sexta-feira, 25 de março de 2016

Espinosa, o judeu não-judeu português da Holanda (2).




 
Estátua de Espinosa, Haia




4. “Benedictus Maledictus”: Espinosa banido da sinagoga pelo “ herem” de 1656

 

“Alguém constrói Deus na penumbra.

 Um homem engendra Deus. É um judeu

 De olhos tristes e de pele citrina.

 Não importa. O feiticeiro insiste e lavra

 Deus com geometria delicada;

 A partir da sua enfermidade, a partir do seu nada,

 Continua a erigir Deus com a palavra.

 O mais pródigo amor lhe foi outorgado,

 O amor que não espera ser amado.”

                                     Jorge Luis Borges, Baruch Espinosa (1876)

 

 

 

A sua obra filosófica, ainda em preparação cogitativa interior quando é banido da sua Nação, punha em causa os princípios mosaicos, pelo que foi objecto de uma expulsão da sinagoga portuguesa de Amesterdão, Talmud Torah (27-VII-1656), quando tinha apenas 24 anos, mediante um herem que o mahamad, o conselho sinagogal de quinze membros − cujo rabino era então Saul Levi Morteira (1596-1660), o fundador da yeshiva Keter Torah (Coroa da Lei) na qual Bento fora aluno – redigira contra Baruch Espinosa, excomunhão particularmente veemente e imprecatória na linguagem, sendo os seus ensinamentos eram declarados terrivelmente errados, como “horrendas heresias que praticava” e “más opiniões e obras”, amaldiçoando-o com os anátemas com que Josué fulminara Jericó (tirada do Deuteronómio):

“Nota do Herem que se publicou em Theba em 6 de Ab, contra Baruch Espinoza

Os Srs. do Hahmad fazem saber a V(ossas) M(ercês) como há dias que tendo notícia das más opiniões de Baruch de Espinoza procurando por diferentes caminhos e promessas retirá-lo de seus maus caminhos, e não podendo remediá-lo, antes pelo contrário, tendo cada dia maiores notícias das horrendas heresias que praticava e ensinava e enormes obras que obrava, tendo disto m(ui)tas testemunhas fidedignas que depuseram  e testemunharam tudo em presença doa Srs.Hahamin, deliberaram com seu parecer que dito Espinosa seja informado e apartado da nação de Israel, como actualmente o põe em herem, com o herem seguinte: Com sentença dos Anjos, com dito dos santos, endereçamo-nos, apartamos e amaldiçoamos e praguejamos a Baruch Espinoza, com consentimento do D(eus) B(endito) e consentimento de todo este K(ahal) K(ados), diante dos santos Sepharim (rolos sagrados) estes com os seis centos e treze preceitos que estão escritos neles, com o herem que endereçou, com o herem que informou Josué a Jericó, com  maldição com que Elias maldisse os moços, e com todas as maldições que estão escritas na Lei, Maldito seja de dia e maldito seja de noite, maldito seja em seu deitar e maldito ele em seu sair e maldito seja em seu entrar; não quererá A(donai) perdoar a ele ,que então fumeará o furor de A(donai) e o seu zelo neste homem, e vazará nele todas as maldições no livro desta Lei,  e arrematará A(donai) o seu nome debaixo dos céus e apartá-lo A(donai) para mal de todas as tribos de Israel, com todas as maldições do firmamento as escritas no livro da Lei está.(…). Advertindo que ninguém lhe pode falar bocalmente nem por escrito nem dar-lhe nenhum favor, nem debaixo do tecto estar com ele, nem junto de quatro côvados, nem ler papel algum feito ou escrito por ele.”[1]

Se a pessoa excluída pelo herem falecesse, não era permitido acompanhar o seu corpo até ao cemitério. Também não se devia fazer negócios com ele nem podia o excomungado ensinar ou ser ensinado por alguém, assim como não podia integrar o ”quorum”(ou miniam, dez pessoas) duma cerimónia religiosa, Um excomungado perdia o seu lugar neste mundo e no outro. A maldição de Espinosa nunca foi levantada, o que era raro. Pouco depois da criação do Estado de Israel, em 1948, Ben Gurion (1886-1973), primeiro-ministro na altura, decidiu solicitar aos grandes rabinos de levantar a excomunhão de três séculos antes, o que seria uma espécie de alia póstuma do judeu português.[2] Os sacerdote rabínicos aceitaram estudar o processo, mas acabaram por confirmar a sentença da condenação de 1656. A violência dos termos usados neste herem contra o tão jovem e pacífico amigo do Saber eram também inusitados na sinagoga portuguesa de Amesterdão. O mais curioso é que Espinosa, que tinha então 24 anos, não publicara ainda nenhuma obra sua, não obstante o anátema sinagogal referir as “obras de Baruch de Espinosa”.

