Teologia política: algumas considerações críticas
Nota: a propósito da publicação de um livro de Paulo Rangel, que ainda não li, sobre as relações entre Cristo e a política, ocorreu-me republicar um texto de 2009, saído em 2012 em Estado, Regimes e Revoluções. Estudos em Homenagem a Manuel de Lucena. Dedicado à memória de Manuel de Lucena.
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Há quem conteste a
paternidade da «Teologia Política» contemporânea, atribuída a Johann Baptist Metz
(1928-), sustentando que, antes dele, já autores como Harvey Cox, com a sua «Teologia
Secular», e o protestante Jürgen Moltmann (1926-), com a «Teologia da Esperança»,
haviam acentuado o carácter público e político da mensagem cristã [1].
No entanto, o próprio
Moltmann reconhece a primazia de Metz [2]. E, aliás,
a expressão «teologia política» é muito antiga, remontando, pelo menos, ao
historiador Varrão (116-27 a .C.),
tendo Santo Agostinho usado a locução «teologia civil» em De civitate Dei [3]. Existe,
na verdade, uma «tradição da teologia política» muito remota, que passa por
autores como Averróis, Marsílio de Pádua, Maquiavel, Hobbes, Locke ou Espinosa [4], a
ponto de Jürgen Moltmann ter sido acusado por H. Maier, professor de Ciência
Política em Munique, de desconhecer o debate sobre a expressão «teologia
política» quando apresentou este conceito [5].
Metz recuperaria aquela
noção dando-lhe um conteúdo radicalmente novo, nos termos do qual a Teologia
deveria ser uma reflexão crítica sobre a
prática [6], o que implicaria, desde
logo, que o conteúdo desta proposta continuasse a assentar num carácter
eminentemente teórico (ou «reflexivo») da actividade teológica, ainda que
concebida esta como «teoria da prática» ou, se preferirmos, como «teologia da
prática». Não por acaso, desde há muito que Metz abordava questões com uma
profunda ligação à praxis, como, por
exemplo, o valor salvífico da pobreza: «fazer-se homem significa fazer-se
"pobre", nada possuir, e perante Deus não ter qualquer outro apoio,
poder ou segurança, a não ser os da dádiva do próprio coração» [7].
A noção essencial da
Teologia Política de Metz centra-se na crítica às duas interpretações mais
comuns da mensagem evangélica, a metafísica da escolástica católica - considerada
absolutamente desligada do mundo contemporâneo e, por isso, insusceptível
sequer de ser apreendida pelos homens do nosso tempo - e a
visão «privada» da fé de muitos teólogos protestantes (Bultmann e Tillich, em particular). Interessa
realçar, sobretudo, a crítica radical de Metz à ideia de «privatização» da
revelação bíblica, por esta implicar, em seu entender, um total obscurecimento
da realidade sociopolítica, omitindo uma indispensável articulação entre teoria
e prática e retirando à expressão da fé o dinamismo social da qual aquela é (ou
deve ser) inseparável.
À luz desta concepção, a presença
da Igreja no mundo é não só indispensável como tem de realizar-se através de
uma afirmação da realidade eclesial enquanto instituição crítica. Os riscos desta «Teologia Política» - que
encerra em si mesma um «programa de acção» para a Igreja e até para os teólogos
- são facilmente detectáveis logo a um primeiro olhar.
É evidente, por um lado, que à Igreja não se deve impor um qualquer sistema ou
ideário político e, por outro, que uma «teologia política», não devendo ser
politicamente orientada, até porque tal contraria a mensagem evangélica (Cristo
vs. César; civitas Dei vs. civitas
terrena), tem de abrir-se, então, a uma pluralidade de conteúdos, não sendo
descabido suspeitar que a mesma tanto pode orientar-se num sentido que acaba
por dissolver a Igreja na esfera pública secular como num outro, radicalmente
diferente, que aponta para um regresso a formas de clericalismo de há muito
ultrapassadas.
Existe, para mais, alguma
imprecisão sobre o objecto da proposta de abertura à política, nomeadamente
sobre se a mesma deve ter por protagonista a religião católica, a acção da
Igreja ou, enfim, a actividade teológica em si mesma. Além disso
- e este é um ponto fulcral -, paira
uma grande indefinição sobre o «conteúdo político» da «Teologia Política», que
surge mais insinuado do que expressamente afirmado. Possivelmente, a sua
debilidade essencial encontra-se na ideia de uma «totalização» da política,
como instância suprema que tudo envolve, como Carl Schmitt já havia observado
no prefácio à segunda edição de Politische
Theologie, de 1934, ao afirmar que «a política é o total [das Total], já que a decisão de que algo
não é político corresponde sempre a uma decisão política, independentemente de
quem a tome e dos motivos por que o faz. Isto vale também para a pergunta sobre
se uma determinada teologia é política ou não política» [8].
Neste específico ponto, Moltmann não parece discordar de Schmitt [9]. Este,
por seu turno, na sua Teologia Política
II, de 1969, mostra conhecer os
trabalhos de Metz e de Moltmann [10],
sendo curioso observar que um dos objectivos visados por Schmitt na sua Teologia Política I, de 1922, consistia na redescoberta do pensamento
contra-revolucionário de Bonald, de Maistre ou Donoso Cortés, o que obviamente
se situa nos antípodas das concepções daqueles teólogos [11].
Ora, se atentarmos naquele trecho de Carl Schmitt, a admissibilidade, mesmo num
puro plano puramente teórico, de que exista uma «teologia não-política» (ainda
que seja «política» a decisão de a considerar como tal), implica, por um lado,
que se reconheça, no fim de contas, a possibilidade de abertura de um espaço
«não-político» no labor teológico e, por outro lado, sempre coloca a questão de
saber em que medida aquela visão das coisas não acaba, afinal, por só ser
concebível no terreno próprio do decisionismo schmittiano, com todos os seus
corolários - o qual não é, decerto, o terreno em que se pretendem
situar Jürgen Moltmann, Johann Baptist Metz ou Dorothee Sölle. O problema foi
claramente intuído por Habermas, quando afirmou que a teologia política
autoritária de Schmitt - onde Habermas encontra afinidades
com alguns traços do pensamento de Joseph Ratzinger -
representa a própria negação da teologia política [12]. De
resto, um dos pontos essenciais do pensamento schmittiano assenta numa crítica
ao que o juspublicista alemão designava por «tirania dos valores», a qual
indubitavelmente se situa nos antípodas do legado axiológico conciliar (cfr. os
§§ 11º, 59º e 61º da Gaudium et Spes,
os §§ 17º e 22º do decreto Presbyterium
ordinis, os §§ 7º e 29º do decreto Apostolicam
actuositatem, os §§ 1º e 5º da declaração Gravissimum educationis, o § 2º da declaração Nostra Aetate) [13],
sendo ainda curioso notar que, de acordo com alguns dos seus mais qualificados
intérpretes, o pensamento schmittiano, ao contrário do que é sustentado por
autores como Jacques Derrida, não recolhe de forma visível o contributo do
pensamento católico (v.g., a
necessidade de instâncias de intermediação), encontrando-se muito mais próximo
de alguns postulados do protestantismo [14].
Por outro lado, a noção da
política como «o total» (das Total)
sempre pressupõe – ou produz – uma diluição de fronteiras entre o público e o
privado, o que, como assinalou Hannah Arendt, é o primeiro passo no sentido do
totalitarismo: «o governo totalitário, como todas as tiranias, certamente não
pode existir sem destruir a esfera da vida pública, isto é, sem destruir,
através do isolamento dos homens, as suas capacidades políticas. Mas o domínio
totalitário como forma de governo é novo no sentido de que não se contenta com
esse isolamento, e destrói também a vida privada» [15]. É
interessante acentuar que, praticamente ao mesmo tempo que Metz sugeria uma
«desprivatização da fé», outros manifestavam apreensões perante a «publicização
do privado» então em curso [16]. Na
altura, disse-se que a Teologia Política «recusa o que denuncia como acto de Fé
intimista para propor um acto de Fé
do homem-situado-no-tempo-e-na-história» [17]. Note-se
que, neste particular, a proposta de Metz só é original pela sistematização
teorética a que procede, já que o seu tópico central desde há muito vinha sendo
colocado, podendo citar-se, como mero exemplo, os sermões pronunciados por Jean
Cardonnel em 1958 no convento dos dominicanos de Montpellier: «a opção é
radical: ou cultivamos a nossa alma privada, enquanto que nada faz supor às
multidões humanas a realidade do seu destino, ou precipitamos o movimento da
história, o advento dos novos céus e da terra nova. Iremos então
implacavelmente até ao ponto extremo de nós próprios que se identifica com o
encontro fraterno de todos» [18].
Além do que atrás se
afirmou, aquela sobreposição entre as esferas pública e privada acabaria por
pôr em causa o principal fundamento do «conceito de político» desenvolvido por
Schmitt em torno da oposição amigo/inimigo, porquanto esta dicotomia, de acordo com o preceito evangélico
do amor pelos inimigos (Mt. 5,44; Lc. 6, 27), supõe o carácter público do
inimigo (inimicus/έXθρόs), em
contraste com a natureza privada do «hostil» (hostis/πoλέμos). E se uma das teses essenciais de Schmitt se baseia
na famosa proposição de que «todos os conceitos fundamentais da moderna teoria
do Estado são conceitos teológicos secularizados» [19], o
certo é que tal ocorre igualmente com muitos dos conceitos que baseiam a
«Teologia Política» dos alvores da década de setenta (o conceito de
«alienação», por exemplo, tem uma origem religiosa, a qual é clara na tradição
teológica luterana [20]).
Ora, a proposta de uma
«teologia política» levaria a que regressassem ao terreno da Teologia conceitos
que de há muito o abandonaram para, passando pelo crivo do processo de
secularização, fundarem o conceito moderno de Estado. Assim, ou o regresso
desses conceitos ao território teológico implicaria um retrocesso na autonomia
do Estado ou tal retorno exigiria a sua «reinvenção» em moldes adaptados à
realidade contemporânea - uma «reinvenção» que necessariamente
teria de absorver o novo conteúdo de noções agora pertencentes ao domínio
secular, com claro prejuízo da própria autonomia da religião e da indagação
teológica. Mais ainda, o trabalho dos teólogos recuperaria noções que,
entretanto, adquiriram uma conotação completamente distinta (v.g., o conceito «alienação», atrás
citado), pelo que sobre aquele labor sempre pairaria a dúvida de saber se não
se encontrava a ser manipulado para outros fins, ao serviço de uma orientação
ideológica determinada. A Teologia acabaria por actuar, em simultâneo, como
dispositivo de justificação, e até de dissimulação, de ideologias políticas que
não só necessitam sobremaneira desse simulacro (por assentarem, afinal, numa
crítica radical da religião, como sucede, v.g.,
com o marxismo) como beneficiam do suplemento legitimador que advém, por assim
dizer, de uma «chancela metafísica» que lhes é completamente alheia - e a
qual, no limite, pode mesmo redundar na des-legitimação da Teologia.
