Ucrânia:
sugestões de leitura
Quando uma grande biografia de Putin
(Steven Lee Myers, O Novo Czar – Ascensão e o Reinado de
Vladimir Putin, Edições 70) esgota nas livrarias, é
sinal de que muitas pessoas estão interessadas em conhecer e saber mais do que
se passa – e procuram a informação credível que só os livros fornecem (ainda
que também haja livros com falsidades, já reparou que neles as fake news são mais facilmente
detectáveis e escrutináveis?)
Começo, pois, com livros, em português
e acessíveis. De José Milhazes, o único especialista português sobre a Rússia
que domina o idioma do país, a FFMS publicou Rússia e Europa: uma parte do todo,
onde se defende a tese, mais que correcta, de que a Rússia é um país europeu –
e que as tentativas feitas, ao longo da História, e agora por Putin, para a firmar
com outra coisa, mais a pender para a Ásia, têm sido uma das desgraças de um
país como um passado e uma cultura admiráveis. A dado trecho do livro, um
analista russo revela o temor de que a Rússia seja convertida na «nova África
da China», isto é, que a China explore e subjugue a Rússia como o fez aos
africanos. Um risco agora aumentado, brutalmente aumentado, pela estúpida
invasão da Ucrânia, que isolará a Rússia a oeste e torná-la-á (ainda) mais
dependente de Pequim.
Milhazes
é também autor de duas outras excelentes sínteses, uma biografia de Putin
distribuída com a revista Sábado (Putin, em busca da eternidade),
e a Mais Breve História da Rússia – Dos
Eslavos a Putin, das Publicações Dom Quixote.
Para acompanhar o conflito, com
informação actualizada ao minuto e sobretudo sistematizada de um modo impecável
(só ali podemos ver a impressionante lista das grandes empresas que sancionaram
a Rússia, bem como o que se passa na cultura e sobretudo nas diversas
modalidades desportivas), recomendo muito as entradas na Wikipédia em língua
inglesa «2021-2022
Russo-Ukrainian crisis» e, acima de tudo, «Reactions
to the 2021-2022 Russo-Ukrainian crisis».
Agora, algumas leituras mais soltas,
que me despertaram o interesse:
· uma
entrevista
de Fiona Hill ao jornal Politico, que sintetiza bem o que
terá levado Putin a fazer o que fez, com referências às presidenciais de 2024,
à sua idade, aos antecedentes da invasão;
· também
no Politico, um extenso dossier em que diversos especialistas na Rússia,
sobretudo anglo-americanos, prestam os seus testemunhos sobre a estratégia do
ditador russo: «What
Does Putin Really Want?»;
· muito
interessante, uma análise
à psicologia de Putin feita por Juliet Kaarbo no blogue da Chatham House, que
salienta factores como (1) a idade, (2) a experiência; (3) a mudança de
convicções e (4) o efeito do poder absoluto para explicar o actual estado de
espírito do presidente russo; e, como bem conclui Juliet Kaarbo, num Estado de
poder unipessoal e quando está em causa a opção nuclear, conhecer os meandros
da psicologia do líder torna-se essencial;
· sobre
os oligarcas, e já cá falado num excelente artigo de Susana Peralta no Público («O
vício do dinheiro russo sujo»), o artigo de Filip
Novokmet, Thomas Piketty e Gabriel Zucman, «From Soviets to
Oligarchs: Inequality and Property in Russia 1905-2016». As estimativas são
avassaladoras: em 2015, a riqueza escondida pelos oligarcas no estrangeiro
atingia 85% do PIB do país (ver ainda este
artigo de Paul Krugman no NYTimes);
· ainda
sobre os oligarcas, recomendo muitíssimo o texto «The
UK’s kleptocracy problem», o trabalho de uma extensa equipa de
investigadores onde se inclui o português Ricardo Soares de Oliveira, que
analisa em detalhe o modo como os cleptocratas – e os oligarcas russos, em
particular – subvertem a democracia e as regras do Estado de direito de um país
como o Reino Unido;
·
sobre o tema, com dados surpreendentes, um
outro excelente artigo, «It’s
Putin tale of two cities – London for his oligarchs, Kyiv for his bombs»,
de Marina Hyde, no The Guardian; no
dia 17 de Março, será lançado um livro cujo título diz tudo, Butler
to the World. How Britain Became the Servant of Tycoons, Tax
Dodgers, Kleptocrats and Criminals, de Oliver Bullough;
Tem-se
falado na necessidade de perceber o ponto de vista russo, se é que tal é
possível. Para isso, sugere-se o artigo de Sergei Lavrov, «Perspectiva
Histórica da Política Externa Russa», onde se diz, entre outra coisas, que
no Ocidente há escolas onde se ensina que Cristo era bissexual (!). Para uma
síntese deste ensaio, pode ler-se o artigo de Alexei Sobchenko «The
World According to Sergei Lavrov (and Putin)». O ensaio de Putin «Sobre a
unidade histórica de Russos e Ucranianos» foi objecto de uma
excelente análise no site
do Ukrainan Research Institute da Universidade de Harvard, que tem outros
artigos de excepcional interesse.
A
perspectiva da Rússia, contudo, não é apenas a do Kremlin, e ainda bem. Mesmo
descontando todos os exageros propagandísticos, é interessante ver o site de
Navalny, https://navalny.com/,
e as denúncias aí feitas de alguns oligarcas.
Por
fim, mas não por último, Jorge
Almeida Fernandes assina no Público,
uma lúcida e clarividente análise de tudo aquilo a que vimos assistindo. Um
texto notável, como sempre, que termina
assim:
Putin foi durante anos
considerado um génio estratégico. A invasão da Ucrânia é um desastre, onde lhe
restam a brutalidade e os crimes de guerra. Putin fez da Rússia um pária
internacional. Reunificou a Europa e a Aliança Atlântica. A sua última obra foi
fazer ressurgir a Alemanha.
Boas
leituras.
António
Araújo
Eu, nunca compraria um livro do assassino Putin
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Hoje escrevi: “ É lindo o coração da mulher “
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Pensamentos e Devaneios Poéticos
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