O texto redigido contra Espinosa retomava, aliás, alguns termos do herem que fulminara o desditado Uriel da Costa, em 1618.[3] Mas se este acabaria por se suicidar após se ter penitenciado duas vezes dos seus erros denunciados pela sinagoga de Amesterdão, Espinosa parece ter vivido indiferente às cóleras rabínicas, afastando-se da vida da comunidade sefardita: em vez de procurar um compromisso com a comunidade que assim o excluía em termos tão desabridos e até inéditos, o filósofo rompia com a religião dos seus antepassados, pois “queria fazer acto de universalidade”(H. Méchoulan, op. cit.). Solitário universal, viajante imóvel, político sem causa, herético beato, Espinosa abandona então Amesterdão depois do herem, perdendo-se o seu rasto até 1660.




Estátua de Espinosa, Amsterdão

 
A importância deste herem mede-se, sobretudo, pelo facto de ele forçar o jovem Espinosa a tornar-se num judeu não judeu (“non jewish jew” como lhe chamou Isaac Deustcher) se não se arrependesse, ou seja, um intelectual expulso da sua Nação, um filósofo que deixava a religião tradicional dos seus antepassados para ascender à universalidade, para não mais se apresentar como um filósofo do judaísmo – um mero rabino ou um erudito – mas um amigo do Saber, o primeiro filósofo moderno vindo do povo da Aliança, mas não aceitando um Deus pessoal, apostasia ou “traição” que o levara à sua excomunhão em 1656. A sua obra, aliás só posteriormente publicada, daria amplas comprovações de que Espinosa era um dissente irrecuperável para a ortodoxia judaica: basta ler, por exemplo, o final do capítulo IV do seu Tratado teológico-político, para nos darmos conta de que como o filósofo falava dum “Deus de todas as nações”, contestando que os judeus fossem uma nação escolhida, a não ser no período temporal e estatal durante o qual o povo Israel assumiu na sua história, antes de ser forçado ao seu multissecular Exílio.[4]

Compreende-se que Julius Guttman, historiador da filosofia judaica, abrisse o capítulo sobre o espinosismo sublinhando que “o sistema de Espinosa pertence mais precisamente ao desenvolvimento do pensamento europeu do que à história da filosofia judia”, abandonando assim o intuito essencial desta última, que seria o de validar a religião judaica em termos filosóficos, para alicerçar antes um Cogito que está em profunda oposição à religião dos seus pais, não só em forma dogmática mas até nas suas mais fundas convicções.”[5] Muito da filosofia judia passara para os seus livros, assim como a sua síntese panteísta integrava os contributos do aristotelismo e do neoplatonismo, sem esquecer tudo quanto foi buscar a Grotius, Hobbes e, sobretudo, Descartes, além do que aprendeu, em Amesterdão, até aos 24 anos, embora sem ter publicado até então um único livro, graças a uma tertúlia íntima de intelectuais heréticos onde se encontravam alguns judeus irregulares, na maioria hispânicos – e que tiveram problemas com a sinagoga que o expulsara ou o faria também −, como Uriel da Costa, Juan de Prado, Isaac de la Perèyre, Franciscus Van den Enden e Daniel Ribera.[6] Espinosa cita uma frase de Descartes afirmando que Deus realizara três grandes maravilhas: fizera o mundo a partir do nada (criação), dera ao homem o livre-arbítrio e, por fim, ele mesmo se encarnara homem em Jesus Cristo. [7]O herético judeu não podia aceitar estas três maravilhas, já que, para ele, panteísta e monista como era, a hipótese de Deus assumir a figura humana seria tão aberrante como dizer que um círculo revestira a natureza dum quadrado. Toda a transcendência enigmática de Deus era por ele também negada, já que Deus se confundia com a natureza eterna: Deus sive natura sive substantia. Quanto ao homem ser livre não seria agir por iniciativa dum qualquer libre-arbítrio, uma vez que a liberdade se funde com a necessidade, pelo que a ideia verdadeira se afirma a partir de si mesma, pois o consentimento que lhe damos reflecte apenas uma evidência intrínseca. Racionalista, Espinosa repudiava ainda todo o sobrenatural, como a alegada encarnação humana de Deus. No tocante ao judaísmo, o marrano português negava a autenticidade mosaica do Pentateuco e via em Moisés o criador dum “estado teocrático” (ver Tratado teológico-político), e repudiava os milagres.[8] Os mandamentos de Deus não tinham qualquer sentido, uma vez que as exigências imanentes da Razão se podem exprimir de modo racional e claro, sem precisarem dum invólucro imagético como a entrega das tábuas da Lei a Moisés. Deste modo, Espinosa abandonava qualquer conexão essencial que fosse com a religião do povo da Aliança para se juntar ao labor essencial do Cogito europeu, virado como estava para a busca duma verdade autónoma, válida para todos os homens. O recalcitrante pensador apóstata iria, deste modo traumático, incorporar-se no destemido movimento das Luzes que, na Europa dos sécs. XVII e XVIII, preparavam a modernidade dum novo Cogito, o triunfo dum pensamento novo, o das Luzes.[9]

