Por muitos livros e artigos que o historiador Hugh Trevor-Roper (1914-2003) haja escrito, o seu nome ficará para sempre ligado a um título, redigido quando jovem, The Last Days of Hitler (de que existe tradução portuguesa). O clássico dos clássicos sobre os momentos derradeiros no bunker de Berlim, muito anterior ao livro de Fest sobre o mesmo tema. Anos depois, em 1983, a sua reputação ficou manchada ao ter avalizado a autenticidade do «diários» do Führer, uma história rocambolesca que é narrada por Robert Harris num livro trepidante, Selling Hitler, anterior a outros seus trabalhos menos conseguidos, como os romances Fatherland e, pior ainda, Archangel. A dada altura, quando Trevor-Roper (nobilitado em 1979 pela rainha com o título de barão de Dacre of Glanton) começou a expressar dúvidas e a hesitar na publicação dos «diários», o magnata da imprensa Rupert Murdoch vociferou um célebre «Fuck Dacre!» e mandou avançar as máquinas. Os resultados foram desastrosos.
A sua vida foi pautada por diversas
polémicas: Evelyn Waugh criticou as suas constantes diatribes contra o
catolicismo; outros apontaram-lhe o seu tremendo snobismo e indisfarçável fascínio
pela aristocracia; Trevor-Roper não se tornou propriamente popular ao defender
que África não tinha história antes da chegada dos europeus, enfim, uma vida
cheia, como académico e colaborador da imprensa. Foi nesta qualidade que passou
por Lisboa em 1963, ao serviço do Sunday
Times. De cá escreveu uma carta, em 5-7 de Abril, ao seu amigo e colega James Howard-Johnson. Foi publicada há pouco numa colectânea da sua correspondência
organizada pelo seu principal biógrafo, Adam Sisman (One Hundred Letters From Hugh Trevor-Roper, Oxford University Press, 2014). A tradução aqui publicada
é algo «livre» e não particularmente rigorosa, pretendendo-se tão-só divulgar a
visão (de resto, com erros e imprecisões) que Hugh Trevor-Roper teve do
Portugal nos alvores da década de 1960. Há alusões veladas no texto a Christine
Garnier, Humberto Delgado, Henrique Galvão, etc., que, por serem demasiado
óbvias, se entendeu não ser necessário explicitar em nota.
Lisboa, 1963
|
Lis Hotel, Avenida da Liberdade 180, Lisboa 2
Meu querido James,
Tenho pensado muitas vezes em ti, interrogando-me sobre como decorreu a tua expedição à Dordonha. Onde foste, o que achaste? Imaginei um trio bizarro: tu, McCreery e o filipino, dois homens brancos e altos, o outro negro e atarracado, discutindo ao acaso, sem chegar a conclusão alguma, sobre filosofia, literatura e a vida, no cimo das colinas ou nas grutas pré-históricas daquela região antiga. Deixa-me confessar que aquela carta que te pressionei a escreveres era uma espécie de chantagem. E, como chantagem que era, mereceu ser mal sucedida.
Não
estou a gostar de Portugal, lamento. Em teoria, até podia gostar: há aqui
coisas que aprecio. O peixe, por exemplo. Que deliciosas lampreias têm, que
ricas sopas de peixe, que variedade de moluscos! E quando voltarei a saborear uma
magnífica tarte de lulas [squid-pie] como
a que comi no passado domingo, quando fui a Sintra almoçar com um velho amigo
que adorei reencontrar, aos 83 anos, bem-disposto e extravagante como sempre? O
Dr. José d’Almada, antigo consultor financeiro do Ministro português do
Ultramar [Desenvolvimento], um homem que quase conheceu Cecil Rhodes e que certamente
conhece toda a gente, inglesa ou portuguesa, que esteve envolvida na grande política
imperialista em África depois de Rhodes. É uma das minhas melhores fontes, e a
mais agradável. Receei que tivesse morrido ou estivesse gagá, mas longe disso.