Há um ponto em que parece
emergir uma singular e inesperada afinidade entre Schmitt e Moltmann. Este último
via no martírio de Cristo uma tentativa de preservação da Pax Romana, sendo a crucificação ditada por Pôncio Pilatos o
resultado de uma «condenação política». Carl Schmitt, por seu turno, afirmava: «a
ideia de uma "crucificação em nome da Pax Romana " parece-me uma projecção a posteriori ou uma transferência
retrospectiva da pax americana na
época de Pilatos» [21],
observação em que o juspublicista germânico não é muito claro − tanto pode
estar a fazer uma crítica subtil, mas certeira, à pré-compreensão que enforma o
trabalho de Moltmann como, o que parece menos provável, a aderir àquela ideia,
numa curiosa, mas bastante comum, «convergência antiamericana» que marcou e
marca as extremas esquerdas e direitas europeias. Jean-Louis Schlegel adere à
primeira interpretação, que aponta para uma detecção clara e muito precoce, por
parte de Schmitt, dos propósitos mais ou menos velados da Teologia Política das
décadas de sessenta e setenta. Sublinhe-se, todavia, que Schmitt não nega a
natureza «política» da crucificação, entendendo tão-só que a mesma, mais do que
visar a Pax Romana, consistia num
suplício político aplicado aos
foras-da-lei e aos escravos, o supplicium
sumptum de eo in servilem modum [22]. O
ponto foi explorado muito lateralmente no seu escrito Ex Captivitate Salus: «o nosso Deus não foi apedrejado como judeu
pelos judeus, nem decapitado como romano pelos romanos. Quando foi morto, não
tinha cabeça em sentido jurídico, pois não tinha quaisquer direitos. Teve morte
de escravo por crucificação, infligida por um conquistador estrangeiro» [23],
texto do pós-guerra onde Schmitt, ainda que de forma velada, se chega a
comparar à figura de Cristo [24]. Mas
daí não é possível extrair qualquer princípio norteador da praxis, pois, como certeiramente intuiu Alvaro D'Ors, «nem da
própria Revelação nem do exemplo do Salvador se extrai um programa concreto de
acção política e social (...). Trata-se, pois, de limites negativos e não de
programas positivos [25]. Esta
conclusão permanece válida seja para o pensamento de Schmitt, seja para o
pensamento de autores como Metz ou Moltmann, os quais, ainda que neguem
qualquer ligação ao primeiro, não podem iludir o facto de ter sido a obra Politische Theologie de 1922 que abriu
uma perspectiva inteiramente nova no conceito de «teologia política»,
expurgando-a da carga negativa ou pejorativa que até então detinha [26]. Do
mesmo passo, importa sublinhar que muitos autores, com destaque para Erik
Peterson, entendem que a «privatização da fé» foi uma realização do liberalismo
(e daí a sua condenação por Roma) [27], o
que, porventura, implicará uma singular aproximação entre o pensamento
anti-liberal de Schmitt e a crítica dos «teólogos políticos» contemporâneos à
«privatização da fé». A tese de que o Vaticano II pode ter criado uma espécie
de autoglorificador «narcisismo eclesial», avançada por Metz, seria, muito
provavelmente, subscrita por Carl Schmitt…
A ideia de uma
«publicização da fé», por assim dizer, ou de «desprivatização da fé», que
constitui o ponto central da proposta de Metz [28],
apoia-se na exigência de abertura à sociedade e ao mundo, presente no
ensinamento de Karl Rahner, por exemplo. No entanto, Rahner via essa abertura
como condição da salvação pessoal, mas não prescindia da absoluta e essencial relação pessoal com Cristo [29].
Metz, num sentido diverso, pretende já uma salvação colectiva [30],
projecto que não só pode contender com os princípios mais basilares da doutrina
da Igreja - e daí a recorrente crítica de Metz à «hipertrofia
eclesial» - como ameaça, de forma muito visível, a própria noção
de fé, em nome daquilo a que Metz designou por conversão do cristianismo em
«produtiva força de resistência» no seio da sociedade. O problema é que a
«publicização da fé», por ele propugnada, carece de estruturas de
intermediação, as quais terão necessariamente de surgir do interior da Igreja
institucional, sendo inconcebível que assentem em organizações alheias ao
cristianismo (v.g., partidos, grupos
ou associações políticas ou cívicas) [31]. Daí
que tal possa redundar num regresso involuntário à «hipertrofia eclesial» ou,
em contraste, na substituição da Igreja por instâncias mediadoras que lhe são
estranhas. O facto de a «publicização da fé, para se concretizar na prática,
ter de se articular com estruturas de mediação, sejam elas quais forem,
representa uma das principais debilidades do pensamento de Metz - e,
aliás, de toda a «Teologia Política» construída em seu torno. Coloca-se,
nomeadamente, o problema de indagar até que ponto a Teologia Política não
pretende converter a Teologia, ela própria, na única instância admissível de
mediação, o que suscita questões altamente controversas, como seja, desde logo,
a do relacionamento entre a Igreja institucional e a actividade teológica [32].
Sempre subsiste, por
outro lado, a questão de saber se a «teologização do mundo», bem explícita no
programa da «Teologia Política» e da «publicização da fé» [33], não
só contribui paradoxalmente para uma hegemonia de um clericalismo dominador
como não pode implicar um retrocesso dos postulados essenciais da presença da
Igreja numa sociedade voluntariamente secularizada e num Estado assumidamente
laico. Por muito que Metz proclame a necessidade de decretar o «fim do
pensamento metafísico», em nome de uma ordem valores mais concretos e
palpáveis, o facto é que aquela proposta tem contornos nebulosos [34], o
que talvez se explique, em larga medida, pela circunstância de, perdido
radicalmente aquele referencial metafísico, a Teologia acabar por perder a sua ratio essendi para se dissolver na
esfera da «política».
Tal ocorre, de igual
modo, com a necessidade de uma perspectiva unitária entre teoria e prática,
proclamada por Metz. Mesmo quem entenda que ambas devem formar uma unidade
coerente será forçado a reconhecer que aquela proposta visa um predomínio quase
hegemónico da praxis, pelo menos
temporário. Não por acaso, Metz sempre sustentou que a «inteligência do mundo»
está orientada no futuro, pelo que a sua mentalidade não é contemplativa mas
operativa [35]. Ora, tal pode implicar,
no limite, o fim da Teologia como pode acarretar a perda de linhas teológicas orientadoras da acção, as
quais seriam substituídas por linhas de outra índole e proveniência. E não
deixa de ser curioso observar, como que comprovando o carácter eminentemente
teorético da actividade teológica, que todo o discurso de Metz acaba por ser um
discurso puramente teórico e até, num certo sentido, «intelectualista».
Sem prejuízo de se
reconhecer a iniludível verdade que uma fé «privatizada» mas «integrada» se
traduz no reforço de um princípio de autoridade das estruturas eclesiais, a proposta
de uma Igreja como «instância crítica da sociedade» acaba por revelar que
aquelas estruturas são imprescindíveis, mesmo quando se pretenda reorientá-las
num sentido crítico. É certo que a alternativa sugerida pela Igreja conciliar,
o «estar no mundo e não ser do mundo», não só é de duvidosa exequibilidade como
pode constituir ou uma contradictio in
terminis ou um mero artifício de linguagem para uma realidade incindível
(ser/estar) [36]. Mas, em contrapartida, a
suspeita de que a «Teologia Política» visa um «estar no mundo» de uma forma politicamente orientada, ademais por
princípios que permanecem na penumbra mas cujos contornos se adivinham como
historicamente adversos à própria religião (v.g.,
a crítica marxista da religião, assumida por Moltmann [37]), é
uma razão suficiente para acompanhar Spaemann quando este critica Metz enquanto
protagonista de uma «filosofia clandestina» de pendor imanentístico [38].
Jürgen Moltmann pretende,
de algum modo, ultrapassar esse problema, designadamente quando, retomando o exemplo
do «sermão político» de Barth, afirma que a Igreja só poderá actuar como
«instituição de reconciliação» se «tomar partido» [39].
Dessa forma, o «tomar partido» acaba por retirar a carga de «clandestinidade»
que subjaz à filosofia imanentista da Teologia Política. Simplesmente, no
contexto de regimes autoritários ou socialmente injustos, o «tomar partido»
implica, ou pode implicar, o trânsito de uma «teologia política» para uma
«teologia da revolução» [40] ou para
uma «teologia da violência», passagem justificada à luz de uma dinâmica de agir ou de uma lógica
transformacionista de uma ordem política opressora ou de uma ordem social
iníqua. Será difícil, nesse caso, que a Igreja se consiga posicionar, como
pretende Moltmann, enquanto «instituição reconciliadora». E como, em muitos
casos, as próprias democracias de tipo ocidental são ou podem ser consideradas
«injustas», «alienantes» e «opressoras» (já que, numa das suas mais graves lacunas,
a Teologia Política não define o critério que delimita a sua acção) nasce daqui
uma poderosa ambiguidade entre o que pretende ser um projecto reconciliador e
aquilo que pode resultar, ao cabo e ao resto, num programa fracturante -
fracturante da relação entre a Igreja e o poder instituído, mas sobretudo
fracturante da relação entre a Igreja e uma parcela significativa, por vezes
até maioritária, da sociedade.
Por outro lado, é certo
que Moltmann estabelece dois princípios basilares: (1) a Teologia Política não
significa, ao contrário do que pretendia Schmitt, converter a política, e muito
menos o Estado, no «total», nem sequer que as questões políticas devam
converter-se nos temas centrais da Teologia cristã; (2) a Teologia Política
pretende despertar a consciência da Teologia cristã, partindo do pressuposto de
que não é possível uma teologia apolítica e que a teologia dominante é «ingénua
e politicamente inconsciente» [41].
Poderá aceitar-se, como ponto de partida, o carácter «político» ou «ideológico»
da actividade teológica, como sustentam diversos autores, designadamente os partidários
da «Teologia da Libertação» [42]. Mas
já é mais difícil admitir que uma corrente teológica pretenda «esclarecer» ou
«orientar» todas as outras, sobretudo quando essa orientação é feita num
sentido político mas, em simultâneo, sustenta que a política não deve dominar a
actividade teológica. Ora, é esse, no fim de contas, o fim último desta
proposta: se não dominar a actividade teológica pela política, ao menos dominar a actividade teológica pela teologia política. A crítica à naïveté da teologia tradicional, o
alerta para o facto de as teologias aparentemente «não-políticas» estarem
associadas a «movimentos políticos quase sempre conservadores» ou a adesão à
tese de Marx sobre Feuerbach relativa à necessidade de mudar o mundo, mais do
que interpretá-lo, revelam, afinal, que a Teologia Política possui uma
pré-compreensão ideológica, ao implicitamente identificar o «conservadorismo»
como um labéu estigmatizante. As páginas que Moltmann consagra ao american dream, o ataque por si desferido
contra o messianismo resultante da «religião civil» dos norte-americanos [43] ou
as críticas feitas à ideia de «guerra atómica justa» inerente à instalação na
Europa de mísseis Pershing II são também particularmente elucidativas [44], o
mesmo sucedendo, por exemplo, na sua diatribe contra a Iniciativa de Defesa
Estratégica (IDS), lançada pelos Estados Unidos [45].
Aqui emerge uma clara
sobreposição entre dois momentos argumentativos: (1) considerar que toda a Teologia
é «política»; (2) considerar que existem «políticas» que devem nortear a Teologia,
pois nem todas as ideologias têm a priori
o mesmo valor (incluindo o mesmo valor hermenêutico no contexto da indagação
teológica). É esta imposição de um programa ideológico predefinido que acaba
por retirar autenticidade à indagação teológica ou, talvez mais do que isso,
que acaba por eliminar a sua liberdade e autonomia. No limite, a Teologia da
Libertação, por exemplo, é «libertadora» quanto aos seus propósitos mas
«prisioneira» quanto aos seus pressupostos - e o mesmo ocorre com a Teologia
Política, com a agravante desta última ser muito mais indefinida, difusa e até
dissimulada seja nos propósitos, seja nos pressupostos. E é impossível não
levantar a dúvida sobre se, ainda que o rejeite, esta visão das coisas não
acaba por conduzir à ideia schmittiana do político como «total».
