Besta quadrada.

 

 

 

João Quadros – dizem – é humorista. Talvez devido à frustração íntima de ser um humorista sem piada nenhuma, ficando a anos-luz dos seus colegas de ofício, deu-lhe para gracejar sobre uma pessoa com cancro, que perdeu o cabelo em resultado de tratamentos de quimioterapia. «Que se lixem as gadelhas», «mulher careca» ou «a Laura ou ia assim ou levava um lenço da Grécia»… O que está em causa é uma fotografia tirada em Cabo Verde e o alegado aproveitamento político, por parte de Passos Coelho, da doença da sua mulher, Laura Ferreira. O «humorista» obtuso nem concede o elementar benefício da dúvida: sem se interrogar sequer um segundo sobre os motivos desta aparição pública de Laura Ferreira, parte logo para o insulto. O que mais impressiona? O ódio, o seu imenso ódio. E a cegueira da raiva, cruel e bruta. É perfeitamente admissível discutir este assunto, mas jamais desta maneira. Mesmo na hipótese – teórica, especulativa – de existir um aproveitamento político de uma tragédia pessoal e familiar, falar como Quadros falou só beneficia o primeiro-ministro. Pela repulsa e indignação que gera, pela onda de simpatia que suscita em torno dos visados. Não já, ou não apenas, devido à doença de Laura – mas por haver um imbecil que tem o desplante e a desumanidade de fazer estas graçolas sem graça nem sentido. Mais do que o cancro  de Laura, o que dá votos a Passos é a estupidez de Quadros. Mas Quadros é tão quadrado que nem a sua estupidez percebe. O que, para  um desgraçado com pretensões a «humorista», é mais fatal do que o pior dos cancros.

 

António Araújo