 Espinosa considerava que o conhecimento racional não estava submetido às ideias de salvação, devendo esse conhecimento proceder por dedução que se baseia numa intuição racional, sendo o verdadeiro, ele mesmo, o seu próprio critério de certeza, já que o saber é saber que se sabe. Por isso está no imenso horizonte do ser, de modo que o conhecimento autêntico duma essência é uma participação em Deus; o pensamento do homem é verdadeiro quando se identifica com o pensamento de Deus. Compreende-se, deste modo, que a sua Ethica seja uma prova ontológica - o que se compreende melhor quando se lê o seu subtítulo: ordine more geometrico demonstrata, ou seja, feita por deduções sucessivas, por teoremas lógicos −, a partir da ideia de Deus para compreender tudo o mais. Por fim, Deus não é transcendente – exterior e superior ao mundo -, já que ele é o próprio mundo. O que levou Novalis a afirmar que “Espinosa é um pensador ébrio de Deus.”[10]
 

 

5. O espinosismo, filosofia dum meta-rabino

 

              Eram estas as consequências fundamentais do herem de 1656: ao empurrar Bento para fora da comunidade da sua Nação, levava-o à via do Cogito da modernidade europeia das Luzes, na linha duma Razão conquistadora de Novos Mundos, acusando-o, numa linguagem paroxística de intolerância religiosa que não deixava de lembrar o mundo persecutório do Santo Ofício na Ibéria − exceptuadas as fogueiras em que ardiam os excomungados −, de expor “horrendas heresias” e “más opiniões” incompatíveis com o povo da Aliança. Na verdade, o jovem Bento limitara-se, até ao momento de ser excomungado, a deixar de lado a teocracia bíblica em proveito da metafísica racional, da philosophia, isto é, a Amizade pelo Saber como ela já fora mester entre os Gregos. Nessa medida, o espinosismo é uma poderosa demolição de todo o edifício bíblico-talmudista cogitativo da tradicional intelligentsia judia (e como o voltaria a ser, excepcionalmente, de novo nos casos raros de Franz Rosenzweig ou Martin Buber).[11] Doravante, para ele, a Lei judia não passava da lei particular dum povo singular, cuja Aufhebung se pretendia lograr pelo afã do cogito pós-cartesiano, ampliado em direcção a toda uma nova visão metafísica que dispensava os vínculos e deveres tribais recebidos por Moisés das mãos de Yaveh. Esta Lei do povo errante em busca de Canaã deixava de ter qualquer alcance universal, uma vez que a fusão da mente com o Universal prescindia definitivamente das tradições tribais. É esta a imensa obra transjudaica do judeu não-judeu chamado Bento Espinosa, que escreveu em Latim, quando podia tê-lo feito em hebreu, português, espanhol ou até holandês.

             Expulso da comunidade judia, Espinosa, então com 26 anos, começa por viver em Rijnsburg, perto de Leyde, na casa do seu amigo e mestre de latim, o ex-jesuíta holandês Van den Enden, iniciando uma vida discreta, apagada, abandonando a curta participação na casa comercial deixada pelo seu pai para praticar um mester quase marginal, o de polidor de lentes de aumento, levando uma existência cautelosa de “Luftmensch”, que se iniciaria essencialmente, algum tempo volvido, com a publicação de alguns livros, só um deles editado com o seu nome, além de uma ou outra obra deixada propositadamente póstuma, como a Ethica, ou inacabada, como o Tratado da Reforma do Entendimento (De Intellectus Emendatione, c. 1661) ou o Tratado político.[12] Apesar de frequentar um pequeno círculo de cristãos liberais e “livres pensadores” que se reuniam na casa do citado ex-loiolano Franciscus Van den Enden, o judeu escorraçado da sinagoga em 1656 nunca manifestou qualquer intuito de ingressar na religião cristã, trocando assim uma igreja por outra, sendo ele um solitário que levava uma vida consagrada exclusivamente ao pensamento, ao espírito matemático que escrevia more geometrico, ao amor pela Sophia. Após quatro anos em Rijnsburg, Bento transfere-se para Voorturg e, por fim, para Haia. Esses anos quase já não são biografáveis em termos de vivência pessoal, sempre “calma e benevolente”, voluntariamente apagada, já que a sua substância individual e histórica se confundiam doravante, até ao seu termo vital − visitado dois meses antes do fim por Leibniz −, como produção da sua filosofia, o espinosismo. Em 1663, vivendo em Voorburg, perto de Haia, publicaria anonimamente o seu Tractatus politicus e o Tractatus theologico-politicus (1670), sete anos antes da sua morte, obra que seria oficialmente proibida em 1674 e que só em 1787 traduzida para alemão.[13]

