Almeida Santos e a Urbanidade
Por
ocasião da visita do segundo presidente provisório da República Portuguesa, General Francisco da Costa Gomes,
às Nações Unidas e aos Estados Unidos, em Outubro de 1974, quase logo a seguir à
abdicação do General António de Spínola, uma grande maioria da sua vastíssima
comitiva foi passar um fim de semana a casa do Cônsul Honorário de Portugal,
Dr. Adriano Seabra Veiga, na cidade de Waterbury, estado de Connecticut.
Como de
costume, a seguir ao opíparo banquete, quase todos os convidados – várias
dezenas – foram para o salão da cave, transformado em bar de alto gabarito e
sortido de uma enorme variedade de vinhos e de licores de alta qualidade e de
charutos de Havana, beber, fumar e
confraternizar. Como também de costume, além dos altos dignitários da
comitiva presidencial, entre os quais figuravam ministros, secretários de
estado, diplomatas e altas patentes militares,
encontravam-se os representantes da comunidade luso-americana do Estado
de Connecticut, não faltando, entre eles, naturalmente, os membros do clero,
nomeadamente os reverendíssimos priores das paróquias portuguesas do estado,
especificamente de Bridgeport, Danbury, Hartford e Waterbury. Entre esses ditos
priores, havia, para não variar, um bon
vivant. Era o padre Caldas, minhoto de origem e pároco, de há largos anos,
da Igreja Nossa Senhora de Fátima de Bridgeport. Mundano, de magras leituras,
amigo de farta mesa e de boa cepa, caracterizava-se pela considerável colecção
de anedotas picantes e picarescas com que gostava de abrilhantar e apimentar as
suas conversas de salão. E foi por conhecer, de longa data, e por experiência
própria, esses dotes do Rev.do Padre Caldas, que não constituiu para mim
qualquer surpresa quando o Dr. Almeida Santos veio ter comigo e me perguntou se
eu conhecia o padre que nesse momento estava a contar em voz alta, para quem
queria ouvir, anedotas impróprias de um ambiente daquela natureza. Se não se
dava conta o dito padre de que havia senhoras dignas do maior respeito, entre
as quais se incluía a esposa dele, Almeida Santos, que certamente detestavam
ver-se obrigadas a ouvir anedotas porcas, e ainda por cima saídas da boca de um
padre. Será que eu poderia fazer alguma coisa para resolver esse problema? –
perguntou-me o Dr. Almeida Santos. E não foi preciso pensar muito para eu
descobrir uma solução para o problema. Aproximei-me do Rev. Padre José Silva,
pároco da Igreja de Nossa Senhora de Fátima de Hartford, presbítero
exemplarmente morigerado nos costumes e na língua, e contei-lhe o que estava
acontecendo. E o bom do Padre Silva dirigiu-se ao desbocado do Padre Caldas e
levou-o para um canto, pretextando a necessidade urgente de lhe dizer uma
palavrinha em particular.
E foi
assim que o Cirurgião ficou habilitado para ser um dia testemunha de que, no
capítulo das boas maneiras e da conversa de salão, o Dr. Almeida Santos deu uma
lição exemplar, se bem que indirecta, ao Rev.do Padre Caldas, que anos mais
tarde viria a ser condecorado, pelo Presidente da República Portuguesa, com o
grau de Comendador da Ordem do Infante D. Henrique, e a ser elevado à dignidade
de Monsenhor pelas respectivas autoridades eclesiásticas do Vaticano e da sua Diocese.
António Cirurgião
:-)
ResponderEliminarPara desgosto dos demais convivas, estou em crer...
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