Noutro passo fundamental
da Teologia Política, o da abordagem cristológica, a ideia de que «Cristo foi
crucificado politicamente» [46], a
qual retoma o tópico do «Cristo político» [47],
enfrenta sérias dificuldades [48]. A
questão que se coloca é a de saber se aquela referência tem por objecto o
«Jesus histórico» - ponto em que a «politicidade» do
processo que conduziu à crucificação pode ser assumida - ou uma
outra realidade, tudo indiciando tratar-se desta última, atenta a ideia,
expressa por Moltmann, de que é a «memória do crucifixo» que torna necessária a
Teologia Política. Ora, isso pouco ou nada tem a ver com o «Jesus histórico»,
antes se relacionando com uma reactualização ou uma reinterpretação actualista
do legado de Cristo. Tratando-se desta segunda opção, se se considera que a
crucificação de Cristo tem uma natureza política - e, logo, primacialmente temporal -, o
próprio sentido da mensagem evangélica acaba por ser inquestionavelmente
perturbado. É sintomático que, para Moltmann, a perfeição de Cristo seja
revelada pela «recusa a participar na violência do Estado».
No que respeita à crítica
da religião, ressalta outra aporia desta proposta de Metz e Moltmann: é que se,
por um lado, aqueles autores partem de uma crítica à religião – não deixando, aliás, de recorrer para tal a
conceitos de raiz marxista –, por outro lado criticam as correntes teológicas
dos nossos dias por não compreenderem as novas coordenadas culturais da
contemporaneidade com vista a dar uma resposta adequada à… crítica da religião.
Desde logo, a autoproclamação da novidade e da originalidade da Teologia
Política não deixa de surpreender, nomeadamente se atendermos que os seus
conceitos operativos e as suas fontes inspiradoras não podem considerar-se absolutamente
«novos», sendo ademais discutível a sua aplicabilidade ao nosso tempo, ponto que
Metz e Moltmann não analisam. Depois, parece ser extremamente difícil tomar
como ponto de partida a crítica à religião para tentar responder a essa mesma
crítica, sobretudo quando a crítica à religião de Marx e de Engels constitui
uma crítica ao fenómeno religioso enquanto
tal [49], o
que implica a absoluta impossibilidade de recurso a tal fenómeno, seja em que
sentido for (desde o «diálogo cristão-marxista» à «libertação» dos pobres e
oprimidos, passando pela «desprivatização» da Teologia). E mesmo que se
considere, o que parece correcto, que a Teologia Política vai muito para além
dos postulados do marxismo, existe nela uma assumida, mas inconsequente, valorização
da Aufklärung - como,
de resto, no pensamento de Habermas, autor que, nomeadamente na sua crítica à
noção de pós-modernidade [50] e na
sua tese da necessária convergência entre teoria e prática [51],
possui múltiplas afinidades com este projecto teológico. A noção de «esfera
pública», que Habermas considera ter sido uma realidade criada no Iluminismo e
que se distancia em simultâneo das esferas privada-familiar e da esfera do
Estado, constituindo a «esfera das pessoas privadas reunidas num público», é
também um conceito operativo essencial para a «desprivatização da fé»
propugnada pelos «teólogos políticos» [52].
Desatendendo, muito provavelmente, à existência de uma Aufklärung católica [53], os
defensores da Teologia Política saúdam no Iluminismo o papel por este
desempenhado na separação entre Estado e sociedade, impedindo quaisquer
veleidades de instituição do regalismo, do constantinismo, de uma religião
oficial ou de um Estado confessional [54] É
curioso observar que este será um dos tópicos que maior crítica merecerá por
parte de Ratzinger [55]. Concorde-se
ou não com essa crítica do futuro Papa Bento XVI, e mesmo que se reconheça
aquele papel ao Iluminismo, o certo é que este carece de uma reactualização a
que, no fundo, os autores da Teologia Política não procedem. Explicando melhor,
o problema da secularização coloca desafios à Teologia que a programa de Metz e
Moltmann, com a sua insistência de que tudo o que existe na esfera social
possui uma dimensão política [56],
manifestamente deixa por resolver. É evidente que a insistência no binómio
Estado-sociedade se afigura muito útil para os «teólogos políticos»: desse
modo, é possível afirmar a total politicidade da ordem social sem resvalar na
conceptualização schmittiana de um «Estado total» e nas suas terríveis sequelas
históricas. Simplesmente, não só é difícil delimitar com segurança e certeza as
fronteiras entre sociedade e Estado, como este último parece ser uma instância
política por excelência, pelo que os riscos de uma «deriva totalitária»,
abrangendo Estado e sociedade, são por demais evidentes, tanto mais que o
Estado social do nosso tempo provoca e aprofunda uma maior interacção entre a
realidade estadual e a realidade social. O problema torna-se ainda mais grave
na medida em que Moltmann ,
por exemplo, pretende diluir as fronteiras entre a esfera temporal e a esfera
espiritual (afirmando, designadamente, a inautenticidade da oposição
Cristo/César [57]). O seu objectivo
consiste, evidentemente, em transpor para o domínio espiritual coordenadas
temporais, à luz da noção de que toda a realidade é «política». Simplesmente,
tem sido aquela separação de esferas, muito mais próxima do liberalismo do que
a modernidade iluminista, que vem permitindo assegurar a neutralidade do Estado
no plano religioso, pelo que, uma vez mais, se sublinha os riscos deste
projecto que ataca a ingenuidade e a natureza ideologicamente asséptica das
outras correntes teológicas sem se aperceber da ingenuidade dos seus próprios
enunciados.
Por seu turno, o processo
de secularização coloca, obviamente, grandes entraves a um projecto
emancipatório conduzido a partir do terreno teológico, como, aliás, Moltmann
implicitamente reconhece quando, num dos momentos mais conseguidos do seu
pensamento, aborda o problema da progressiva redução da eficácia pública e da
repercussão do discurso sobre Deus. A resposta que pretende dar a esse problema
é que se afigura também ela algo ingénua e desfasada da realidade
contemporânea, em que o processo de secularização assume contornos
irreversíveis, pelo menos no actual contexto histórico das sociedades de tipo
ocidental. Para contornar este problema, a Teologia Política propõe que a
secularização seja encarada como um «enunciado teologicamente positivo» [58], o
que é aceitável, mas insuficiente: a secularização tem de ser encarada como um
enunciado teologicamente inescapável, sem que tal implique uma atitude passiva
ou conformista, assumindo-se, pois, que a mesma tem um sentido ideológico nas
sociedades contemporâneas [59]. Ora,
o enaltecimento da secularização pressupõe a definição deste conceito,
designadamente se o mesmo se encontra ligado a uma saudável e necessária
«autonomia do secular» ou separação entre Estado/sociedade/religião ou se
significa antes a perda progressiva da importância da religião no mundo
contemporâneo. Neste último caso (que, aliás, não está em absoluta dessintonia
com o primeiro), o enaltecimento da secularização pode produzir resultados
indesejáveis. Mesmo que se louve a tentativa de explorar as virtualidades da
secularização ou, pelo menos, de a canalizar num sentido positivo, como o fez
Metz na sua Teologia do Mundo (1968),
a exaltação da ambivalência do mundo, que tanto pode salvar-se como perder-se,
poderá equivaler, em boa verdade, a uma absoluta indiferença perante os
destinos do Homem e, no limite, à destruição dos fundamentos da própria
religião. Aliás, é flagrante a ambiguidade de uma abordagem do divino que, por
um lado, sublinha que o Mistério da Incarnação de Cristo e o transcendente não
possuem um conteúdo «trans-histórico», antes se inscrevendo na própria História
e até na lógica da «mundanização do mundo» [60], e
que, por outro lado, salienta a necessidade de uma cristologia ordenada não a
pressupostos metafísicos («para o alto») ou antropológicos («para baixo») mas
de uma cristologia para o futuro ou para a frente [61], o
que pressupõe, ainda que os defensores da Teologia Política o possam não o
admitir, uma visão «trans-histórica» ou «meta-histórica» das diferentes presenças
do divino no próprio «mundo» [62].
Sublinhe-se também que o projecto de uma «desprivatização» possuirá sempre um
alcance limitado, tenha ele por objecto a fé em si mesma, cada vez menos
praticada, a acção da Igreja institucional, também ela cada vez mais
circunscrita, ou, enfim, apenas a actividade teológica, cada vez menos influente.
Caso seja este o propósito último de Moltmann ou Metz - i.e.,
realizar uma crítica teológica à Teologia -, ponto
que não é claramente definido, o programa «desprivatizador» assume um alcance
extremamente reduzido, nomeadamente quando cotejado com correntes mais ambiciosas
e «eficazes», como a Teologia da Libertação [63]. E o
facto de esse alcance «intrateológico» ser assaz reduzido permite, desde logo,
questionar a natureza «política» da Teologia, ponto nodal da Teologia Política.
Se, ao invés de pretender
uma crítica teológica da Teologia, se visar a fé em si mesma, exortando à sua
«publicização», acaba por se abrir um outro conjunto de problemas. Se a crença
já é indiscutivelmente «política», a Teologia Política torna-se, ela própria,
supérflua e desnecessária, porquanto a «publicização» flui naturalmente da
afirmação e da prática das convicções religiosas. Nesse contexto, a Teologia
Política só se afiguraria necessária se, do mesmo passo que alertava para o carácter
público da fé, pretendesse impor-lhe uma dada orientação ideológica. Por outras
palavras: o facto de ser necessário salientar a dimensão pública da fé, como
fizeram Metz e Moltmann, evidencia que esta pode não possuir tal dimensão. E,
de resto, faz parte da própria «liberdade da fé» a escolha da sua própria dimensão.
A imposição de um carácter «público» à convicção religiosa - a qual
não é feita apenas em termos teoréticos porquanto surge associada a uma
obrigação moral de «agir», «intervir» e «participar» em nome de imperativos de
natureza ética - implica necessariamente uma
retracção da «liberdade da fé» e da vertente pessoal da relação com o divino,
não sendo por acaso que a Teologia Política vem contestar a teologia transcendental
de Rahner, considerando que a mesma conduz a uma abordagem excessivamente individualista
da crença, reduzindo-a ao momento presente
da decisão pessoal do crente [64].
Ora, em nome de um «futuro» - de uma absoluta primazia do futuro, nas palavras de Metz - que
remete para escatologias alheias à ordem espiritual corre-se o sério risco de destruir
a liberdade pessoal do presente. A
«hipertrofia da dimensão escatológica», que Mondin critica na Teologia da
Esperança, é plenamente aplicável à Teologia Política [65].
Neste aspecto, Rahner mostra ser muito mais clarividente quando afirma que a
teologia transcendental e a teologia política não são forçosamente antitéticas
e não têm de se excluir mutuamente. O facto de Metz se insurgir igualmente
contra a hermenêutica existencial de Bultmann, baseada no círculo da relação
privada «tu-eu», possui o mesmo significado do seu distanciamento em face da teologia
transcendental de Rahner, com a agravante de não compreender as potencialidades
do carácter «dialógico» ou «comunicativo» daquela relação, designadamente a sua
virtualidade de ultrapassagem de um «solipsismo do eu» que permite afirmar a
natureza pessoal da fé sem cair num individualismo estéril. É certo que a
Teologia Política reconhece a existência de uma legítima individualização do relacionamento com o divino. Todavia,
não identifica os limites dessa «individualização» (ou, talvez melhor, dessa individuação), designadamente os limites
que impedem que aquela se transforme em «privatização», o primordial inimigo de
Metz e de Moltmann. Admite-se que uma excessiva «contraposição entre existência
espiritual e liberdade crítico-social», para usar os termos de Metz, pode
conduzir a resultados indesejáveis. Reconhece-se, de igual modo, que, sobretudo
no nosso tempo, a relação pessoal com o divino não pode abstrair por inteiro
dos dados do contexto histórico e social em que o indivíduo-crente está
inserido, até porque a sua fé tem de se construir também em torno dos elementos
«públicos» da mensagem evangélica (liberdade, paz, justiça), reforçados pela
necessidade de «abertura ao mundo» que o Concílio proclamou. Simplesmente, o
risco de uma «espiritualidade individualista» não parece ser o problema central
dos dias de hoje, os quais se confrontam muito mais com o problema da definição
do lugar da crença religiosa num mundo progressivamente secularizado (ainda que
se tenha de reconhecer, até pelas afinidades com a questão da «privatização da
fé», o risco de uma crença exclusivamente «autoconstruída», numa síntese «narcisista»
de elementos de várias proveniências, da New
Age ao budismo, naquilo que já se designou por «bricolage religioso» [66]). De
facto - e foi de resto Metz que também o afirmou numa das
suas mais famosas obras -, o problema central da
contemporaneidade decorre da instauração de uma progressiva «mundaneidade» do
mundo [67],
pelo que sempre haveria de perguntar se a resposta mais adequada a tal fenómeno
será a aceitação festiva dessa realidade, encarada como positiva [68], o
que sempre implicará, antes da «cristianização da mundanização» pretendida por
Metz [69], a
diluição da fé num espaço público profano cada vez mais sujeito à irreversível
hipertrofia do «mundano», mesmo que se reconheça que qualquer solução
alternativa (v.g., o reforço da
«privacidade da fé») pode ser não só irrealista como produzir resultados
indesejáveis, designadamente o solipsismo de um absoluto «fechamento ao mundo»
ou de uma total recusa da realidade, como alguns logo se aperceberam [70]. Em
todo o caso, há uma dupla insistência numa fé escatológica e num investimento
na realidade terrestre que, ainda que Metz o negue, apresenta grandes tensões e
até contradições internas [71].