Vou regularmente almoçar com ele – os almoços são sempre deliciosos – quer na
sua casa em Lisboa, quer na sua maravilhosa quinta em Sintra, onde construiu um
soberbo jardim de plantas africanas. Tem também uma casa na Madeira, que
pretende vender, de preferência a um inglês, porque – diz ele – os ingleses
sabem cuidar dos jardins e aquele jardim é o seu grande orgulho. Será que a
Universidade de Oxford não gostaria de ter um lugar assim, onde os seus
professores pudessem escrever livros? Oh, tive de lhe explicar que os
professores universitários ingleses não têm posses para comprar casas na
Madeira nem sequer para viajar até lá.
Mas, apesar disto tudo, apesar de todas
as belezas de Portugal, que tenho de admitir serem muitas, sinto-me um
prisioneiro. Tenho de escrever o meu artigo e, para fazê-lo, devo permanecer em
Lisboa, falar com pessoas, ler papéis e documentos, pelo que não posso visitar as
belezas desta terra. Desejava ser menos consciencioso, limitando-me a publicar
um artigo divertido inteiramente com base nos riquíssimos mexericos do Dr. d’Almada;
depois passaria o resto do tempo a comer lampreias e lagostas numa pousada
romântica à beira-mar, no Algarve, a região tropical mais a sul de Portugal.
Mas, por qualquer razão, sou incapaz de fazê-lo. E, tenho de admiti-lo, a
política portuguesa – ou, melhor, a estrutura política de Portugal (já que a
política não é permitida) – fascina-me. Este ditador estranho, meio contabilista,
meio padre, que vive como um eremita (mas gosta do perfume dos milionários em
seu redor) e que ostenta uma pose de filósofo (quando julgo que não passa de um
impostor), é algo de único neste século, só concebível em Espanha ou em
Portugal. Penso que Filipe II seria como ele. Mas, ao menos, quando Filipe II
defrontou o Papa, fê-lo sendo o mais poderoso monarca da cristandade, ao passo
que Salazar parece não compreender que Portugal, este Tibete minúsculo, que há
35 anos está isolado do progresso, é na realidade um país muito pequeno e muito
pobre. Ainda assim, este governante católico muito devoto acaba de prender os
padres negros de Angola, trazendo-os para Lisboa, de onde não os deixará sair;
e acaba de expulsar de Portugal o bispo do Porto, impedindo-o de regressar
durante cinco anos: se aparecer na fronteira, a polícia impedir-lhe-á a entrada.
Tudo isto é muito doloroso para o Papa…
Hoje, sentindo-me deprimido pela vida de Lisboa, e sabendo que no fim-de-semana não estaria cá ninguém, decidi fugir. Necessitava de ar fresco, ansiava por me encontrar na solidão do campo, cercado pela floresta (Portugal tem belas florestas) e pelo som da água a correr. Consultei um amigo de confiança, que me aconselhou a ir a Abrantes, cerca de 100 milhas acima do Tejo. Mas, pobre de mim, um português «de confiança» é coisa que não existe. Os portugueses, à semelhança dos persas, acreditam que é sempre melhor dizerem-te o que julgam que gostarás de ouvir, seja ou não verdade. É uma coisa que está sempre a acontecer-me. Ainda esta manhã, nada menos do que quatro portugueses garantiram-me que estava no comboio certo; felizmente, não foram capazes de me convencer, porque a carruagem ia na direcção oposta à que eu queria. É algo que está sempre a acontecer. Quanto a Abrantes, quando lá cheguei, após uma jornada de um tédio infinito (os comboios portugueses são inacreditavelmente lentos), tendo esperado encontrar uma pousada maravilhosa, situada nalgum castelo antigo, ensombrada por eucaliptos e na frescura de uma ribeira próxima, deparei com uma pavorosa casa à beira da estrada, situada na curva de uma rotunda constantemente atravessada por camiões, sem jardim algum, a comida horrível, um serviço péssimo, e música enlatada a troar pelo edifício inteiro. É claro que fiquei furioso, o que de nada me valeu. Enganado sucessivamente, e por duas vezes, sobre (a) o horário (b) o percurso dos autocarros, passei a tarde inteira sentado, a deitar fumo, no átrio, à espera de uma salvação que nunca chegou. Agora estou condenado a passar aqui a noite. O meu estado de espírito, como imaginas, está muito em baixo, e a minha confiança nas pessoas profundamente abalada. O mesmo amigo de confiança que me recomendou este passeio ofereceu-se para me levar à sua casa no norte, na próxima semana. Mas, claro, pergunto-me que tipo de casa será a sua. Devo fugir? Mas, se o fizer, com quem passarei o tempo, com quem enfrentarei o horror da Semana Santa? É certo que, por aqui, as coisas não são tão horríveis como em Espanha. Salazar sabe-o bem; no fundo, a sua atitude mental é a de um sacerdote protestante. Estaria bem na Igreja da Escócia. Vejo-o a pregar na igreja de Mertoun se, por acaso, o Dr. Sawyer estivesse fora. Seria capaz de ler o seu sermão, numa voz monocórdica […] A propósito, ele foi educado num seminário para se tornar padre (como Estaline), mas compreendo que não goste que se fale muito disso. Obriga todos os padres católicos daqui a vestirem-se como pastores protestantes: nada de hábitos ou mitras. É também muito estrito quanto às procissões. Não há frades nem freiras: todos os conventos foram transformados em quartéis.