Espinosa levou uma vida obscura e retirada – o seu lema era o imperativo latino caute (cuidado”) −, em Rijnsburg, perto de Leiden, vivendo do seu modesto mester de polir lentes, rodeado de uns quantos amigos e discípulos, escrevendo o Tratado de Deus, do Homem e da Bem-Aventurança (c. 1662), recusando um professorado que lhe foi oferecido em Heidelberg. Por precaução, o Tratado teológico-político seria publicado com o seu nome, mas anonimamente, com a falsa indicação de ter sido impresso em Hamburgo, “apud Henricum Kühnrat”, já que Espinosa estava certo que, mesmo na tolerante Holanda calvinista, tal livro sereia condenado pelas autoridades cristãs. Leibniz (1646-1716), ao qual mandara o seu tratado sobre óptica, veio visitá-lo em Haia em 1676, diálogo que se revelaria difícil entre um filósofo cristão que acreditava num Deus-pessoa e um judeu não-judeu que discorria sobre um Deus-Natureza, panteísta. A Ética deste último só seria editada postumamente, em 1677. E nesse mesmo ano, em 21 de Fevereiro, falecia Bento Espinosa, às 3 da tarde, na Haia; uma morte de estóico,[14] que seria contrastada por um enterro nada espinosista, a 25 desse mês, com seis caleches e muita gente ilustre a seguir o caixão do ilustre filósofo de olhos negros e tristes, saúde frágil, tez pálida de ibérico, rosto fino e comprido, cor de azeitona,[15] sem barba e de baixa estatura que acabava de desaparecer, depois de uma curta vida passada a lavrar em silêncio, na sua solidão, um árduo cristal, o infinito mapa daquele que era todas as suas estrelas, como se exprimiu um admirador seu, o grande poeta argentino Jorge Luis Borges.




 
 
A sua filosofia era, de facto, transjudaica, revolucionária nas suas bases e continha uma verdadeira saída do perímetro religioso hebraico tradicional, postulando uma divindade que nada tinha a ver com o Deus pessoal dos judeus, o Iavé bíblico dos seus antepassados. O marranismo remata, na filosofia espinosista, um longo drama marrano que, aqui, na livre Holanda republicana de Johann de Witt,[16] no exílio em país tão tolerante, numa revolução metafísica. A sua famosa equivalência formulada entre Deus e a natureza – Deus sive natura, não sendo, de modo algum uma fórmula de ateísmo, era antes a afirmação duma divindade “naturante” (natura naturans) ou uma natureza “naturada” (natura naturata), diferindo Deus do mundo só na medida em que a substância difere dos seus modos e a causa dos seus efeitos. E desde o começo da Ethica que se formulava de modo rotundo esta ideia dum Deus não personalizado e de uma divindade com uma infinidade de atributos: “Entendo por Deus um ser absolutamente infinito, ou seja, uma substância constituída por infinidade de atributos em que cada um exprime uma essência eterna e infinita.”(Ethica, I, def. 6).[17] Embora no Tractatus theologico-politicus Espinosa afirmasse que se tratava do mesmo Deus dos apóstolos e dos profetas, a verdade é que o Deus da Torah e do Talmud desaparecia com este Deus sive natura, panteísta, não transcendente. E, numa carta de 1665, a  Willen van Blijenbergh, o filósofo afirmava ser impossível dar uma demonstração matemática da verdade revelada pelas Escrituras, e que essas seriam, antes de mais, uma questão de fé, não um postulado da razão.

A Bíblia continha, assim, verdades eternas de forma antropomorfizada. Não há compatibilidade completa entre o Deus, ser absoluto em si e que é concebido por si, que não pode ser efeito de um outro nem concebido por nenhum outro, que é absolutamente substância, e o Deus pessoal da tradição judeo-cristã, tanto mais que Espinosa se preocupava em dissociar a Filosofia da Teologia: embora a primeira traduzisse em fórmulas racionais as mesmas verdades: o filósofo não precisava de se fiar cegamente na Revelação. Só a razão pode levar a uma compreensão total e teórica da divindade como Todo infinito e realidade integral do ser na sua unidade, e que é absolutamente substância, essência que é existência, existência que é necessária e plenamente a realidade integral, erguendo a compreensão do homem a uma livre adesão às leis divinas, pelo que a fé esclarecida pela razão é sempre superior à mera fé cega dos crentes. A união com Deus não podia ser procurada no temor e nos gemidos, mas na sua busca como logos e essência que é existência e que é a perfeição do ser, o Todo infinito do ser na sua unidade, já que Deus é a substância mesma das coisas e não transcendência ao mundo. Numa palavra, Deus é a realidade tal como ela é. pelo que  a única diferença entre Deus e  o homem é portanto a do infinito em relação ao finito, de modo que o homem só pode ser compreendido em Deus e por Deus, não por si mesmo.[18]

Por fim, em relação a Cristo − o filósofo nunca escreve Jesus, mas Cristo −, este é colocado por Espinosa acima dos demais profetas, não na sua suposta qualidade de Messias, mas apenas porque ele foi o único que apresentou as regras da conduta ética como verdades eternas e não como leis e deveres a que fosse preciso obedecer sem discussão, pelo que não é preciso ser “Filho de Deus” para se aceder a essas verdades eternas que são as leis necessárias que regem a natureza. A quinta parte da Ethica desenvolve uma teologia racional, na qual todas as noções religiosas tradicionais – salvação, beatitude, eternidade, etc. – são dadas como conhecidas sem pathos e de  forma geométrica, o que não exclui o amor intelectual de Deus (amor intellectuellis Dei) pelos homens: “o amor intelectual da alma por Deus é uma parte do amor infinito que Deus tem por si mesmo”(Ethica, V, prop. 36).[19] E esta transgressão do “judeu não-judeu” ou do “meta-rabino” ou do pós-judeu marrano chamado Espinosa abrangia tanto a sua obra fundamental, redigida em latim, Ethica ordine geometrico demonstrata (1677), como o Tractatus de Intellectus Emendatione (1677).