Metz considera que os grandes projectos de ordem tecnológica ou política podem
converter-se no «ópio do povo» do nosso tempo; mas a pergunta impõe-se: o mesmo
não sucederá à Teologia Política ou à ideologia que, na penumbra, lhe subjaz?
Não deixa de ser curioso
observar, agora de um prisma eclesiológico, que, se os defensores da Teologia
Política se mostram adversos ao individualismo, criticam, do mesmo passo, o
papel exercido até agora pelas instâncias de mediação no relacionamento pessoal
com Deus, designadamente as estruturas eclesiais, em nome de uma abordagem
«comunitária», o que é particularmente claro no pensamento de Moltmann [72]. Como
se, no fundo, a proposta de uma publicização da fé não represente também o
enunciado de uma outra fonte de mediação, onde o peso dos elementos
organizativos, por assim dizer, cede lugar ao das pré-compreensões mundividenciais
e dos enunciados ideológicos. Aliás, como foi notado por autores como Spaemann
ou Maier logo que nasceu a Teologia Política, esta comporta o risco de, apesar
de criticar as estruturas eclesiais de mediação, acabar por resvalar numa
«neopolitização da fé» susceptível de alimentar tentações de interferência
eclesiásticas nos assuntos temporais, ainda que o risco inverso seja, à
primeira vista, muito superior. O certo é que Moltmann critica o modelo de
«distanciamento» da fé e da Igreja relativamente à política (que, de resto, é
um dos grandes pontos de viragem dos pontificados de João XXIII e de Paulo VI em relação a Pio XII ), o que se
afigura extraordinariamente arriscado. Ainda assim, se o perigo de uma
ingerência na esfera temporal da Igreja no seu todo parece ser reduzido, o
mesmo se não dirá da acção das igrejas locais, das estruturas eclesiásticas
regionais, de grupos ou movimentos ou mesmo de sacerdotes e leigos que
pretendam agir a título individual mas a coberto de uma legitimação transcendente que a Teologia Política justifica e
apoia, desde que aquele modo de agir vise a construção de uma ordem
político-social adversa ao capitalismo e à economia de mercado [73].
Em face de tudo isto,
ganha plena acuidade a afirmação feita por Iris Murdoch, na linha de T. S. Eliot,
segundo a qual «temos o Deus e a teologia que queremos» [74].
[1] Cfr. MONDIN, Battista - As Teologias do
Nosso Tempo. Trad. portuguesa. Lisboa: Edições Paulistas, 1977, p. 130.
[2] Cfr.
MOLTMANN, Jürgen -
Teología Política. Ética Política.
Trad. castelhana. Salamanca: Ediciones Sígueme, 1987, p. 15.
[3] Cfr.
MONTES, Adolfo González - Teología Política
Contemporánea. Historia y sistemas. Salamanca: Universidad Pontificia,
1995, p. 24; TAMAYO, Juan José - Teología política. In Conceptos fundamentales del cristianismo. Dir. de Casiano Floristán
e Juan José Tamayo. Madrid: Editorial Trotta, 1993, pp. 1351ss.
[4] Cfr. DESPLAND, Michel - La religion en Occident. Évolution des idées et du vécu. Montreal-Paris: Les Éditions Fides-Les Éditions du Cerf, 1979, pp. 327ss
[5] Cfr.
XHAUFFLAIRE, M. - La «Théologie Politique ». Introduction
à la théologie politique de J. B. Metz. Vol. 1. Paris: Les Éditions du
Cerf, 1972, p. 17, nota; cfr., ainda ROMMEN, Heinrich A. - O Estado no Pensamento Católico. Trad.
brasileira. São Paulo: Edições Paulinas, 1967, pp. 98ss, e SCATOLLO, Merio – Teologia Política. Trad. portuguesa.
Lisboa: Edições 70, 2009, pp. 232ss.
[7] Cfr.
METZ, Johannes Baptist - Pobreza em Espírito. O Advento de Deus. Trad.
portuguesa. Lisboa: Moraes Editores, 1968, p. 18.
[8] Cfr. SCHMITT, Carl - Théologie politique, 1922, 1969. Trad.
francesa. Paris: Éditions Gallimard, 1988, p. 12.
[10] Cfr.
SCHMITT, Carl -
ob. cit., p. 171 e p. 174; sobre as
divergências e convergências entre Schmitt e os «teólogos políticos» da década
de sessenta, cfr. a introdução de Jean-Louis Schlegel a essa obra, em esp. pp. IIss
[11] Cfr.,
entre outros, BALAKRISHNAN, Gopal - The Enemy. An
Intellectual Portrait of Carl Schmitt. Londres-Nova Iorque: Verso, 2000, em
esp. pp. 43ss; sem referir este ponto na sua análise da Teologia Política I, cfr. BENDERSKY, Joseph W. - Carl Schmitt. Theorist for the Reich. Princeton: Princeton University
Press, 1983, pp. 35-39. GALLI, Carlo - Il cattolicesimo nel
pensiero politico di Carl Schmitt. In AA.VV. - Tradizione e Modernità nel pensiero politico di Carl Schmitt.
Nápoles: Edizione Scientifiche Italiane, 1987, pp. 13ss; MILBANK, John –
Política (Teologia). In Dicionário
Crítico de Teologia. Dir. de
Jean-Yves Lacoste. Trad. brasileira. São Paulo: Edições Loyola-Paulinas, 2004,
pp. 1406ss, que sustenta que Metz e Moltmann se apoiaram não no trabalho de
Schmitt mas na crítica a ele dirigida por Erik Peterson.
[12] Cfr.
BONVECCHIO, Claudio -
Carl Schmitt e una interpretazione di Jürgen Habermas. Il Politico (Março de 1987), p. 155.
[13] Cfr.,
neste sentido, MIGUEL, Carlos Ruiz - Carl Schmitt. Teoría política y catolicismo. In AA.VV. - Estudios sobre Carl Schmitt. Dir. de
Dalmacio Negro Pavón. Madrid : Fundación Cánovas del Castillo,
1996, p. 389.
[14] Cfr. MEIER, Heinrich - The Lessons of Carl Schmitt. Four chapters on the distinction
between Political Theology and Political Philosophy.
Trad. norte-americana. Chicago-Londres: The University of Chicago Press ,
1998, p. 146; cfr. ainda HOLLERICH, Michael – Carl Schmitt. In The Blackwell Companion to Political
Theology. Dir. de Peter Scott e William T. Cavanaugh. Oxford : Blackwell, 2006, pp. 107ss. WACKER,
Bernd - Théologie politique. In Nouveau Dictionnaire de Théologie. Trad.
francesa. Dir. de Peter Eicher. Paris: Les Éditions du Cerf, 1996, pp.
1013-1014.
[15] Cfr.
ARENDT, Hannah -
O Sistema Totalitário. Trad.
portuguesa. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1978, pp. 588-589, tese igualmente
perfilhada por FREUND, Julien - L'essence du
politique. Paris: Éditions Seghers, 1964, p. 299; ligando a diluição entre
público e privado à emergência do conceito de «social» no pensamento de Arendt,
cfr. D'ENTRÈVES, Maurizio Passerin - The Political
Philosophy of Hannah Arendt. Londres: Routledge, 1994, p. 59, e, a este respeito, cfr. ARENDT, Hannah
- The Human Condition. reimp.
Chicago-Londres: The University
of Chicago Press , 1958,
pp. 38ss; sobre essa distinção, cfr. ainda PITKIN, Hanna Fenichel - Justice: on relating private and
public. In AA.VV. - Hannah Arendt. Critical
essays. Dir. de Lewis P. Hinchman e Sandra K.
Hinchman. Albany , Nova Iorque: State University
of New York
Press, 1994, pp. 261ss; CANOVAN, Margaret - Hannah Arendt. A
reinterpretation of her political thought. Cambridge : Cambridge
University Press, 1994,
pp. 17ss. HANSEN, Phillip - Hannah Arendt.
Politics, History and Citizenship. Cambridge : Polity Press,
1993, pp. 129ss. BOURETZ, Pierre - Hannah Arendt entre passions et raison. In
ARENDT, Hannah - Les Origines du
Totalitarisme. Eichmann
à Jérusalem. Paris: Gallimard, 2002, pp. 9ss; criticando a tese da
«novidade» do totalitarismo, cfr. STANLEY, John L. - Is totalitarianism a new phenomenon?
Reflections on Hannah Arendt's The
Origins of Totalitarianism. The
Review of Politics. 49 (1987), pp. 177ss; sobre a «originalidade» deste
conceito na obra de Arendt, cfr. COURTINE-DENAMY, Sylvie - Hannah Arendt: Paris : Belfond, 1994, pp. 239ss. A
proposta da Teologia Política aproxima-se decisivamente da reclamação do
carácter público da vida privada (the
private is political) feita por algumas correntes feministas: entre a
abundantíssima literatura, cfr. AA.VV. – Feminism,
the Public and the Private. Dir. de Joan B. Landes. Oxford-Nova Iorque:
Oxford University Press, 1998.
[16] Cfr. NISBET, Robert - Citizenship: two traditions. Social Research. An International Quarterly
of the Social Sciences. 41 (Inverno de 1974), em esp. p. 621; cfr.,
noutro contexto, TRIGG, Roger – Religion
in Public Life. Must Faith be Privatized? Oxford :
Oxford
University Press, 2007, e as reflexões de ŽIŽEC, Slavoj – A Monstruosidade de Cristo. Paradoxo ou Dialéctica? Trad. portuguesa. Lisboa: Relógio D’Água
Editores, 2008, em esp. pp. 123-124, considerando que o que confere à Igreja a
sua «catolicidade» (i.e., o seu carácter omnienglobante) é justamente a
natureza abstracta – e não concreta, como sustentava Hegel – da sua
universalidade, o que questiona a tese kantiana do «uso público da razão».
[17] Cfr.
PINTASILGO, Maria de Lourdes – Porquê uma teologia política? Síntese. Revista de actualidades eclesiais.
33 (Maio-Junho de 1973), p. 25.
[18] Cfr.
CARDONNEL, Jean -
O Evangelho e o Mundo Novo. Trad.
portuguesa. Porto :
Livraria Figueirinhas, 1966, p. 25.
[20] Cfr. FRYE, Northrop - The Modern Century. 2ª ed. Toronto : Oxford
University Press, 1991,
pp. 23-24.