Hoje, sentindo-me deprimido pela vida de Lisboa, e sabendo que no fim-de-semana não estaria cá ninguém, decidi fugir. Necessitava de ar fresco, ansiava por me encontrar na solidão do campo, cercado pela floresta (Portugal tem belas florestas) e pelo som da água a correr. Consultei um amigo de confiança, que me aconselhou a ir a Abrantes, cerca de 100 milhas acima do Tejo. Mas, pobre de mim, um português «de confiança» é coisa que não existe. Os portugueses, à semelhança dos persas, acreditam que é sempre melhor dizerem-te o que julgam que gostarás de ouvir, seja ou não verdade. É uma coisa que está sempre a acontecer-me. Ainda esta manhã, nada menos do que quatro portugueses garantiram-me que estava no comboio certo; felizmente, não foram capazes de me convencer, porque a carruagem ia na direcção oposta à que eu queria. É algo que está sempre a acontecer. Quanto a Abrantes, quando lá cheguei, após uma jornada de um tédio infinito (os comboios portugueses são inacreditavelmente lentos), tendo esperado encontrar uma pousada maravilhosa, situada nalgum castelo antigo, ensombrada por eucaliptos e na frescura de uma ribeira próxima, deparei com uma pavorosa casa à beira da estrada, situada na curva de uma rotunda constantemente atravessada por camiões, sem jardim algum, a comida horrível, um serviço péssimo, e música enlatada a troar pelo edifício inteiro. É claro que fiquei furioso, o que de nada me valeu. Enganado sucessivamente, e por duas vezes, sobre (a) o horário (b) o percurso dos autocarros, passei a tarde inteira sentado, a deitar fumo, no átrio, à espera de uma salvação que nunca chegou. Agora estou condenado a passar aqui a noite. O meu estado de espírito, como imaginas, está muito em baixo, e a minha confiança nas pessoas profundamente abalada. O mesmo amigo de confiança que me recomendou este passeio ofereceu-se para me levar à sua casa no norte, na próxima semana. Mas, claro, pergunto-me que tipo de casa será a sua. Devo fugir? Mas, se o fizer, com quem passarei o tempo, com quem enfrentarei o horror da Semana Santa? É certo que, por aqui, as coisas não são tão horríveis como em Espanha. Salazar sabe-o bem; no fundo, a sua atitude mental é a de um sacerdote protestante. Estaria bem na Igreja da Escócia. Vejo-o a pregar na igreja de Mertoun se, por acaso, o Dr. Sawyer estivesse fora. Seria capaz de ler o seu sermão, numa voz monocórdica […] A propósito, ele foi educado num seminário para se tornar padre (como Estaline), mas compreendo que não goste que se fale muito disso. Obriga todos os padres católicos daqui a vestirem-se como pastores protestantes: nada de hábitos ou mitras. É também muito estrito quanto às procissões. Não há frades nem freiras: todos os conventos foram transformados em quartéis.