A princípio, a sua obra metafísica, política e religiosa foi considerada como ateia e subversiva, mas depressa outros intérpretes a tomaram como um dos grandes sistemas filosóficos racionalistas do séc.XVII, tendo tido admiradores tão diversos como Moisés Mendelsohn (1729-1786), Gotthold Lessing (1729-1781), Frierich Jacobi (1743-1819), Goethe (1749-1832), Samuel Coleridge (1772-1834), Hegel (1770-1831), Moses Hess (1812-1875), Nietzsche (1844-1900), etc.[20] Quanto ao “filósofo do martelo”, este reconhecia que aos judeus, de todos os povos da terra aquele que vida mais penosa teve,  devamos o homem mais digno de amor (Cristo) e o sábio mais íntegro (Espinosa), o livro mais profundo e a mais eficiente lei moral do mundo. As Luzes do séc. XVII tiveram muito de espinosismo, através do renovo da ciência da vida, do idealismo alemão e do panteísmo. A sua Ética concebia um Deus imanente e panteísta que produzia todas as coisas segundo leis necessárias, muito diversas das do Deus das religiões monoteístas reveladas, mas também distinto do Deus de Descartes ou Leibniz. O Deus espinosista é uma substância constituída por uma infinidade de atributos infinitos de que só conhecemos dois, a extensão e o pensamento. Compreende-se, assim, que Hegel, filósofo luterano do Espírito absoluto, tivesse definido o Deus espinosista como a unidade do pensamento e do espaço, já que no sistema de Espinosa o mundo não passava duma existência fenomenal, sendo a sua concepção, ao fim e ao cabo, cósmica.




 
 
O Tratado teológico-político, obra que era, na verdade, a resposta racional, meditada e rigorosa ao anátema do herem de 1656, acabava por defender a liberdade de filosofar de todos os Amigos do Saber contra os preconceitos, mediante um método de interpretação racional das escrituras santas, estribada ainda numa apologia da liberdade do pensamento. Quanto ao Estado, propunha Espinosa que este fosse concebido como um pacto social, devendo este defender os cidadãos dos embaraços e dificuldades criadas pelas igrejas e garantir-lhes uma liberdade completa de filosofar, mesmo em relação à sua própria natureza. O espinosismo constitui uma das fontes do idealismo alemão, do socialismo, da crítica racional das religiões e até da psicanálise. “Ele nunca entrou tal e qual nessas doutrinas, mas marcou posições, inflexões e talvez, sobretudo, porque os ajudou a recusar – o finalismo, a ilusão da autonomia da vontade, a crença na eternidade das normas”,[21] sublinha Pierre-François Moreau. Outra dimensão essencial do pensamento de Espinosa está na sua relação singular com o judaísmo. Sobre este ponto escreveu Isaac Deutscher um célebre ensaio, já acima citado, onde aborda vários “judeus não-judeus” (Espinosa, Marx, Rosa Luxemburgo, Heine, Freud, Trotsky). Quanto ao primeiro, escreve:

“Espinosa, pensador independente e iniciador duma crítica moderna à Bíblia, pôs imediatamente o dedo sobre a contradição cardial do judaísmo, a que opõe o Deus monoteísta e universal às condições nas quais esse Deus se apresenta na religião judaica, seja na qualidade de Deus apegado a um povo único; a contradição entre um Deus universal e o seu «povo eleito». Sabemos quais foram as consequências para Espinosa da descoberta desta contradição: foi banido da comunidade judia e excomungado. Teve de lutar contra o clero judeu, que, tendo ele mesmo que sofrer com  a Inquisição, se deixara infectar por esse espírito. Teve de enfrentar a hostilidade do clero católico e dos sacerdotes calvinistas. Toda a sua vida foi um combate contra as restrições impostas pelas religiões e as culturas do seu tempo. Entre os judeus inteligentes que encontraram expostos às contradições de culturas e de religiões diversas, alguns foram de tal modo arrastados em direcções divergentes por influências e pressões antagónicas que não resistiram. Foi esse, por exemplo, o caso de Uriel da Costa, mais velho e precursor de Espinosa; várias vezes ele se retractou, várias vezes os rabinos o excomungaram; várias vezes ele se prosternou diante deles na sinagoga de Amesterdão. De modo diferente de Costa, Espinosa teve a grande felicidade intelectual de poder harmonizar as influências rivais e chegar nesta base a uma concepção mais elevada do mundo e a uma filosofia integrada.” [22]
 
