sábado, 30 de outubro de 2021

Hora de Inverno.


 

Perante a minha surpresa com a velocidade do pôr-do-sol em Salvador da Bahia, um verdadeiro ocaso em fast-forward, uma amiga nativa dizia-me que ali o sol não se punha. Suicidava-se.

Anda lá perto a sensação que dá o entardecer na passagem à hora de Inverno: o dia que se vai num repente, um tombo do astro a que falta, hélas, o mesmo astral.

Para consolar os espíritos, saia então Le Soir, de Mel Bonis.

Compositora formidável de fim de século, não só compôs a rodos como conseguiu que lhe publicassem as partituras -- feito propriamente extraordinário quando não eram assinadas por um homem. Quase tão extraordinário como o melodrama da história desta mulher, que bem podia ter inspirado Os Maias do Eça. Casada com um homem 50 anos mais velho, apaixona-se por alguém da sua idade, com quem terá um filho que manterá secreto durante 25 anos. É esse jovem que, convidado para uma soirée-concerto na casa da mãe, cuja identidade, porém, ele desconhecia, calha apaixonar-se pela filha “legítima” de Mel – sua meia-irmã. Outro amor recíproco, portentoso e agora catastrófico de impossível, que deixou toda a gente de rastos com o desgosto.

Mas ide em paz enquanto há castanhas, bom Inverno e boa sorte.



 

Manuela Ivone Cunha





1 comentário:

  1. Adorei este Le Soir. E interessei-me pela história desta mulher.
    O romantismo trágico no seu esplendor. Caído no anonimato mais profundo.
    José Liberato

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