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O progenitor de um adolescente encontra-se mais cedo ou mais tarde neste lance lancinante: sabe que tem de estabelecer regras e estipular limites , mas não sabe muito bem quais , nem como , nem até quando . Sabe que tem de apoiar sem abandonar . Sabe que as regras que estabelecer terão de encorajar a autonomia e a responsabilização . Sabe que lhe exigem que controle o incontrolável . A perplexidade é ainda agravada por um estranho fenómeno geral: quem não tem adolescentes tem sempre , em compensação , imensos conselhos a dar . A educação , principalmente a dos filhos de outrem , é tarefa que se faz com uma perna às costas . São princípios universais , revirares de olhos e encolheres de ombros . Mas para quem se encontra no tal lance , a coisa fia mais fino . Partindo do princípio de que "educar " adolescentes se baseia em princípios contraditórios , isto é, o princípio do "controlo através do estabelecimento de regras " e o princípio da "autonomia ", o melhor é aplicar sempre a regra do controle até não se poder mais e só então aplicar a regra da autonomia ; ou seja, aplica-se a regra da autonomia quando não se consegue aplicar a outra , em virtude da resistência , corpulência ou embirrância do adolescente . Em segundo lugar , e na impossibilidade de aplicar o controlo, o melhor é estabelecer limites que não possam humanamente ser ultrapassados: em vez de exigir ao adolescente que esteja em casa à meia-noite , põe-se-lhe os euros na mão e diz-se-lhe com autoridade :"Agora não te atrevas a aparecer-me em casa antes das oito da manhã , estás a ouvir ? E vens bêbedo ou não entras!". Para se ter a certeza de que a regra resulta mesmo , pode-se ir ainda um pouco mais longe e estabelecer que "nunca podes estar mais de uma semana sem dormir ". À quinta rave, quando o adolescente desorbitado se prepara para sair de casa de mochila às costas , o pai tirano (ou a mãe megera ) barrando-lhe a porta , grita : "Daqui não passas ! Estás há cento e sessenta e oito horas sem dormir ! Enquanto viveres em minha casa , fazes como eu quero: dormes pelo menos uma vez por semana ". O adolescente não obedece, adormece. Sente-se, obviamente, e agudamente , a falta de uma instância de autoridade exterior absoluta ; quando eles são pequeninos , a Polícia ainda funciona, por exemplo na questão da segurança rodoviária ("não te podes pendurar da janela do carro porque a Polícia não deixa !"), mas a Polícia , para os adolescentes , é até uma perspectiva excitante . Para não se ficar mal visto aos olhos do adolescente e continuar a ser um progenitor fixe e curtido, dá jeito invocar alguém ou alguma coisa . Claro que há sempre Nossa Senhora , mas não sei se pega . "Vou ao concerto e volto depois de amanhã !", diz a menina de 14 anos . "Não podes!", "Não posso, porquê ?". "Porque Nossa Senhora não deixa ". Vamos experimentar o mesmo , mas agora com a Polícia Marítima . "Vou ao concerto e volto depois de amanhã !". "Não podes!". "Não posso, porquê ?". "Porque a... Polícia Marítima não deixa ...?".
Parto sempre do princípio de que estes adolescentes são rapazes, porque o mesmo cacho de problemas com raparigas é algo de tão sofisticado que a minha mente simplesmente não abarca. Encontrei na estante , cheio de pó , coitado , um livro de um casal de psicólogos que criou cinco filhos (os psicólogos são pedra angular de toda esta equação ). Lá dentro traz uns exercícios práticos para lidar com o "problema ". O primeiro exercício (que , aliás, não precisa de seguimento ) consiste em aprender a relaxar os músculos . Quando o menino for malcriado , chegar tarde , desligar o telemóvel, e fizer tantas, tantas outras curiosas e engraçadas descobertas de coisas que nos põem fora de nós, ansiosos ou culpabilizados, dizem estes psicólogos que o progenitor deve sentar-se no sofá e começar a relaxar os músculos dos dedos dos pés , das pernas e por aí acima até chegar ao cerne do sistema nervoso central . Alcançado este objectivo superior , o progenitor deve imaginar , com o olho da sua mente , antes do mais , os vizinhos que têm os mesmos problemas , depois os outros bairros em que pais exasperados relaxam em sofás idênticos , e cada vez mais latamente , imaginar a cidade em que vive, a região , o país , e ir assim afastando-se, subindo às alturas serenas, em que planetas rolam desde sempre , e indiferentes , no silêncio das galáxias . E assim adormecem. Se não , parece que o Valium também é uma opção .
Luísa Costa Gomes
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