 
João Medina
 
 



[1] Herem que foi lido em hebraico e, mais tarde, anexado nos registos da comunidade em tradução portuguesa e, como ali se lê, foi publicada “em Tehba em 6 de Agosto /Av 5416, contra Baruch Espinoza”, in Livro dos Acordos da Naçam, cit. por Gabriel Albiac, La Sinagoga vacía. Um estúdio de las fuentes marranas del Espinosismo, Madrid, Ediciones Hiperión, 1987, p.13. Este documento encontra-se nos Arquivos Municipais da cidade de Amesterdão; utilizámos também o facsímile deste herem no vol. VI da nossa História de Portugal (Ediclube), p.90. Actualizámos au ortografia portuguesa, embora mantendo um espanholismo (“entonces”) e diversas formas que parecem portuguesas (como “fumeará”, no sentido de “lançará sobre ele fogo”). Este herem foi escrito em português (primeiro em hebreu), tendo sido transcrito de modos diversos em várias obras sobre Espinosa, nomeadamente naquela que utilizámos directamente como uma das fontes deste documento, a de Gabriel Albiac, em La Sinagoga vacía, loc. cit., com algumas actualizações ortográficas. O herem é de 6 de Av de 5416 (27 de Julho de 1656). Steven Nadler, na sua biografia Espinosa. Vida e obra, Mem Martins, Publicações Europa Améerica, 2003, trad. do inglês, transcreve o herem, sem se perceber bem se o traduziu do hebreu ou do português para inglês, pelo que não lhe damos grande validade textual (pp.128-9), sobretudo depois de o cotejarmos com o facsímil do documento em questão; mas também não sabemos se este autor o verteu a partir da versão hebraica do texto, O rabino da comunidade judaica portuguesa de Amesterdão era, então, Saul Levi Morteira (c.1596-1660), que também pertencia ao mahamad. Espinosa fora um dos seus alunos na sinagoga que o condenaria em 27-VII-1656. Reproduzimos o manuscrito deste herem no vol.VI da nossa História de Portugal, Amadora, Ediclube, s.d., 1993, reed. 1997, vol. 6 (Judaísmo, Inquisição e Sebastianismo, p.90), a partir do original facsimilado do dito herem. Algumas das primeiras biografias do filósofo judeu publicadas, as de Johan Colerus, ministro da igreja luterana em Haia, em francês, em 1706, e do médico Lucas, de Haia, editada em francês em Hamburgo, em 1735, dão larga atenção a este anátema de expulsão: veja-se a recente edição Colerus–Lucas, supracitada, Vies de Spinoza, Paris, 2002; texto de Johan Colerus (La Vie de  B. de Spinoza, 1708, pp.7-91; texto de Jean-Maximilien Lucas, pp.93-112). Veja-se ainda António Damásio, Ao Encontro de Espinosa, ed. cit., pp,281-4 (texto da excomunhão: p.283).

[2] Sobre Ben Gurion (1886-1978), o primeiro-ministro israelita que leu a declaração da independência de Israel, em 14-V-1948, diante dum retrato de Herzl, veja-se: -Michal Bar-Zohar, Ben-Gurion. The armed Prophet, Tanglewood Cliffs (New Jersey), Prentice Wall, 1968. -Shimon Peres e David Landau, Ben-Gurion: a political Life, N. Iorque, Schoken, 2011. Note-se que, já no nosso século, em Setembro 2012, a comunidade judaica portuguesa de Amesterdão pediria ao rabino-mor, Haham Pinchas Toledano, que anulasse o herem contra Espinosa de 1656, o que não teve aceitação positiva, uma vez que o banido não recorrera dele, pelo que se manteve o banimento com mais de trezentos e cinquenta anos.

[3] Veja-se Henry Méchoulan, capítulo “O caso Uriel da Costa” in Être Juif à Amsterdam au Temps de Spinoza, Paris, 1991. Ver ainda: -Cecil Roth, Histoire des Marranes, Paris, Liana Levi, 2002, maxime pp. 187-198 (“A Jerusalém holandesa”). -Yosef Kaplan, “La Jérusalem du Nord: la communauté sefarade d’Amsterdam au XVIIe siècle”, in Henry Méchoulan (org.), Les Juifs d’Espagne: Histoire d’une Diaspora, 1492-1992, Paris, Liana Lévi, 1992. -Lionel Lévy, La Nation juive portugaise: Livourne, Amsterdam, Tunis, 1591-1951, Paris, L´Harmattan, 2000.-Daniel Lindenberg, Destins marranes. L’Identité juive en Question, ed. cit., pp.149-189.; o herem: pp.158-60