[22] Cfr. SCHMITT, Carl - ob. cit., p. 174, nota; trata-se de uma
realidade muito mais complexa: cfr. BAMMEL, Ernst - Crucifixion as a punishment in
Palestine, e BLINZLER, Josef - The
jewish punishment of stoning in the New Testament period, ambos in The Trial of Jesus. Cambridge Studies in
honour of C. F. D. Moule. Dir. de Ernst Bammel. Londres: SCM Press,
1971, pp. 162ss e pp. 147ss, respectivamente; BLINZLER, Josef - Le procès de Jésus. Trad. francesa. s.l.:
Maison Mame, 1962, pp. 403ss.
[23] Cfr.
SCHMITT, Carl -
Ex Captivitate Salus: esperienze degli
anni 1945-47. Trad. italiana. 2ª ed. Milão: Adelphi Edizioni, 1993, p. 63.
[24] Cfr.
ARAÚJO, António de -
Schmitt e o nazismo. Apresentação a Ex
Captivitate Salus. Estado &
Direito. Revista semestral luso-espanhola de Direito Público. 14 (1994),
pp. 82-83, nota 13.
[25] Cfr.
D'ORS, Alvaro -
Teología política: una revisión del problema. Revista de Estudios Políticos. 205 (1976), p. 68.
[28]
Neste sentido, GEFFRÉ, Claude - Un nouvel âge de la Théologie. Paris : Les
Éditions du Cerf, 1972, pp. 114-115; num sentido próximo, JOLIF, Yves - Fé e
Política. In AA.VV. -
Os Cristãos e a Libertação dos Povos.
Dir. e trad. de J. Magalhães. Porto: s.n., 1972, pp. 16ss.
[29] Cfr.
RAHNER, Karl -
Je crois à Jésus-Christ. Trad. francesa. Paris: Desclée
de Brouwer, 1971, p. 77, o qual, sintomaticamente, num diálogo com Metz e
Mahovec, em 1967, exprimira as maiores reservas ao diálogo cristão-marxista:
cfr. RAHNER, Karl -
Diálogo crítico sobre la Iglesia. Problemas
actuales en la iglesia y en el mundo. Trad. castelhana. Barcelona:
Editorial Nova Terra, 1971, em esp. pp. 38-39.
[30] Cfr.
PATTARO, Germano -
La Svolta Antropologica. Un momento forte della teologia contemporanea.
Bolonha: Edizione Dehoniane, 1991, p. 426.
[31] Cfr.,
num sentido próximo, afirmando que a privatização da fé retira peso às
«mediações institucionais», DOMINGUES, Frei Bento - A religião e a política.
In FERRY, Jean-Marc e DOMINGUES, Frei Bento - A Religião e a Política Face aos Desafios do Fim de Século.
Abrantes: Palha de Abrantes-Associação de Desenvolvimento Cultural, 1998, p.
69.
[32] Sobre
a natureza instrumental da mediação eclesial, no quadro de uma «teologia do
apostolado», cfr. ARNOLD, F. - Para uma Teologia
do Apostolado. Princípios e História.
Trad. portuguesa. Trad. portuguesa. Lisboa: União Gráfica, 1963, pp. 45ss;
sobre a «aporia da mediação», num contexto algo diverso mas com incidências
claras na discussão daquele ponto, cfr. BISER, Eugen - Ateísmo y teología. In
AA.VV. -
Dios como problema. Dir. de Joseph
Ratzinger. Trad. castelhana. Madrid: Ediciones Cristandad, 1973, pp. 152ss.
[33] Cfr.
PATTARO, Germano - ob. cit., pp. 458ss; sobre o «mundo» e
a «responsabilidade mundana da fé», cfr. COCCOLINI, Giacomo – Johann Baptist Metz. Brescia: Editrice
Morcelliana, 2007, pp. 52ss.
[35] Cfr.,
por ex., METZ, Johannes B. - L'Église
et le monde. In AA.VV. - Théologie d'aujourd'hui et
de demain. Paris :
Les Éditions du Cerf, 1967, p. 141.
[36] Sobre essa incindibilidade, cfr.
PARENT, Rémy - Condition chrétienne et service de l'homme. Essai
d'anthropologie chrétienne. Paris: Les Éditions du Cerf, 1973, pp. 99ss.
[40] Cfr.,
por ex., AA.VV. -
Discussion sur la «Théologie de la
Révolution». Trad. francesa. Paris: Les Éditions du Cerf-Maison Mame, 1972.
[42] Cfr.,
por ex., DUSSEL, Enrique – Teologia da
Libertação. Um panorama de seu desenvolvimento. Trad. brasileira.
Petrópolis: Editora Vozes, 1999, pp. 9ss.
[43] Cfr. MOLTMANN, Jürgen - Le Dieu crucifié. La croix du Christ, fondement et critique de la théologie chrétienne.
Trad. francesa. Paris :
Les Éditions du Cerf, 1974.
[45] Cfr.
MOLTMANN, Jürgen -
Jésus, le messie de Dieu. Trad.
francesa. Paris: Les Éditions du Cerf, 1993, p. 104; aquelas afirmações são elucidativas
também de alguma «superficialidade» em que resvalam os autores da Teologia
Política, tendo essa observação sido feita em relação a Metz, mesmo pelos seus
biógrafos: cfr. T. R. Peters, Johann
Baptist Metz. Theologie des vermiβten Gottes, Mainz, 1998, p. 7, apud COCCOLINI, Giacomo – ob. cit., p. 10.
[46] Cfr.,
por ex., MOLTMANN, Jürgen - Teología
Política..., cit., p. 23. O paralelo entre Cristo e outras personalidades,
como Luther King ou São Francisco de Assis, é comum nos nomes cimeiros da
Teologia Política: cfr., por ex., SÖLLE, Dorothee - Imagination et obéissance. Réflexions pour une éthique chrétienne à
venir. Trad. francesa. Tournai:
Casterman, 1970, p. 12; para um excurso em torno da visão cristológica da
Teologia Política, cfr. SCHILSON, Arno e KASPER, Walter - Théologiens du Christ aujourd'hui. Trad. Francesa. Paris: Desclée
de Brouwer, 1978, pp. 126ss; KASPER, Walter – Jesus, el Cristo. 12ª ed. Salamanca: Ediciones Sígueme, 2006; com
grande desenvolvimento, cfr. SOULETIE, Jean-Louis - La croix de Dieu. Eschatologie et histoire dans la
perspective christologique de Jürgen Moltmann. Paris :
Les Éditions du Cerf, 1997; ADAMS, Nicholas – Jürgen Moltmann. In The Blackwell Companion to Political
Theology. cit., pp. 227ss; há quem se refira à «memória subversiva de
Jesus» recuperada por aquela corrente teológica: cfr. BANDERA, Armando - La Iglesia ante el proceso de liberación. Madrid:
Biblioteca de Autores Cristianos, 1975, pp. 61ss. Nesse contexto, é
indiscutível que o carácter proléptico da Ressurreição, no que concerne a uma
«antecipação dos fins», acaba por permitir pontos de contacto com aquilo a que
se poderia chamar a «escatologia da sociedade sem classes»: defendendo aquela
noção, mas sem dela retirar este corolário, cfr. PANNENBERG, Wolfhart -
Epílogo a la segunda edición. In AA.VV. - La
Revelación como
Historia. Trad. castelhana. Salamanca: Ediciones Sígueme, 1977, p. 182. Id.
-
Esquisse d'une christologie. Trad.
francesa. Paris: Les Éditions du Cerf, 1971, pp. 55ss.
[47] Sobre
a tentativa de uma leitura aggiornata do
processo de Jesus, cfr., por ex., KERN, Walter - La croce di Gesù come
rivelazione di Dio. In Corso di Teologia
Fondamentale. Trad.
italiana. Vol. 2 - Trattato sulla Rivelazione. Dir. de Walter Kern, Hermann J. Pottmeyer e Max Seckler. Brescia:
Editrice Queriniana, 1990, em esp. pp. 233ss, sobre o «escândalo da Cruz» e a
«crise das ideologias». Situando a crucificação num debate sobre a democracia e
os seus limites, numa análise extremamente original e com ampla recensão da
imensa bibliografia existente, cfr. ZAGREBELSKY, Gustavo - A Crucificação e a Democracia. Trad.
portuguesa. Coimbra: Edições Tenacitas ,
2004. No contexto da Teologia da Libertação, cfr. FERRARO, Benedito - A Significação Política e Teológica da Morte
de Jesus à Luz do Novo Testamento. Petrópolis: Editora Vozes, 1977. BOFF,
Leonardo -
Jesus Cristo, libertador. Ensaio de cristologia crítica para o nosso
tempo. 11ª ed. Petrópolis: Vozes, 1986. Id. - Paixão de Cristo, paixão do mundo. O fato, as interpretações e o
significado ontem e hoje. Petrópolis: Vozes, 1977. Ibid. - O Destino do Homem e do Mundo. Ensaio sobre
a vocação humana. 6ª ed. Petrópolis: Vozes, 1982, pp. 28-29. Ibid. - A Fé na Periferia do Mundo. 2ª ed.
Petrópolis: Editora Vozes, 1979, pp. 24ss. COMBLIN, José - A Força da Palavra. Petrópolis: Vozes,
1986. ARIAS, Mortimer - Salvação Hoje.
Entre o cativeiro e a libertação.
Trad. brasileira. Petrópolis-Rio de Janeiro: Editora Vozes-Tempo e Presença Editora,
1974, pp. 54ss. Os principais expoentes da Teologia da Libertação criticam
justamente a ausência de uma leitura engagé
da Paixão de Cristo, rejeitando as interpretações «veiculadas pela piedade e
pela homilética cristã, que magnificam a cruz pela cruz e terminam num
dolorismo que desarma a luta dos cristãos contra os mecanismos produtores de
dor e de cruz»: cfr. BOFF, Leonardo - Do Lugar do Pobre.
3ª ed. Petrópolis: Vozes, 1986, p. 119; este tema percorre um pequeno opúsculo
da sua autoria, em que a noção de «cruz»
é aplicada para caracterizar todas as situações de pobreza, opressão, etc.
(ex.: dos índios): cfr. BOFF, Leonardo - Como Pregar a Cruz Hoje numa Sociedade de Crucificados? 2ª ed.
Petrópolis: Vozes, 1986, em esp. pp. 19ss; sobre a tentativa de agregar todas
as situações de carência, exclusão, opressão ou marginalidade à luz de uma
categoria coerente, recorrendo-se não já à imagem de Cristo na cruz mas à noção
de «sofrimento» e ao exemplo de Job, cfr. GUTIÉRREZ, Gustavo - Falar de Deus a Partir do Sofrimento do
Inocente. Uma reflexão sobre o Livro
de Jó. Trad. brasileira. Petrópolis: Vozes, 1987, devendo chamar-se a
atenção que a ideia do «Cristo libertador» surge logo na obra fundadora desta
corrente teológica: cfr. GUTIÉRREZ, Gustavo - Teologia da Libertação. 6ª ed. Trad. brasileira. Petrópolis: Vozes,
1986, pp. 146ss. Id. - El Dios de la Vida.
Salamanca : Ediciones
Sígueme, 1992, pp. 37ss. Sobre a visão cristológica da Teologia da Libertação,
cfr., por ex., LOIS, Julio - Cristología en la teología
de la
liberación. In AA.VV. - Mysterium Liberationis. Conceptos fundamentales de la Teología de la Liberación. Vol. 1, 2ª
ed. Dir. de Ignacio Ellacuría e Jon Sobrino. Madrid: Editorial Trotta, 1994,
pp. 223ss, e, na mesma obra, BRAVO, Carlos - Jesús de Nazaré, el
Cristo liberador, a pp. 551ss, e SOBRINO, Jon - Cristología sistemática:
Jesuscristo, el mediador absoluto del reino de Dios, a pp. 575ss. MORFIN, Luis
Gonzalez -
La conversión a Jesuscristo libertador. Su importancia y su influjo en la reflexión
teológica. In AA.VV. - Liberación y
Cautiverio. Debates en torno al método de la teología en América Latina.
