impulso!
100 discos de jazz para cativar os leigos e vencer os cépticos !
# 36 - JACKIE McLEAN
Um imitador que
de tanto imitar acabou por se descobrir a si próprio, assim poderia ser o
epitáfio de Jackie McLean. Mas comecemos pelo princípio.
Jackie McLean
pertenceu à primeira geração que gatinhou ao som do bebop. Em criança a música
deve ter sido o seu principal brinquedo, pois foi criado por um padrinho que
além de o levar regularmente pela mão ao teatro Apollo era dono de uma loja de
discos. Foi aí que ao ouvir gravações dos Kansas City Six de Lester Young terá
decidido ser jazzman quando fosse grande. Na escola deu os primeiros toques com
uns rapazes da idade dele chamados Sonny Rollins e Kenny Drew e as primeiras
aulas de músicas teve-as informalmente com uns vizinhos lá do bairro, o Sr.
Thelonious Monk, do 5º esquerdo, ou o Sr. Bud Powell da porta 21.
Tudo somado, debutou
aos 19 anos a convite de Miles Davis, no disco “Dig” de 1951. Mas o seu herói,
aquele que Jackie McLean desejava emular em todas as coisas, era Charlie
Parker.
Mais do que um
pupilo, McLean comportava-se como um vassalo, copiando o estilo do saxofone
alto do mestre a ponto de Parker, quando não lhe apetecia um concerto, enviar
McLean em sua substituição. Pior foi ter mergulhado atrás dele no abismo da
heroína. A única vantagem que Jackie Mclean trouxe desta lástima foi ter
protagonizado um dos mais incisivos filmes independentes dos anos 60, “The
Connection” (1962), de Shirley Clarke. Outra consequência do seu vício foi a
ubiquidade de McLean entre os anos 50 e 60, surgindo num número impressionante
de gravações como sideman – 17 discos
em 7 anos... Tal assiduidade deveu-se ao facto de o seu vício ter justificado as
autoridades a negarem-lhe a Licença de Cabaret, impedindo-o de actuar ao vivo
em Nova Iorque. Sem concertos, McLean estava sempre disponível para o ganha-pão
das sessões de estúdio.
Terá sido o
irascível Charles Mingus quem abanou a consciência de McLean para que deixasse
de ser um epígono e encontrasse um estilo pessoal. Esta sacudidela foi por bem,
a outra menos benevolente que Mingus lhe quis dar no decurso de uma altercação,
retorquiu McLean puxando da navalha.
New Soil
1959
Blue Note 784013
Jackie McLean
(saxofone alto); Donald Byrd (trompete); Walter Davis Jr. (piano); Paul
Chambers (contrabaixo); Pete La Roca (bateria).
Todos estes
lamentáveis sucessos contribuíram para que Jackie McLean não fosse
tremendamente levado a sério pelos seus coevos. Junte-se a isto o facto de “New
Soil” ter sido publicado em 1959, o ano mais pródigo da história do jazz, o que
muito contribuiu para a sua discreta recepção.
O disco captura McLean num momento
de transição, já senhor da sua voz musical, mas ainda sem saber muito bem para
onde dirigi-la. Do saxofone alto ele extrai um som cortante, apimentado,
abeirando-se da estridência, mas é o permanente olhar em volta, para todas as
direcções possíveis deste “novo chão”, que faz de “New Soil” um trabalho fresco
e em permanente procura. A peça inicial, “Hip Strut” gratifica-nos com 11
minutos de interrogações entre o saxofone alto de McLean e o trompete de Donald
Byrd, sobre uma fina película de blues, repetitivamente tocada em staccato pela
secção rítmica. E se esta vontade de confluir ainda não estivesse clara, a
ideia é reiterada no tema “Minor Apprehension” que abre com algumas rajadas
impecavelmente bopers de McLean mas no final ostenta um solo de bateria de Pete
La Roca já de todo liberto de amarras rítmicas.
“New Soil” não
teve repercussão imediata, foi preciso deixar passar algum tempo para se
descobrir que esta obra poderia ter sido o princípio de uma história alternativa
do jazz em que o bebop e elementos do free jazz poderiam concordar e, a limite,
mesclarem-se numa espécie autónoma.
Apesar das tropelias com
estupefacientes, a vida de Jackie McLean prosseguiu até aos 74 anos – não
tantos como os 83 de William S. Burroughs, o profeta junkie – concedendo-lhe uma carreira admiravelmente sem decadência.
José Navarro de Andrade
Gostava de ler sobre as aulas referidas .Conhecendo o feitio e os (alguns)hábitos dos referidos professores.Não me admira que o aluno tenha puxado de navalha .Provavelmente tambem não conhecia bem o Mingus ou era mesmo corajoso .Eu nem com um revolver afrontaria o dito a julgar pela fama.
ResponderEliminarPode crer, o homem era muito volumoso e irascível...
ResponderEliminarGrande post, como de costume.
ResponderEliminarLê-se e parece cinema.
Depois da bola vou colocar o mister em dose dupla.
Até logo.