[4] Veja-se Espinosa, Tratado teológico-político, trad. e notas de Atilano Domínguez, Madrid, Alianza Editorial, 1986, maxime pp.130-4. “(…) Deus não elegeu para sempre os hebreus, mas sim nas mesmas condições em que havia escolhido os cananeus (…). Deus não elegeu a nação hebreia sem condições e para sempre”(p.131), pois só prometeu a aliança aos piedosos”, pelo que não se pode pensar que “só haja sido prometido aos judeus aos judeus piedosos, com exclusão dos demais”, pelo que “essa aliança eterna de contentamento e de amor de Deus é universal”, de modo que não há que admitir diferença alguma entre os judeus e os gentios”(p.132). “Quanto aos judeus terem subsistido tantos anos dispersos e sem Estado não há nada de estranho, uma vez que se separaram de todas as nações, a ponto de concitarem contra si o ódio de todas” (idem), sublinhando que “o ódio de muitos povos aos judeus é o que os conserva”(idem), citando o caso do que se passou em Espanha e Portugal, pois o rei da primeira teria forçado os judeus a aderirem à religião do reino ou a partirem para o exílio, tendo muitos aceitado converter-se, enquanto que em Portugal a mesma escolha provocou uma solução diversa, vivendo sempre separados mesmo quando aceitavam a religião do país (p.133). Se algum dia os judeus reconstruíssem o Estado que tinham tido, Deus os havia de eleger de novo (idem). Em suma, nenhuma nação se distingue de outra no que toca ao entendimento e à verdadeira virtude, pelo que nenhuma é eleita de Deus (p.134).

[5] Julius Gutttman, Philosophies of Judaism, Nova Iorque, Anchor Books, 1966, p.301. Este autor dedica especial atenção a Franz Rosenzweig, op. cit., pp.416-451 e 527-8.

[6] M.Gullan-Whur, op.cit., p.69).

[7] Apud André Vergez e  Denis Huisman, Histoire dês Philosophes illustrée par les Textes, Paris, ´Fernand Nathan, 1966, p.163.

[8] Ver Espinosa, Tratado teológico-político, cap.XVII e XVIII,  trad. cit., maxime pp.356-367. “Moisés (…) entregou aos seus sucessores um Estado que devia ser administrado de tal forma que não se pode denominar de popular, nem aristocrático, nem monárquico, mas sim teocrático.”(p.360). A este estado fundado por Moisés opunha E. a noção de “estado humano” (pp.369 e ss).

[9] Sobe este tópico, veja-se o estudo de Jonathan Israel, A Revolution of the Mind. Radical Enlightenment, Princeton, Princeton University Press, 2011.Veja-se adiante a análise desta obra.

[10] André Vergez e Denis Huisman, Histoire des Philosophes illustrée par les Textes, Paris, Fernand Nathan, 1966, pp.163-65 (síntese da filosofia espinosista).

[11] Sobre os filósofos judeus F.Rosenzweig e M.Buber, vide: -Nahum Norbert Glatzer, Franz Rosenzweig – His Life and Thought, pref, de Paul Mendes-Flohr, Indianapolis, Hackett Pub. Co., 1998 –Hillary Pitnam, Jewish Philosophy as a Guide to Life: Rosenkranz, Buber, Levinas and Wittgenstein, Bloomington, Indiana Uiversity Press, 2008. -Norbert Max Samuelson e outros, The Legacy of Franz Rosenzweig; collected Essays, Cornell Univ. Press, 2004. –Aubrey Hodes, Martin Buber. An intimate Portrait, N. Iorque, The Vikinb Press, 1971.

[12] Veja-se Espinosa, Tratado político, trad., introd. (pp.7-59) e notas de Atilano Domínguez, Madrid, Alianza Editorial, 1986.

[13] Sobre o TTP, veja-se Étienne Balibar, Spinoza et la Politique, Paris, PUF, 1985, maxime pp.26-34 (o contexto histórico da República holandesa no período em que E. publica o TTP), pp.35-62 (o TTP como manifesto democrático) e pp.64-90 (sobre o Tratado político).

[14] Di-lo J. Colerus na sua La Vie de B. de Spinoza, ed.cit., p.86 ( o falecimento de E.: pp.84-91).

[15] Colerus dá dele este retrato físico: “Quanto à sua pessoa e ao seu tamanho e aos traços do seu rosto, há ainda muitas pessoas de Haia que o viram e conheceram particularmente. Ele era de tamanho mediano, tinha os traços do rosto bem proporcionados, a pele um pouco escura. os cabelos frisados e negros e as pestanas longas e da mesma cor, de modo que pelo seu aspecto se reconhecia nele facilmente o descendente de Judeus portugueses.” (Vies de Spinoza, ed. Allia, p.39).

