de Santa Úrsula, da primeira metade do Século XVI, tem um mural do nosso Santo

 


 

E, finalmente, o mesmo acontece na igreja de Santa Gertrudes em Srajach:

 




 

                                                Fotografias de 1 e 2 de Agosto de 2023

 

                                                                                José Liberato