Cidade do México: s.n., 1975, pp. 469ss. GUTIÉRREZ, Gustavo - A Força Histórica dos Pobres. 2ª ed.
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movement theory. Chicago-Londres: The University of Chicago Press, 1991, pp. 36ss. GALOT,
Jean - Gesù Liberatore. Trad. italiana.
Florença: Libreria Editrice Fiorentina, 1978, pp. 34ss, obra que constitui,
indubitavelmente, uma das mais exaustivas análises do tema de «Cristo
libertador», ponto discutido mais fugazmente por KÄSEMANN, Ernst - Jesus Cristo é Liberdade. Trad.
portuguesa. Porto: Livraria Telos, 1973, pp. 17ss e, de forma muito inflamada e
incisiva, por REIS, Encarnação - Igreja sem
Cristianismo ou Cristianismo sem Igreja? Lisboa: Moraes Editores, 1969, pp.
126ss. O certo é que os modelos apontados não se situavam apenas na figura de
Cristo, mas também em figuras tão variadas como Joana d'Arc, Washington,
Bolívar, San Martín, Fidel Castro, Mao Zedong e Agostinho Neto: cfr. DUSSEL,
Enrique D. - Filosofia da
Libertação na América Latina. Trad. brasileira, 2ª ed. São Paulo: Edições
Loyola-Editora UNIMEP, s.d., p. 83. Para uma visão crítica, numa obra densa e
escrita sob a forma de «diário», mais centrada nos fundamentos do que no
ideário da Teologia da Libertação, e aludindo a um «Cristo Prometeu» no quadro de uma «cristologia da descida da
Cruz», cfr. THÉRAIOS, Démètre - Le Malaise Chrétien.
Archétypes marxistes de la théologie de la libération. Genebra-Paris : Georg-O.E.I.L.,
1987, em esp. pp. 41ss. Numa altura em que, curiosamente, alguns se referiam a
uma «crise cristológica» (cfr. SCHILLEBEECX, Edward - Jesus. La historia de un viviente. Trad. castelhana. Madrid:
Ediciones Cristandad, 1981, pp. 541; edição original de 1974), praticamente
todos os apelos feitos na década de sessenta e setenta a uma reactualização da
cristologia tinham um conteúdo ideólogico. Possui um óbvio sentido político a
ideia de que o Evangelho - a Paixão, em especial - deveria ser vivido hoje, pois relata «acontecimentos
que são vividos agora», «estão na nossa história presente», o tempo da acção: cfr. COMBLIN, José - O Tempo da Acção. Ensaio sobre o Espírito e
a História. Trad. brasileira. Petrópolis: Vozes, 1982, p. 83. Trata-se de
uma abordagem muito comum na época, podendo citar-se o livro de Hans-Werner
Bartsch, Der Tod eines Revolutionärs
(Wuppertal: Jugenddienst-Verlag, 1968). No entanto, a análise das implicações
da mensagem evangélica é muito anterior à década de sessenta, podendo
recordar-se, a título de mero exemplo, que no pós-guerra foi analisada a
posição de Cristo perante a questão nacional: cfr. BARTHES, C. - Le Christ devant la question nationale.
Toulouse: Fatima-Éditions, 1945. Como pode recordar-se, sem com isso se
pretender traçar qualquer paralelismo, que, durante o III Reich, alguns
teólogos protestantes procuraram definir Jesus como um ariano e o cristianismo
como uma religião em permanente luta contra o judaísmo: cfr. o interessante
trabalho de HESCHEL, Susannah – The Aryan
Jesus. Christian Theologians and the Bible in Nazi Germany . Princeton-Oxford: Princeton University Press, 2008 (noutra perspectiva,
cfr. STEIGMANN-GALL, Richard – The Holy
Reich: Nazi Conception of Christianity, 1919-1945. Cambridge :
Cambridge University Press, 2004; DIETRICH, Donald
J. – Catholic Theology and the Challenge of Nazism. In AA.VV. – Antisemitism, Christian Ambivalence and the
Holocaust. Dir. de Kevin P. Spicer. Bloomington: Indiana University
Press, 2007, pp. 76ss). Designadamente por força da Teologia Política e da
Teologia da Libertação, a discussão sobre o «Cristo político» permanece até aos
nossos dias, ainda que nos alvores da década de setenta nem todas as obras
tenham questionado tanto a politização de Cristo quanto a sua popularização,
como foi o caso de Superstar or Son of
God? (1973), de Desmond Forristal, ou Jesus
Christ: superstar or Saviour and Lord (1972), de John Coleman, podendo
ainda citar-se a obra The Jesus Myth,
de Andrew Greeley (1971), cujos derradeiros capítulos são precisamente
dedicados à dimensão política do magistério de Cristo: cfr. GREELEY, Andrew M. - El Mito de Jesus. Trad. castelhana.
Madrid: Ediciones Cristandad, 1973, em esp. pp. 216ss, o qual nega esta
dimensão, pelo menos no sentido ideológico ou «revolucionário» que à época lhe
queriam atribuir, na linha de outras obras publicadas ao tempo, como as que
admitem o radicalismo da mensagem evangélica mas não as extrapolações que daí
se pretendem fazer: cfr. CULLMANN, Oscar - Jesus and the
Revolutionaries. Nova
Iorque: Harper & Row, 1970, pp. 51ss; RICHARDSON, Alan - The
Political Christ. Londres: SCM Press, 1973; HENGEL, Martin – Jésus et la violence révolutionnaire. Trad.
francesa. Paris: Les Éditions du Cerf, 1973. O debate sobre o «Cristo político»
é muito rico, sendo analisado de forma brilhante e com uma profunda exegese
bíblica por SCHILLEBEECX, Edward - Cristo y los
Cristianos. Gracia y Liberación. Trad. castelhana. Madrid: Ediciones
Cristandad, 1982, pp. 554ss. Entre a imensa bibliografia cristológica sobre o
tema, cfr. ainda, por incidir sobre o «Jesus socialista» na cultura europeia do
século XX, dando como exemplos o caso espanhol e italiano, NESTI, Arnaldo - Gesù
socialista. Una tradizione popolare europea. In AA.VV. - Il Cristo dei Filosofi. Roma: Herder-EMF, 1995, pp. 167ss. Mais
desenvolvidamente, ainda que centrado no século XIX, fazendo remontar o tema do
«Cristo socialista» ao advento do próprio socialismo, cfr. BOWMAN, Frank Paul - Le Christ des Barricades, 1789-1848.
Paris: Les Éditions du Cerf, 1987. Curiosamente, algumas análises do «mito de
Jesus», de inspiração marxista, distanciavam-se do «fascínio» por Cristo,
justamente porque pressentiram - e bem - que a recentragem do ideário revolucionário no
cristianismo poderia ser ameaçador para os próprios fundamentos e perenidade do
marxismo; e, assim, se enalteceram a «novidade» do «programa social» do
cristianismo não deixaram de logo alertar para os limites e para o conformismo
face ao poder de Roma que marcaram a sua génese. Neste contexto, existe um
distanciamento singular entre aqueles, como Moltmann, que pretendem ultrapassar
a distinção Cristo vs. César e os que
afirmam que, ao assumir essa diferença, Cristo renunciou desde logo a um
qualquer programa «libertador» no mundo secular: cfr., neste último sentido,
LENTSMAN, Iakov -
A Origem do Cristianismo. Trad.
portuguesa: Lisboa: Editorial Caminho, 1986, em esp. pp. 214-215; sobre a visão
de Cristo pelos ateus e pelos marxistas de Leste, cfr. PRÖPPER, Thomas - Jésus: raison et foi. Théologiens et philosophes dans le débat christologique contemporain. Trad. francesa. Paris: Desclée
de Brouwer, 1978, pp. 53ss; MACHOVEC, Milan - Jésus pour les athées. Trad. francesa. Paris: Desclée de Brouwer,
1978. É interessante salientar que, se o processo de Jesus constitui um dos
momentos-chave para a construção do «Cristo político», todos os passos da sua
vida são passíveis dessa interpretação; assim, por exemplo, Küng discorre sobre
a «dimensão política do Natal» in KÜNG, Hans - Credo. A profissão de fé apostólica explicada ao homem contemporâneo.
Trad. portuguesa. Lisboa: Instituto Piaget, 1997, pp. 58ss. Sobre o problema da
dimensão política do Evangelho na cristologia contemporânea, numa revisão
extremamente serena e distanciada da literatura académica, cfr. BORG, Marcus J.
-
Jesus in Contemporary Scholarship. Valley Forge ,
Pensilvânia: Trinity Press International, 1994, pp. 97ss. Id. - Conflict, Holiness & Politics in the Teachings of Jesus. Nova
Iorque-Toronto: The Edwin Mellen Press, 1984, pp. 4ss, que analisa a
ultrapassagem da «exclusão da política» nas abordagens tradicionais da biografia
de Jesus (cfr. ainda, entre tantos outros, BIROU, Alain - Combat Politique et Foi en Jésus-Christ. Paris: Les Éditions
Ouvrières, 1972, pp. 25ss). Sobre a
«apoliticidade de Cristo», cfr. COSTE, René - Vangelo i Politica. Trad. italiana. Bolonha: Edizione Dehoniane,
1970, pp. 31ss. De uma forma extremamente simplificada e até simplista, cfr.
PIKAZA, Xabier -
Éste es el Hombre. Manual de Cristología.
Salamanca: Secretariado Trinitario, 1997, pp. 450ss. Para uma digressão pela
figura ou imagem cultural de Jesus como «libertador», de Tolstoi a Gandhi ou
Luther King, cfr. PELIKAN, Jaroslav - Jesus Through the
Centuries. His place in the History of Culture. Nova Haven-Londres: Yale University
Press, 1985, pp. 206ss. GREENE, Colin J. – Christology
in Cultural Perspective. Marking out the horizons. Grand Rapids , Michigan :
William B. Eerdmans Publishing Company, 2004, pp. 211ss. Numa análise
não particularmente profunda, WRIGHT, Tom - The Original Jesus. The life and vision of a revolutionary. Grand
Rapids , Michigan :
William B. Eerdmans Publishing Company, 1996. A grande tensão reside justamente numa
abordagem cristológica centrada na «resistência não-violenta» ou, ao invés, na
«revolução redentora»: cfr. YODER, John Howard - The Politics of Jesus. Grand Rapids,
Michigan: William B. Eerdmans Publishing Company, 1972, pp. 90ss e pp. 163ss;
numa análise que perde o referencial cristológico, sobre a abertura eclesial à
revolução, potenciada pela necessidade de reencontrar o discurso dos pobres e
de acompanhar o que o Autor designa por «modernidade aguda», cfr. COMBLIN, José
- ob. cit., pp. 321ss. A caracterização
de Jesus como «rebelde», «revolucionário» ou «libertador» não é, em si mesma,
passível de grande controvérsia, tudo dependendo, obviamente, do sentido e propósito
com que tais expressões são utilizadas ou, dizendo melhor, introduzidas numa
leitura e numa praxis contemporâneas
do Evangelho: para uma caracterização absolutamente imparcial de Cristo como
«rebelde» e «revolucionário» no contexto específico do seu tempo, cfr. a notável análise histórica de CROSSAN, John
Dominic -
The Historical Jesus. The life of a mediterranean jewish peasant. Nova Iorque: Harper Collins, 1992, pp. 207ss.
Numa visão não particularmente profunda, há quem discorra sobre a
natureza «politicamente incorrecta» de Jesus: cfr. BIFFI, Giacomo - Gesù di Nazaret. Centro del Cosmo e della
Storia. Turim: Editrice Elledici, 2000, pp. 59ss. Para uma súmula
extremamente bem construída, cfr. OPORTO, Santiago Guijarro - La
investigación sobre el Jesús histórico. Didaskalia.