[16] Johann (ou Jan) de Witt (Dordrecht, 1625 – Haia, 1672), pertencente a uma rica família burguesa, conselheiro-plenipotenciário da Holanda (1653), cargo que conservaria quase até à sua morte violenta, autor do Acto de Exclusão que afastou Guilherme II de Orange do poder (1667), limitando as ambições do clã monárquico orangista, autor do compromisso com a Inglaterra para pôr fim à guerra (tratado de Breda, 1667), entrou em conflito com a França (1667-8) ao lado da Inglaterra e da Suécia; uma nova guerra com a França (1672-8) seria a sua desgraça, sendo assassinado pela multidão, juntamente com o seu irmão, voltando Guilherme de Orange ao poder. Sobre de Witte, cf. J. Rowen, John de Witt, Grand Pensionary of Holland 1625-1672, Princeton, Princeton University Press, 1978; sobre as suas relações com E., vide Margaret Gullan-Whur, op. cit, p.189 e ss. De Witt, primeiro magistrado da República holandesa, estimava o filósofo, a ponto de lhe  garantir uma pensão de Estado de 100 florins anuais: veja-se Henri Serouya, Spinoza. Sa Vie, sa Philosophie, Paris, Éditions Albin Michel, 1947, ilustr., p.46 (retrato de J, de W.: gravura X, diante da p.63. E. recusara dois mil florins que o seu admirador Simon de Vries, rico negociante de Amesterdão, lhe quisera dar, recomendando-lhe que desistisse da ideia de lhe deixar em herança a sua fortuna, pedindo-lhe que a desse antes ao irmão daquele; falecendo S. de V., constatou-se que este, no seu testamento, deixara um legado de 600 florins para o filósofo (cf. pp.45-6).

[17] Ver Espinosa, Éthique, trad. de Roland Caillois, Paris, Gallimard,  col. Folio, 1993, p.65.

[18] Veja-se o capítulo sobre E., de autoria de Roland Caillois, Les Philosophies de l’Antiquité au XXe siècle. Histoire et portraits, dir. de Maurice Merleau-Ponty, Paris, Livre de Poche, 2006. pp.516-530.

[19] Spinoza, L´Éthique, trad. cit., p.380. Sobre o “ateísmo” espinosista, vide Yannis Contantinides, “Spinoza athée?” in Le Nouvel Observateur, nº especial dedicado a Espinosa, Julho-Agosto de 2009, pp.30-33. Ver ainda: -M. Guéroult, Spinoza, t. I, Paris, Aubier, 1968.-Joseph Moreau, Espinsas e o Espinosismo, Lisboa, Edições 70, 1982, maxime pp.68-72 (a vida eterna). -Margaret Gullan.Whur, Within Reason: Life of Spinoza, op.cit. (mapa de Amesterdão com a posição das sinagogas e a casa de E., diante dela, p.206). -Jonathan Israel, A Revolution of the Mind. Radical Enlightenment and the intellectual Origins of the Modern Democracy, New Jersey, Cary (NC), Oxford Univ. Press, 2002. –Daniel B. Schwarz, The First Modern Jew. Spinoza and the History of an Image, Princeton e Oxford, Princeton University Press, 2012, ilustr..

[20] Nietzsche, Humain, trop Humain, t.II, Paris, Gonthier/Denoël, 1973, p.144. Nietzsche, embora acusasse Espinosa de ter procedido a uma “des-sensualização” da realidade como uma hidra, já que para este tipo de filósofo, “filosofar era um espécie de vampirização”, de modo que no seu “amor intellectualis Dei” se ouvia “um estalido de esqueleto”(Le gai Savoir, trad. de A.Vialatte, Paris, Gallimard, col. Idées,  1964, p.347) –, acabaria, no final da sua vida, por lastimar não ter estudado este pensador judeu com a atenção que ele merecia. Nos anos 80, durante a sua vagabundagem pela Itália, N. recebeu do seu amigo Overbeck um exemplar do livro sobre Espinosa, de Kuno Fischer (1824-1907), professor em Heidelberg, o que o levaria a escrever, em 30.-VI.1881: “Estou totalmente admirado, totalmente fascinado! Tenho um predecessor, e que predecessor! Eu quase não conhecia Espinosa: e se sinto agora necessidade dele, isso foi o efeito duma «acção instintiva». Não só a sua orientação geral é semelhante à minha – fazer do conhecimento o afecto mais poderoso –, mas ainda, além disso, eu mesmo me reconheço em cinco pontos fundamentais da sua doutrina: este pensador, o mais solitário e anómalo de todos, acaba por ser mais próximo de mim no seguinte: nega o livre-arbítrio; s finalidade; a ordem moral; o altruísmo; o mal.”(Lettres choisies,, trad. de A.Vialatte, Paris, Gallimard,1937, p.170). Sobre  N. e E., veja-se Curt Paul Janz, Friedrich Nietzsche. 3: Los Diez Años del Filósoso errante, Madrid, Alianza Editorial, 1985, p.64.

[21] Pierre-François Moreau, “Spinozisme” in Grand Dictionnaire de la Philosophie,  dir. De Michel Ray, Paris, Larouse, 2003, pp.982-3.  

[22] Isaac Deutscher (1907-1967), Essais sur le Problème Juif (versão francesa do obra The Non-Jewish Jew), p.39-40.

 

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