segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Sardinha Biba.



 






Em A Dimensão Oculta, Edward T. Hall abordou o conceito de proxémica, o modo diverso como nós, humanos, nos relacionamos com o espaço. Nunca gostamos que, estando uma sala de cinema vazia, alguém se venha sentar mesmo ao nosso lado. Ou num banco de jardim, havendo outros bancos disponíveis e solventes. Para um nómada do Sara ou para um japonês de Osaka o espaço é muito diferente. Na realidade e no conceito que dele fazemos. Para um informático de Osaka, um canteiro numa varanda é um jardim imenso. Para os aborígenes da Austrália, a terra é tão vasta que só através de songlines se orientam, tanto nos corpos como nos espíritos.  


 
 
Não são de hoje as imagens das viagens urbano-subterrâneas em jeito de sardinha em lata. Os que as viram, recordam certamente as fotografias do Metropolitano de Tóquio, com uns funcionários de farda e luva branca a compactar os obedientes nipónicos nas carruagens à cunha. Mais recentemente, em Tóquio como noutros lugares (no Brasil, por ex.), notícias da abertura de carruagens exclusivamente femininas. Para evitar os assédios e os apalpões e, no caso do Japão, para impedir que os tarados por fardas de colegiais tirassem fotografias com telemóveis ao underwear das lolitas trajadas de minissaias – e depois as colocassem na Net, para consumo solitário de otakus, uma tribo estranha. 
         Falando doutra tribo estranha: os extreme commuters. Em Microtendências, Mark Penn fala deles a propósito dos Estados Unidos. Mas a moda começou no Japão: pessoas, geralmente homens, que fazem centenas de quilómetros para cá e para lá, na ida e regresso do trabalho. No Japão, em comboio-bala; na América, pela auto-estrada fora. Horas e horas por dia, dias por ano, anos ao fim de uma vida de homo laborans (60 anos são 20 mil dias, dizem os cultores do carpe diem). Naturalmente, são devastadoras as consequências desta tendência para os familiares agregados a tal sina. Daí o dito japonês contemporâneo segundo o qual uma criança só vê as costas do pai. Quando o progenitor regressa, arrasado e de gravata à banda, já os filhos dormem há várias horas. 

 
 
 





 
         Estas imagens do Metropolitano de Tóquio só têm paralelo nas dos mártires da pintura medieval. Ou, talvez melhor, nas geniais esculturas de Franz Xaver Messerchmidt. Pensar que foram feitas no século XVIII deixa-nos boquiabertos, ávidos de querer saber mais, pelo que ao tema espero regressar em breve.
 
 
 
Franz Joseph Messerschmidt (1736-1783)

 
.....Em Tóquio, vemos gente esmagada contra o vidro sfumato de tanto ar condensado. Suor sem lágrimas. As plangentes imagens de rostos distorcidos, em esforço de sobrevida, são, porventura, a síntese perfeita da nossa modernidade líquida. Ninguém sorri, ninguém está feliz. Há quem diga que as fotografias são «impróprias para claustrofóbicos». Não. São indignas de um país que se diz «civilizado». 
 
 
 
         Mas, ao que parece, a moda já chegou aos ares. Trata-se de um caso isolado, motivado por uma necessidade impreterível. Mas imaginem o que será viajar num avião com o corredor atravancado por 29 praticantes de sumo. Foi o que aconteceu recentemente, segundo notícia do imprescindível The Aviation Herald. Como sempre, foi o João Gama que trouxe isto a conhecimento da minha santíssima ignorância, e por isso lhe agradeço, com um abraço do
 
António Araújo
 
 

2 comentários:

  1. Vivi e trabalhei no Japão grande parte de um ano e há tanto tempo que a minha filha mais nova tinha 3 anos e a minha neta filha dela hoje já namora ...e já era assim !

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  2. Creio que isto é uma daquelas ideias feitas que não traduzem a realidade.Outra?Tokio é uma cidade caríssima!Não é.Tem uma oferta para todas as bolsas ao contrario dos paises nordicos por exemplo.São civilizados sim ou civilizados somos nós?

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