Revista da Faculdade de Teologia de Lisboa. 32 (2002), pp. 3ss. Algumas interpretações
recentes vieram expurgar qualquer natureza política às acções de Jesus,
concebendo-as antes como «acções simbólicas» praticadas por um «profeta
escatológico», desmistificando de igual modo o processo de Jesus, o qual foi
preso e mandado executar por Caifás por razões de manutenção da ordem e
tranquilidade pública durante o período das festas: cfr. a análise extremamente
rigorosa, informada e objectiva de SANDERS, E. P. - A Verdadeira História de Jesus. Trad. portuguesa. Lisboa: Editorial
Notícias, 2004, em esp. pp. 316ss; para uma reconstrução sintética do tempo de
Jesus, cfr., entre nós, LOURENÇO, João Duarte - O Mundo Judaico em que Jesus Viveu. Lisboa :
Universidade Católica Editora, 2005; numa abordagem marcadamente descritiva,
mas que prima pela objectividade, cfr. LÉGASSÉ, Simon - Le Procès de Jésus. L'Histoire. Paris : Les Éditions du Cerf, 1994; CORLEY, B.
- Trial of Jesus. In Dictionnary of Jesus and the Gospels. Dir. de Joel B. Green e Scot
McKnight. Downer Grove , Ill. -Leicester : InterVarsity Press, 1992, pp. 841ss; cfr. ainda HORSLEY, Richard A. – Jesus and the spiral of violence. Popular Jewish resistance in Roma Palestine.
Minneapolis: Augsburg Fortress Publishers, 1992; sobre a natureza «política» lato sensu da decisão de executar Jesus,
cfr. QUESNEL, Michel – Jesus. O homem e o
filho de Deus. Trad. portuguesa. Lisboa: Gradiva, 2005, pp. 111ss. Uma
análise igualmente de grande rigor e objectiva, também extremamente informada,
conclui que não é possível dar primazia aos aspectos políticos do processo de
Cristo -
que podem ter estado presentes, tendo
em conta a messianidade de Jesus e a
sua pregação sobre o Reino de Deus -, tanto mais que a destrinça entre motivos políticos e
religiosos é praticamente impossível: cfr. NEVES, Joaquim Carreira das - Jesus Cristo. História e mistério.
Braga: Editorial Franciscana, 2000, pp. 233ss, que debate também a visão de
Jesus «político-zelota»: cfr. NEVES, Joaquim Carreira das - Jesus de Nazaré, Quem És Tu? Braga:
Editorial Franciscana, 1980, pp. 160ss. A crer naquelas interpretações, tal não
impossibilita, obviamente, a realização de leituras
políticas do Evangelho, de que é exemplo a atrás citada de Gustavo
Zagrebelski, de grande originalidade. Mas inviabiliza certamente uma visão do
«Cristo prometeico» (cfr. LǑCHMAN, Jan Milič - Christ ou Prométhée? La question cruciale du dialogue entre chrétiens
et marxistes. Trad. francesa. Paris: Desclée de Brouwer, 1977), ou seja, a
atribuição a Cristo de características
políticas («revolucionárias» ou
«libertadoras», por ex.) que não possuem qualquer apoio na realidade dos
factos. Sobretudo, impossibilita a insistência em visões re-actualizadoras da
mensagem evangélica, cuja pretensão de transposição para a realidade dos nossos
dias no quadro de uma «Cristopraxia» (cfr. LABARRIERE, Pierre-Jean - Le Christ Avenir. Paris: Desclée de
Brouwer, 1983, pp. 147ss) assenta, desde logo, num anacronismo e, pior ainda,
numa visão sem correspondência com a verdade histórica. Para usar uma dicotomia
de Rahner (cfr. RAHNER, Karl - Aimer Jésus.
Trad. francesa. Paris: Desclée de Brouwer, 1985, p. 97), não é possível
construir um «Cristo para nós» que não tenha correspondência no «Cristo em si»,
se este, por sua vez, também não tiver correspondência mínima com o Jesus
histórico (e aí poderemos, sem dúvida, encontrar na mensagem evangélica tópicos
como «solidariedade», por ex.: cfr. SESBOÜÉ, Bernard - Jésus-Christ, l'unique médiateur. Essai sur la redémption et le salut.
Vol. 1 -
Problématique et relecture doctrinale.
Paris: Desclée de Brouwer, 1988, pp. 357ss. DURRWELL, François-Xavier - Jésus, fils de Dieu dans l'Esprit Saint.
Paris: Desclée de Brouwer, 1997, pp. 71-72). Diversos enunciados dogmáticos
sobre Cristo [(1) Jesus, homem; (2) Jesus, judeu; (3) Jesus, mestre; (4) Jesus
anunciador; (5) Jesus, filho do Homem; (6) - Jesus, filho de Deus; (7)
-
Jesus, o Messias] autorizam por certo uma leitura política (cfr., para uma
descrição sumária daqueles tópicos,
GEISELMANN, Josef Rupert - Gesù il Cristo.
Vol. 1 -
Il Gesù storico. Trad. italiana.
Brescia: Paideia Editrice, 1967, pp. 181ss. THEISSEN, Gerd e MERZ, Annette – Jesus Histórico. Um Manual. Trad.
portuguesa. s.l.: Edições Loyola, 2004, passim).
Mas se a mensagem de Cristo é, por assim dizer, «formatada» para além dos
factos, com vista a adequá-la a projectos políticos do nosso tempo, a sua
utilização perde sentido e, mais ainda, qualquer legitimidade. Explicando
melhor: uma coisa é afirmar-se que Jesus foi um «revolucionário» no seu tempo; outra, muito diferente, é
sustentar que, por esse motivo, Jesus é, ou deve ser, um «revolucionário» no nosso tempo. Não se trata de um
problema de cristalização da mensagem evangélica, mas de (des)legitimação de um
discurso político. Procura-se por vezes ir mais longe, estabelecendo um
verdadeiro «programa» que assenta, até certo ponto, numa sobreposição da fé em
Cristo relativamente aos dados fornecidos pela exegese e pelo método histórico,
como que opondo o «Cristo da fé» ao «Cristo da História», questão que desde a
década de setenta vem sendo esboçada e problematizada [cfr. MOLTMANN, Jürgen - Le Dieu crucifié…, cit.; Id. - Jésus, le messie de Dieu, cit., p. 11; ROO, William A. Van - Basics of a Roman
Catholic Theology. Roma: Gregorian
University Press, 1982, pp. 343ss; GALVÃO, H. Noronha – Testemunho de fé e
história de Jesus. Didaskalia. Revista da Faculdade de Teologia/Lisboa.
36 (2006), pp. 135ss].
Curiosamente, este empreendimento passa, desde logo, por uma crítica àquela
cisão, esboçada desde a década de cinquenta (cfr. a síntese de FISICHELLA, Rino
-
La Rivelazione :
evento e credibilità. Saggio di teologia fondamentale. Bolonha: Edizione
Dehoniane, 1985, pp. 201ss), mas agora recuperada a favor de um dos lados, o
«Cristo da fé»; ou seja, tal crítica acaba por se enquadrar na dicotomia que
questiona. Nas palavras de Ratzinger, «os progressos da pesquisa
histórico-crítica levaram a distinções sempre mais subtis entre os diversos
estratos da tradição. Por trás destes, a figura de Jesus, sobre a qual assenta
a fé, foi ficando cada vez mais diluída, com contornos sempre menos claros. Ao
mesmo tempo as reconstruções deste Jesus, que devia ser procurado por trás das
tradições dos evangelistas e das suas fontes, tornaram-se cada vez mais
contrastantes: desde o revolucionário anti-romano que visa a derrocada dos
poderes constituídos e naturalmente fracassa, até ao pacífico moralista que
tudo permite e de modo inconcebível acaba por causar a própria ruína. Quem lê
sucessivamente várias destas reconstruções, imediatamente se dá conta de que
elas são muito mais a fotografia dos autores e dos seus ideais do que a
reposição de um ícone que entretanto se tinha diluído». Depois, questiona-se o
método histórico por ter a pretensão de «actualizar» a figura de Cristo: «se o
método histórico quer permanecer fiel a si próprio, não deve apenas procurar a
palavra como algo que pertence ao passado, mas deve também deixá-la no passado.
Nela pode vislumbrar pontos de contacto com o presente, com a actualidade (...)
mas não pode torná-la actual, "de hoje" - neste caso ultrapassaria
o que lhe é próprio. De facto, é o rigor na explicação do passado que constitui
tanto a sua força como o seu limite»: cfr. RATZINGER, Joseph - Jesus de Nazaré. Trad. portuguesa.
Lisboa: A Esfera dos Livros, 2007, p. 12 e p. 17, respectivamente; cfr. ainda
RATZINGER, Joseph -
El Dios de JesuCristo. Meditaciones sobre
Dios uno y trino. Trad. castelhana. 2ª ed. Salamanca: Ediciones Sígueme,
1980, em esp. pp. 55ss e pp. 87ss (opondo a «tradição confessional» à «tradição
narrativa» e declarando a superioridade da primeira); Id. - Introducción al cristianismo. Trad.
castelhana. 4ª ed. Salamanca: Ediciones Sígueme, 1979, pp. 163ss. Aquela advertência às limitações do método
histórico tem, naturalmente, um objectivo: impedir que ele constitua a base de
uma reconstrução actualizadora do «Jesus histórico», sempre subversiva, em nome
da reserva ou monopólio doutras instâncias, que não a exegese, na construção do
«Cristo da fé» adequado ao mundo contemporâneo. Cfr. a importante recensão
àquela obra de Ratzinger de CORNWELL, Peter - Whistle at the darkness. Times Litterary Supplement, de 25-I-2008. A oposição entre o
«Cristo da fé» e o «Jesus histórico» não é um contributo original de Ratzinger,
estando presente mesmo em obras da década de setenta, como Jesus von Nazareth. Geschischte und Relevanz (1970), de Josef
Blank, as quais pouco ou nada se debruçam sobre as dimensões políticas da
mensagem evangélica: cfr. BLANK, Josef - Jesus de Nazaret. Historia y mensaje. Trad. castelhana. Madrid:
Ediciones Cristandad, 1973, pp. 15ss. Curiosamente, Régis Debray, antigo
companheiro da guerrilha boliviana e autor de Revolução na Revolução, numa análise tão iconoclasta quanto
interessante, estabelece limites à investigação da historicidade de Jesus que
não andam longe dos definidos por Ratzinger: cfr. DEBRAY, Régis - Deus, um Itinerário. Materiais para a história do Eterno no
Ocidente. Trad. portuguesa. Porto: Ambar, 2002, pp. 163ss. Há quem procure,
sem grande sucesso, superar essa distinção – ou, pelo menos, proclamar que o
fez, acabando por se ater ao «Cristo histórico»: cfr., por ex., TORRENTS, José
Montserrat – Jesus, o galileu armado.
Trad. portuguesa. Lisboa: Esfera do Caos, 2008. Outros autores chamam a atenção
para a circunstância de, uma vez que Jesus não deixou testemunhos pessoais e
directos, toda a indagação da sua historicidade estar mediada a priori pelas reconstruções feitas por
outros: «nenhum texto emana directamente de Jesus. Aquele que provocou a
ruptura na continuidade do judaísmo não deixou nenhum escrito da sua mão.
Quanto aos que relatam as suas palavras e gestos, que descrevem com todo o
pormenor os acontecimentos que fizeram da sua vida uma existência fora do
comum, utilizam um filtro que origina que nunca se possa dissociar a parte que
depende do Jesus histórico da que aparece na reconstrução»: cfr. SACHOT,
Maurice – A Invenção de Cristo. Génese de
uma religião. Trad. portuguesa. Lisboa: Editorial Notícias, 1999, p. 17.
