segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

Almeida Santos (1926-2016).

 
 
Almeida Santos e a Urbanidade
 
          Por ocasião da visita do segundo presidente provisório da República  Portuguesa, General Francisco da Costa Gomes, às Nações Unidas e aos Estados Unidos, em Outubro de 1974, quase logo a seguir à abdicação do General António de Spínola, uma grande maioria da sua vastíssima comitiva foi passar um fim de semana a casa do Cônsul Honorário de Portugal, Dr. Adriano Seabra Veiga, na cidade de Waterbury, estado de Connecticut.
          Como de costume, a seguir ao opíparo banquete, quase todos os convidados – várias dezenas – foram para o salão da cave, transformado em bar de alto gabarito e sortido de uma enorme variedade de vinhos e de licores de alta qualidade e de charutos de Havana, beber, fumar e  confraternizar. Como também de costume, além dos altos dignitários da comitiva presidencial, entre os quais figuravam ministros, secretários de estado, diplomatas e altas patentes militares,  encontravam-se os representantes da comunidade luso-americana do Estado de Connecticut, não faltando, entre eles, naturalmente, os membros do clero, nomeadamente os reverendíssimos priores das paróquias portuguesas do estado, especificamente de Bridgeport, Danbury, Hartford e Waterbury. Entre esses ditos priores, havia, para não variar, um bon vivant. Era o padre Caldas, minhoto de origem e pároco, de há largos anos, da Igreja Nossa Senhora de Fátima de Bridgeport. Mundano, de magras leituras, amigo de farta mesa e de boa cepa, caracterizava-se pela considerável colecção de anedotas picantes e picarescas com que gostava de abrilhantar e apimentar as suas conversas de salão. E foi por conhecer, de longa data, e por experiência própria, esses dotes do Rev.do Padre Caldas, que não constituiu para mim qualquer surpresa quando o Dr. Almeida Santos veio ter comigo e me perguntou se eu conhecia o padre que nesse momento estava a contar em voz alta, para quem queria ouvir, anedotas impróprias de um ambiente daquela natureza. Se não se dava conta o dito padre de que havia senhoras dignas do maior respeito, entre as quais se incluía a esposa dele, Almeida Santos, que certamente detestavam ver-se obrigadas a ouvir anedotas porcas, e ainda por cima saídas da boca de um padre. Será que eu poderia fazer alguma coisa para resolver esse problema? – perguntou-me o Dr. Almeida Santos. E não foi preciso pensar muito para eu descobrir uma solução para o problema. Aproximei-me do Rev. Padre José Silva, pároco da Igreja de Nossa Senhora de Fátima de Hartford, presbítero exemplarmente morigerado nos costumes e na língua, e contei-lhe o que estava acontecendo. E o bom do Padre Silva dirigiu-se ao desbocado do Padre Caldas e levou-o para um canto, pretextando a necessidade urgente de lhe dizer uma palavrinha em particular.
          E foi assim que o Cirurgião ficou habilitado para ser um dia testemunha de que, no capítulo das boas maneiras e da conversa de salão, o Dr. Almeida Santos deu uma lição exemplar, se bem que indirecta, ao Rev.do Padre Caldas, que anos mais tarde viria a ser condecorado, pelo Presidente da República Portuguesa, com o grau de Comendador da Ordem do Infante D. Henrique, e a ser elevado à dignidade de Monsenhor pelas respectivas autoridades eclesiásticas do Vaticano e da sua Diocese.
    
                        António Cirurgião
 
 
 
 

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