terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

Ainda sobre o espólio pessoano de Hubert Jennings.




Júlio Pomar
 
 
Há dias, o correspondente da Agência Lusa nos EUA contactou-me a pedir uma curta entrevista sobre o espólio de Hubert Jennings.
Vieram as perguntas. Aqui vão elas com as minhas respostas:
 
- Que oportunidades de investigação podem abrir estes novos documentos?
​Muitas para os interessados na biografia de Pessoa, sobretudo na África do Sul, e nas traduções para inglês​.
 
- Que dimensão, e relevância, já tinha a pesquisa feita sobre o poeta em Brown?
​ Na Brown organizámos em 1977 o primeiro congresso internacional sobre Fernando Pessoa, de que resultou o primeiro livro sobre Pessoa em inglês: Fernando Pessoa: The Man Who Never Was (1980), editado pela Gávea-Brown. Foram professores na Brown os primeiros dois tradutores americanos de Pessoa: Edwin Honig e George Monteiro. O livro deste último (Self-Analysis and Thirty Other Poems, 1988) foi também publicado na Gávea-Brown, que por sinal editou anos mais tarde uma colectânea de estudos de Eduardo Lourenço sobre Pessoa traduzidos para inglês (Here on Douradores Street: Essays on Fernando Pessoa, 2010). Na ​Brown leccionou durante muitos anos esse grande especialista em Fernando Pessoa, o Prof. George Monteiro​, hoje aposentado, mas ainda associado ao Departamento de Estudos Portugueses e Brasileiros como Emeritus. Entre muitos escritos seus sobre o poeta contam-se os livros The Presence of Pessoa. English, American and South African Responses (1998)​, Fernando Pessoa and Nineteenth Century Anglo-American Literature (2000) e As Paixões de Pessoa (2013). Eu próprio tenho publicado vários estudos sobre Pesso​a ​e dois livros: Mensagem - Uma Tentativa de Reinterpretação (1987) e Pessoa, Portugal e o Futuro (Gradiva, Lisboa, 2014).​
​Faz parte da nossa oferta de seminários um sobre Fernando Pessoa, por mim leccionado, para o qual costumo convidar especialistas pessoanos de todo o mundo. No Departamento publicamos também a única revista​ dedicada exclusivamente ao estudo de Fernando Pessoa: Pessoa Plural, co-dirigida e liderada pelo grande especialista pessoano Jerónimo Pizarro (que fez cursos na Brown), Paulo de Medeiros, Patricio Ferrari e por mim.​
​ Neste momento também temos na Brown Patricio Ferrari, um dos membros da nova geração internacional de pessoanos, que organizou aqui, em 2015, o primeiro colóquio sobre Pessoa como poeta inglês. Um volume com os trabalhos apresentados deve sair em breve na editora Gávea-Brown, coordenado por Patricio Ferrari.​ Ele foi também o coordenador de um número especial da revista da University of Massachusetts Dartmouth, Portuguese Literary & Cultural Studies, dedicado inteiramente a Fernando Pessoa.​
 
O que saiu na comunicação social portuguesa?
Começou assim com o Correio da Manhã em parangonas:
 
Universidade de Brown afirma-se centro de estudos pessoanos e recebe espólio inédito
Por Lusa
Cerca de dois mil documentos sobre Fernando Pessoa, encontrados num baú na África do Sul, no verão passado, que incluem poemas, cartas e até um livro, estão a ser estudados na Universidade de Brown, nos Estados Unidos. A doação a esta instituição dos documentos, que pertenceram ao investigador britânico Hubert Jennings, especialista no escritor português, pode causar surpresa, mas já nos anos 1970 a universidade de Nova Inglaterra se começava a transformar num dos centros de estudos pessoanos mais importantes do mundo. "Organizámos em 1977 o primeiro congresso internacional sobre Fernando Pessoa, de que resultou o primeiro livro sobre Pessoa em inglês", explicou à Lusa o professor catedrático da Universidade de Brown Onésimo Teotónio de Almeida.
 
Assim, sem mais. Como se eu tivesse afirmado que éramos um Centro de Estudos Pessoanos. Pior: a justificação para a escolha da Brown para receber o espólio de Jennings ficou reduzida ao facto de termos realizado aqui um congresso pessoano há quase 40 anos!
Outros media fizeram algo parecido.
E assim se cozinham as notícias.
 
Onésimo Teotónio de Almeida
 
 
 
 

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