Aludindo, de forma muito sibilina, àqueles que pretendem limitar a investigação
histórica, considerando que a Teologia se deveria ater à mensagem contida nos
Evangelhos, cfr. STANTON, Graham N. - Historical
Jesus. In A Dictionary of Biblical
Interpretation. Dir. de R. J. Coggins e J. L. Houlden. Londres: SCM
Press, 1990, p. 290. A
controvérsia está longe de se encontrar resolvida, falando-se mesmo numa
«terceira investigação» (third research)
sobre o «Jesus histórico», no seio da qual se encontram autores, como J. D.
Crossan, que assumem a clara cisão entre o «Jesus histórico» e o «Jesus da fé»,
uma cisão que Ratzinger, como se viu, contesta frontalmente; mesmo um autor tão
influente como Crossan persiste em encarar Cristo como um hippy crítico da riqueza e amante dos pobres: cfr. SEGALLA,
Giuseppe -
La terza ricerca del Gesù storico e il suo paradigma postmoderno. In Prospettive Theologiche per il XXI Secolo.
Dir. de Rosino Gibellini. Brescia: Editrice Queriniana, 2003, pp. 227ss. Sobre
a «terceira investigação», numa breve nota, cfr. STANTON, Graham N. - ob. cit., p. 289; sobre a new quest na investigação do Cristo
histórico, lançada na década de cinquenta por Käsemann, Fuchs ou Bornkamm, cfr.
ainda FRANCE, Richard - Historical Jesus. In The Blackwell Encyclopedia of
Modern Christian Thought. Dir. de Alister E. McGrath, Oxford: Blackwell,
1993, em esp. pp. 262ss. Para uma revisão sumária da literatura da
década de sessenta e setenta, sem destaque de grande relevo para o «Cristo
político», cfr. MICHIELS, Robrecht - Jésus-Christ,
hier, aujourd'hui, demain. Trad. francesa. Tournai: Casterman, 1971, pp.
95ss. Registe-se que o que ocorreu com o «Cristo político» se verificou, mais
recentemente, e de uma forma muito menos elaborada, com as visões de Jesus dos
novos movimentos religiosos: cfr. VERNETTE, Jean - Jésus dans la nouvelle religiosité. Esotérismes, gnoses et sectes
d'aujourd'hui. Paris: Desclée de Brouwer, 1987. Uma das mais conseguidas
tentativas de compatibilização entre as duas visões (historicidade/não-historicidade)
é da autoria de WRIGHT, N. T. - The New Testament and the People of God. Vol. 1 - Christian origins and the question of God. ed. revista. Londres: Society for Promoting Christian Knowledge,
2004.; cfr. tb. NODET, Étiénne – Histoire
de Jésus? Nécessité et
limites d’une enquête. Paris: Les Éditions du Cerf, 2003. Questão diversa,
porque sem ligação directa ao problema da historicidade de Jesus (no fundo, à
verificação da autenticidade da sua
mensagem de acordo com os pressupostos racionais e científicos exigidos
pelo mundo secular) é descobrir na mensagem evangélica pontos de apoio para um
discurso político contemporâneo, mas já destituído da pretensão de um apoio no
«Cristo real»: cfr., por ex., SUBILIA, Vittorio - L'Evangelo della Contestazione. Brescia: Paideia Editrice, 1971,
obra muito típica da época em que foi publicada, mas que acaba por concluir
pela impossibilidade de estabelecer antinomias tais como utopia vs. conservadorismo, velho vs. novo. A tentativa de estabelecimento
dessas antinomias ainda está presente na obra que Felicidade Alves dedica à
figura de Jesus, na qual descobre uma personalidade que, sem aderir à
estratégia de violência armada adoptada pelos zelotas, era um «homem do povo,
amante do seu povo e da sua terra», pelo que naturalmente «sentir-se-ia
solidário com os sentimentos de fundo deles, embora não partilhasse dos métodos
deles»: cfr. ALVES, José da Felicidade – Jesus
de Nazaré. Segundo os testemunhos da primeira geração cristã. Lisboa:
Livros Horizonte, 1994, p. 350.
[48] Cfr. SOULETIE, Jean-Louis – ob. cit.. MOINGT, Joseph - L'homme qui venait de Dieu. Paris: Les
Éditions du Cerf, 1993, pp. 276ss.
[50] Cfr.
HABERMAS, Jürgen -
O Discurso Filosófico da Modernidade.
Trad. portuguesa. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1990.
[51] Cfr.
HABERMAS, Jürgen -
Theory and Practice. Trad. inglesa.
Cambridge: Polity Press, 1988, em esp. pp. 253ss.
[52] Cfr.
aquela definição de esfera pública in HABERMAS, Jürgen - Mudança estrutural da esfera pública. Investigações quanto a uma
categoria da sociedade burguesa. Trad. brasileira. Rio de Janeiro: Tempo
Universitário, 1984, p. 42; alguns intérpretes do pensamento de Habermas
qualificam a esfera pública como «o espaço da vida social em que se pode formar
a opinião pública»: cfr. RODERICK, Dick - Habermas and the foundations of Critical Theory. Londres:
MacMillan, 1986, p. 42; outros apontam a tensão insanável entre a vertente
histórica e a vertente normativa do conceito de esfera pública: cfr. HOLUB,
Robert -
Jürgen Habermas. Critic in the public
sphere. Londres:
Routledge, 1991, p. 7; AA.VV. - Habermas and the Public Sphere. Dir. de Craig Calhoun.
Cambridge, Mass.: The MIT Press, 1992; sobre a influência na «Teologia
Política», cfr. OELMÜLLER, Willi -
Problemas del proceso moderno de la libertad y de la ilustración. In METZ ,
J. B., MOLTMANN, J. e OELMÜLLER, W. - Ilustración y teoría
teológica. La iglesia en la encrucijada de la libertad moderna. Aspectos de una
nueva teologia política. Trad. castelhana. Salamanca: Ediciones Sígueme,
1973, em esp. pp. 88ss.
[53] Cfr.
MAYEUR, Jean-Marie -
Catholicisme intransigeant, catholicisme social, démocratie chrétienne. Annales E.S.C. (Março-Abril de 1972), em
esp. p. 488.
[54] Cfr.,
por ex., METZ, Johann Baptist - Les rapports entre l'Église et le monde à la lumière
d'une théologie politique. In AA.VV. - La théologie du renouveau. Vol. 2. Dir. de Laurence K. Shook e
Guy-M. Bertrand. Paris: Les Éditions du Cerf, 1968, pp. 33-34; COCCOLINI,
Giacomo – ob. cit., pp. 73ss; sobre o
significado teológico da Aufklärung,
cfr. WARIN, Pierre -
Le chemin de la théologie chez Wolfhart
Pannenberg. Roma: Università Gregoriana Editrice, 1981, pp. 19ss.
[55] Cfr.
RATZINGER, Joseph -
Iglesia, ecumenismo y política. Nuevos
ensayos de eclesiología. Trad. castelhana. Madrid: Biblioteca de Autores
Cristianos, 1987, p. 173.
[56] Cfr.,
por ex., ASSMAN, Hugo - Teología desde la
praxis de la
liberación. Salamanca : Ediciones Sígueme, 1976, p. 13.
[57] Cfr.,
em sentido contrário, CLERCQ, Bertrand J. de - Religion, idéologie et politique. Tournai: Casterman, 1968, em esp.
pp. 114ss; COSTE, René - Évangile et
politique. s.l.: Éditions Aubier-Montagne, 1968, pp. 39ss
[59] Cfr.
GEFFRÉ, Claude -
La fonction idéologique de la sécularisation dans le Christianisme
contemporain. In AA.VV. - Herméneutique de la sécularisation. Aubier : Éditions
Montaigne, 1976, pp. 121ss.
[60] Cfr. METZ , Johann Baptist - Pour une théologie du monde. Trad.
francesa. Paris: Les Éditions du Cerf, 1971, pp. 27ss e pp. 39ss; e, do ponto
de vista cristológico, MOLTMANN, Jürgen - Jésus..., cit., passim, e,
numa união entre cristologia e cristopraxia, p. 9.
[62] Sobre
aquele problema, cfr. RAHNER, Karl - La cristología dentro de una concepción evolutiva del
mundo. In Escritos de Teología. Nuevos escritos. Vol. V. Trad.
castelhana. Madrid: Taurus Ediciones, 1964, pp. 181ss.
[63] Interrogando-se
sobre as relações entre «Teologia da Libertação» e a «Teologia Política», cfr.
COCCOLINI, Giacomo – ob. cit., pp.
100ss.
[65] Cfr.
MONDIN, Battista – Esperança Marxista e
Esperança Cristã. Trad. portuguesa de Anselmo Borges. Porto: Livraria Telos
Editora, 1972, p. 180.
[66] Cfr.
LECLERC, Gérard - Le bricolage religieux. s.l.: Éditions du Rocher, 2002, em esp. pp.
63-64; HERVIEU-LÉGER, Danièle - La religion des Européens: modernitè, religion,
sécularisation. In DAVIE, Grace e HERVIEU-LÉGER, Danièle - Identités religieuses en Europe. Paris:
Éditions La Découverte ,
1996, pp. 20-21; Id. - O Peregrino e o
Convertido. A Religião em Movimento. Trad. portuguesa. Lisboa: Gradiva,
2005, pp. 47ss, falando também em «religião à la carte» - p. 187; sobre a fé como
«decisão», mais do que como «herança», cfr. TERRA, Domingos – A decisão da fé
na cultura das preferências individuais. Didaskalia.
Revista da Faculdade de Teologia/Lisboa.
36 (2006), pp. 171ss.
[70] Cr.
MOITA, Luís -
Fidelidade ao depósito da fé e adaptação. In AA.VV. - Semanas Portuguesas de
Teologia. Estudos Teológicos. Actas da VII Semana Portuguesa de Teologia,
realizada em Lisboa, no Colégio Universitário Pio XII, de 23 a 27 de Setembro de 1963.
s.l.: s.n., 1970, pp. 57ss.
[72] Cfr. RIGAL, Jean - L'ecclésiologie de communion. Son évolution historique et ses
fondements. Paris : Les Éditions du
Cerf, 1997, pp. 197ss; XHAUFFLAIRE, M. - ob.
cit., pp. 53ss; sobre a eclesiologia da «Teologia Política», cfr.
CAVANAUGH, William T. – Church. In The Blackwell
Companion to Political Theology, cit., pp. 393ss.
[74] Cfr. MURDOCH, Iris - Metaphysics as a Guide to Morals. Harmondsworth:
Penguin Press, 1992, p. 137.
António Araújo
Cos diabos, na nota 47 não exagerou um bocadinho?
ResponderEliminarA nota de rodape n. 59 da tese de doutoramento de orlando caravalho que tinha 60 paginas fez escola!
EliminarConhecem com certeza a fábula da sopa de pedra de Almeirim.Isto é igual.A sopa é boa mas onde raio interessa e está apedra?!
ResponderEliminarA pedra a que me refiro é obviamente a Teologia.Impressionante fazer a construção de uma teoria filosofica baseada em "revelações"?Mensagens evangélicas?Só acho paralelo assim como tentar uma explicação para orígem dos tsunamis começando por uma revelação e continuando depois por um caminho de investigação moderno ,aplicando progressivamente e corretamente os dados científicos que foram sendo ao longo dos tempos , adquiridos .
ResponderEliminarOs Gregos e os Romanos pré cristãos ficam obviamente fora da discussão que só começa portanto com a"mensagem"?!
Pura e simplesmente é superior ao meu parco entendimento que se gaste tanta inteligencia e tempo a partir de boatos não confirmados.Paciencia mas não arderei sózinho no fogo eterno.