Moscas
há muitas, mas só algumas são notícia. As mais espertas sabem como atrair os
holofotes. Conhecem os truques todos – como o de incluir na mira de voo a presidência
dos Estados Unidos da América. Ascendem então vertiginosamente ao estrelato,
fazendo-se enxotar com elegância e graciosidade irreal por um incumbente; ou aderindo
com eficácia de ventosa à testa de um aspirante, com a familiaridade que se tem
perante velha matéria conhecida.
Porém,
quanta mosca anónima merecia sair da obscuridade. Há todo um mundo por
descobrir, como conta a Musca
Domestica do “Insektarium” de Berit Johansen, ou o Diário de uma Mosca
do “Mikrokosmos” de Béla Bartók.
Há
ainda sortes piores que a do anonimato, como ser-se até tomado por outrem e não
merecer sequer o simples reconhecimento correto da identidade de inseto. É o
que acontece com o famosíssimo Voo do Besouro da
ópera “O Conto do Czar Saltan”, de Rimsky-Korsakov, que na tradução portuguesa
acabou, sem apelo nem agravo, como o Voo do Moscardo.
A
atenuante é que, errando na letra, acertou no espírito, pois o zumbido do
moscardo, quanto a mim, é muito mais irritante, vingativo e epicamente
enlouquecedor – como se quer no personagem da história -- do que o do fofinho e
rechonchudo himenóptero.
Tudo isto é triste, razão pela qual se encerra este capítulo com A Morte do Senhor Mosca, de Eric Satie.
Manuela Ivone Cunha
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