Como vês, os meus pensamentos regressam sempre ao Dr. Salazar. É impossível evitá-lo. Tudo o que acontece na vida portuguesa trá-lo de volta, de cada vez sob uma forma ligeiramente diferente da anterior; umas vezes sob a forma de um antigo advogado da família, outras nas vestes de uma ama dominadora, outras como um padre puritano. De qualquer modo, há características constantes: o puritanismo, o estilo antiquado, o culto do rigor. Anda a tentar adocicar a sua imagem, mas não creio que vá ter sucesso. Há alguns anos, os milionários que rodeiam o trono acharam que deveriam fazer algo para melhorar as coisas e contrataram uma romancista francesa para vir passar as férias com ele, dizendo depois como ele era simpático e agradável. Ela fê-lo, mas ninguém a levou a sério. Ultimamente, abandonou estas tácticas amadoras e adoptou um método mais eficaz, contratando os serviços de uma grande empresa americana de relações públicas, a Selvage and Lee Inc., de Nova Iorque, para que o apresentem ao mundo como um líder imaginativo, progressista, liberal, etc. Mas receio que também isto não surta qualquer efeito. Interrogo-me se a Selvage and Lee foi fundada por Ivy Lee, que fez fortuna a melhorar a imagem de John D. Rockfeller, tirando-lhe os seus aspectos mais sombrios e apresentando-o como um velho amador de golfe cujo único interesse na vida consistia em dar doces às crianças e milhões para obras de caridade. Poderá pensar-se que quem é capaz de adoçar a imagem de Rockfeller também será capaz de o fazer com Salazar, mas não é o caso. Para mais, todo o trabalho que fizessem seria destruído por uma conspiração maléfica de afro-asiáticos, liberais, comunistas, ateus, protestantes, etc. (aos quais deveremos agora juntar almirantes, generais, cardeais e capitães-piratas de alto mar).
Comecei há uns dias a levar a sério a
aprendizagem da língua portuguesa. Dado que a leio com facilidade, achei frustrante
ser incapaz de a falar ou de a entender além de um nível rudimentar. Tomei uma
decisão firme; uma vez que o grande problema é a pronúncia, que não se capta através
da soletração, pedi emprestados ao Instituto Britânico um gira-discos e uma
série de discos de linguafone. Estava a ir muito bem, falando pelo nariz e, com
destreza, silenciando metade das vogais e metade das consoantes na forma
apropriada, até jantar ontem com Virgínia Rau, uma historiadora portuguesa. Ergueu
as mãos em sinal de horror e mandou-me parar de imediato com aquela
aprendizagem, argumentado que (a) nenhum estrangeiro será capaz, algum dia, de
falar correctamente português; (b) o único efeito disto será arruinar o meu espanhol.
Ordenou-me que devolvesse o aparelho e os discos ao Instituto Britânico e que renunciasse
para sempre a este projecto louco, ou vaidoso, de tentar falar português. Podes
ver até que ponto a minha vida é frustrante.
Gostava de estar em Chiefswood.
Enquanto me debato com estes desaires sucessivos, enquanto subo, ou cuidadosamente
desço, as ruas de Lisboa (que têm uma inclinação de 1 em 3 e são pavimentadas com
pedras polidas, garantindo que qualquer estrangeiro se estatele no chão),
recordo a música daquele regato e vejo diante mim, como um milagre que se ergue
num deserto ardente, a imagem das árvores que nesta altura florescem – não de
uma forma abrupta, como aqui, mas gentilmente, suavemente, amorosamente. Estás
a admirá-las? Como estão as tuas novas árvores? Alguma delas sobreviveu ao
Inverno? Como vai o rapaz francês? Receio que tenha uma influência desastrosa
no Peter. Recebeste alguma daquelas indiscretas cartas de Xenia, de França?
Desligaste o aquecimento no nº 8 de St. Aldates? Chiefswood está tão belo como
eu imagino?
