A
Fundação Francisco Manuel dos Santos levou por diante o projeto de criar uma
coleção sobre ciência alimentar, estão publicados cinco números, todos sob a
chancela “Pela sua saúde”. Tem sentido referir um dos propósitos da iniciativa:
“Hoje, mais do que nunca, valoriza-se a alimentação como comportamento
modificável com impacto evidente na promoção da saúde física e mental e na
prevenção da doença. Investimento seguro no futuro, a atenção ao que ingerimos
depende da informação de que dispomos e da sua aplicação nas escolhas de
consumo mais acertadas.” Far-se-á hoje referência ao quarto título da coleção
intitulado As Dietas da Moda: Impactos Clínicos, por Ana Brito Costa,
FFMS, 2023. Convém deixar claro que se optou por um tipo de comunicação que não
visa explicitamente o leitor não iniciado, são textos focados na preparação de
futuros profissionais de saúde e de um público com preparação na terminologia
científica que é usada em alimentação e nutrição. No caso vertente desta obra
de Ana Brito Costa, a autora não foge a procurar resposta a questões muito
pertinentes, tais como: é possível perder peso de forma rápida e segura? Quais
são os regimes de emagrecimento mais em voga? Como surgem? Com que validação
científica? Serão eficazes? Com que efeitos e riscos?
É
do senso comum que comer à mesa, nela procurar prazer nos alimentos e
bem-estar, mudou radicalmente nas décadas que levamos de sociedade e
hiperconsumo, gerando posições extremadas, mitos urbanos, negócios fabulosos de
regimes milagrosos para uma população
Heterogénea que quer comer rápido e barato,
que quer adelgaçar a todo o preço, privando-se deliberadamente a festa da
comida – vivemos entre as alegrias do ágape e uma comida de privação, não a dos
pobres, mas a das classes médias e altas. Os gordos e as gordas reagem, formam
mesmo associações para se aceitarem como são, desenvolvem-se as doenças do
comportamento alimentar (anorexia e bulimia), o conceito de gordura é formusura
vive horas de desespero, e ascendem os gurus que propalam a existência de alimentos
que curam, tal como proliferam as lojas de produtos naturais onde se podem
encontrar algumas dessas mezinhas que prometem queimar gorduras. É inegável a
prevalência da obesidade com a atração dos alimentos-lixo, a vida sedentária, o
deixar para muito mais tarde a preocupação entre os nexos existentes entre um
regime alimentar equilibrado e muitas das doenças crónicas não transmissíveis
(caso das cardiovasculares, as oncológicas e a diabetes).
A obesidade faz perder anos de vida saudável e
é propulsora do aparecimento de outras doenças crónicas, há quem procure a
tábua de salvação querendo correr para outro extremo, socorrendo-se das
chamadas dietas da moda, as que prometem efeitos rápidos omitindo que são
grandes causadoras da destruturação dos hábitos alimentares.
A
autora analisa o modo como se muda um comportamento alimentar, recursos com
informação sobre alimentação saudável não faltam (mesmo quando essa informação
é tendenciosamente interesseira), a motivação é pressionada no vasto campo das
tendências da moda, e muito poucos daqueles que vão atrás de uma destas
publicitadas dietas se interroga se é desejável uma velocidade na perda de peso
e se há fundamento científico em tal dieta. E os desastres são mais do que
amargos: “A evidência científica revela que, mesmo as estratégias mais adotadas
e, portanto, as que mais estão na moda, apenas são cumpridas por períodos
inferiores a 20% do tempo relativamente à duração das estratégias
convencionais. O insucesso na gestão do peso a longo prazo, somado à frustração
decorrentes das múltiplas tentativas malsucedidas para o conseguir, podem
conduzir ao desenvolvimento de processos cognitivos de descrença e,
consequentemente, a atitudes de ceticismo e passividade.”
Os
média, as redes sociais, estão infiltrados pelos testemunhos pagos, ou não, em
padrões alimentares que podem dar pelos nomes mais diversos: clean diet,
alimentação consciente, a dieta por contagem de calorias, a plant-based diet
e, um pouco mais atrás, a dieta do jejum intermitente, a dieta sem glúten, a
dieta do ciclo de hidratos, a alimentação intuitiva, a dieta cetogénica, a
dieta low carb, a dieta paleo e a dieta da limonada. Os resultados
globais são manifestamente desastrosos, conforme a autora analisa em quatro
grandes grupos de dietas (as que assentam na restrição significativa de
hidratos de carbono; as que se baseiam na restrição de gordura; as que se
distinguem pela restrição energética temporal e intermitente e as que se
apresentam como desintoxicantes). A autora faz o respetivo inventário
comentado, e diz preto no branco que umas são verdadeiros atentados à saúde
pública e outras profundamente dececionantes. E dá exemplos: “A dieta low carb,
pode melhorar os sintomas da doença a curto prazo, mas o seu perfil nutricional
pode aumentar o risco de desenvolver doenças neurológicas em indivíduos
saudáveis, têm sido consideradas um fator de risco a longo prazo para a litíase
renal, o aumento uricemia e a osteoporose, a evidência a longo prazo é
escassa.”; “Apesar de as estratégias low fat serem tendencialmente
compostas por alimentos considerados mais saudáveis e restritas em alimentos
associados ao aparecimento ou agravamento de doenças crónicas, elas também não
estão isentas de défices nutricionais. A literatura sugere como frequentes os défices
de vitamina E e B12, assim como de zinco, devido ao baixo consumo de carne e
gorduras, mas apenas nas dietas muito pobres em gorduras”; “As dietas de jejum
intermitente pressupõem a utilização de alimentos de elevada densidade
nutricional com escolhas alimentares saudáveis, devendo salvaguardar-se uma
ingestão proteica adequada nos dias de jejum. Naturalmente, e se não forem
cumpridos estes pressupostos, pode incorrer-se em défices de micronutriente e
numa maior perda de massa muscular”; “As dietas de muito baixo valor calórico
estão associadas a múltiplos efeitos colaterais com várias complicações, como
colelitíase, perda de massa magra, cetose e aumento de concentração de ácido
úrico no sangue. O aumento dos corpos cetónicos resultantes destas dietas
interfere na excreção renal do ácido úrico, o que resulta num aumento dos
níveis desse ácido no sangue e pode levar ao aparecimento de gota. O colesterol
sanguíneo pode, igualmente, aumentar, devido à mobilização expressiva da
gordura corporal, aumentando o risco de desenvolvimento de cálculos biliares e
doenças cardiovasculares.”
Moral
da história: “A terapia nutricional deve ser aplicada por nutricionistas como
parte de uma equipa multidisciplinar e deve ter como objetivo alcançar
resultados de saúde positivos, não apenas a perda de peso. A adesão às mudanças
comportamentais a longo prazo pode ser um problema. Neste sentido, e para
melhorar a resistência de comportamento alimentares adequados, devem ser
programadas intervenções baseadas em padrões alimentares e na qualidade
nutricional dos alimentos. A dieta ideal para o tratamento da obesidade deve
ser segura, efetiva, nutricionalmente equilibrada, promover a aquisição de
hábitos alimentares saudáveis e facilitar a adesão e manutenção a longo prazo.”
Não vá em dietas da moda, não aceite qualquer um destes regimes só porque lhe
prometem resultados a curto prazo, isto quando a nossa vida saudável é uma
corrida a longo prazo.
Mário Beja Santos
Sem comentários:
Enviar um comentário