Ille terrarum mihi praeter omnes
Angulus ridet, ubi non Hymetto
Mella
decedunt, viridique certat
baca
Venfaro…
(baca, neste caso, é a sorveira-brava, claro)
Afectuosamente,
Hugh
6
de Abril de 1963
PS – esta carta esteve 24 horas à espera de ser colocada no correio, pelo que posso escrever mais um pouco e actualizá-la, para que termine de uma forma mais agradável. Esta manhã fugi da horrível casa à beira-estrada: mas para onde devia fugir? Sem ter quem me aconselhasse, e não acreditando em ninguém a não ser em mim próprio, decidi-me por Lisboa. Ao princípio julguei que deveria parar em Santarém, pelo que apanhei um autocarro para Santarém (em Portugal, os autocarros são ainda mais lentos do que os comboios, mas muito mais simpáticos. Prefiro usá-los, ainda que haja o problema de nunca conseguirmos saber para onde vão ao certo. As agências de turismo recusam-se a admitir que eles existem, dado que têm os seus próprios autocarros turísticos para levar grupos de estrangeiros a caminho de Fátima, onde em 1917 três crianças tiveram uma visão da Virgem Maria e que agora surge pujante como a Lourdes portuguesa. Em Portugal, nenhuma informação verbal é fiável e até agora não consegui encontrar um horário impresso). Ao chegar, pensei que Santarém não seria uma boa opção, e decidi seguir até Lisboa, mantendo-me sentado no meu lugar. Então, após cinco horas dentro de um autocarro (durante as quais fizemos 50 milhas, para teres uma ideia da velocidade média), vi de repente que estávamos em Vila Franca de Xira, uma terra que captara a minha atenção da última vez que por lá passara. Situa-se nas planícies húmidas das margens do Tejo, povoadas por touros, que ali deambulam em grande manadas, esperando irem para o seu destino final, a praça de touros ou o matadouro. Num ápice, fiz sinal de paragem e saí do autocarro, encontrando um táxi. Disse ao motorista para me levar a uma estalagem de que tinha ouvido falar, mesmo no meio das pastagens dos touros. Felizmente, havia um quarto vago. É um lugar encantador, com o charme que tanto me faltou naquela horrível casa na beira da estrada. Quando cheguei já era tarde para almoçar: às quatro tarde, perdera a refeição do meio do dia. Mas que problema tem isso? De imediato, meti-me pelas lezírias do Tejo. Durante três horas, caminhei por uma vereda estreita, com touros à minha direita e à minha esquerda (e, devo confessá-lo, arame farpado a separar-nos). Ali estavam, cheios de energia, os jovens touros; ou os mais velhos, senatoriais, com os seus rostos inexpressivos mas gentis, adormecendo deitados na erva alta. Nada mais vi, excepto um ou outro carro de bois e uma manada (se é este o termo certo) de cavalos e de mulas, todos com badalos ao pescoço, sendo levados por dois cavaleiros e um cão. O ar do entardecer estava límpido, os campos amareleciam enquanto o sol se punha. Que maravilhosa mudança face à noite anterior! Este longo passeio, a serenidade do universo, foi remédio santo para o meu espírito atormentado e perplexo. E, quando regressei à estalagem, uma refeição deliciosa estava à minha espera para o jantar! Não direi que ia bem com o vinho do Porto que me serviram, mas qual o problema? Gostei de ambos em diferentes zonas do meu palato. Esta noite irei dormir bem, pensei; e de manhã partirei para Lisboa e recomeçarei a minha árdua rotina.
Deverei fazê-lo? Estou cansado da
pequena-grande Lisboa. Na pequenez das sua mentes, todos falam comigo como se
eu nada soubesse para além do que me irão contar. Na verdade, sou sempre capaz
de prever exactamente o que me vão dizer, pelo que escutá-los é uma perda de
tempo. Acho que já tenho material suficiente para escrever o meu artigo. Talvez
o escreva já amanhã Na terça volto a almoçar com o Dr. d’Almada: ele
ajudar-me-á muito melhor do que esses professores de Direito de Coimbra de meia tijela, que se substituem uns aos outros, em vazia e monótona sucessão, como
ministros do Dr. Salazar!
H
PPS 7 de Abril 1963
Cheguei
agora a Lisboa. Estou molhado até aos ossos. É um grande erro ir a qualquer lado
antes que a Primavera verdadeiramente chegue. Dou graças a Deus por um banho e um tecto!
Tradução de António Araújo
muito, muito interessante António.
ResponderEliminarAlexandre
Obrigado, mas eu só traduzi - e mal...
EliminarUm abraço,
António
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