quinta-feira, 28 de maio de 2015





impulso!

100 discos de jazz para cativar os leigos e vencer os cépticos !

 


# 36 - JACKIE McLEAN
 



 

 
Um imitador que de tanto imitar acabou por se descobrir a si próprio, assim poderia ser o epitáfio de Jackie McLean. Mas comecemos pelo princípio.
Jackie McLean pertenceu à primeira geração que gatinhou ao som do bebop. Em criança a música deve ter sido o seu principal brinquedo, pois foi criado por um padrinho que além de o levar regularmente pela mão ao teatro Apollo era dono de uma loja de discos. Foi aí que ao ouvir gravações dos Kansas City Six de Lester Young terá decidido ser jazzman quando fosse grande. Na escola deu os primeiros toques com uns rapazes da idade dele chamados Sonny Rollins e Kenny Drew e as primeiras aulas de músicas teve-as informalmente com uns vizinhos lá do bairro, o Sr. Thelonious Monk, do 5º esquerdo, ou o Sr. Bud Powell da porta 21.
Tudo somado, debutou aos 19 anos a convite de Miles Davis, no disco “Dig” de 1951. Mas o seu herói, aquele que Jackie McLean desejava emular em todas as coisas, era Charlie Parker.
Mais do que um pupilo, McLean comportava-se como um vassalo, copiando o estilo do saxofone alto do mestre a ponto de Parker, quando não lhe apetecia um concerto, enviar McLean em sua substituição. Pior foi ter mergulhado atrás dele no abismo da heroína. A única vantagem que Jackie Mclean trouxe desta lástima foi ter protagonizado um dos mais incisivos filmes independentes dos anos 60, “The Connection” (1962), de Shirley Clarke. Outra consequência do seu vício foi a ubiquidade de McLean entre os anos 50 e 60, surgindo num número impressionante de gravações como sideman – 17 discos em 7 anos... Tal assiduidade deveu-se ao facto de o seu vício ter justificado as autoridades a negarem-lhe a Licença de Cabaret, impedindo-o de actuar ao vivo em Nova Iorque. Sem concertos, McLean estava sempre disponível para o ganha-pão das sessões de estúdio.
Terá sido o irascível Charles Mingus quem abanou a consciência de McLean para que deixasse de ser um epígono e encontrasse um estilo pessoal. Esta sacudidela foi por bem, a outra menos benevolente que Mingus lhe quis dar no decurso de uma altercação, retorquiu McLean puxando da navalha.
 
 

 
New Soil
1959
Blue Note 784013
Jackie McLean (saxofone alto); Donald Byrd (trompete); Walter Davis Jr. (piano); Paul Chambers (contrabaixo); Pete La Roca (bateria).
 
 
Todos estes lamentáveis sucessos contribuíram para que Jackie McLean não fosse tremendamente levado a sério pelos seus coevos. Junte-se a isto o facto de “New Soil” ter sido publicado em 1959, o ano mais pródigo da história do jazz, o que muito contribuiu para a sua discreta recepção.
O disco captura McLean num momento de transição, já senhor da sua voz musical, mas ainda sem saber muito bem para onde dirigi-la. Do saxofone alto ele extrai um som cortante, apimentado, abeirando-se da estridência, mas é o permanente olhar em volta, para todas as direcções possíveis deste “novo chão”, que faz de “New Soil” um trabalho fresco e em permanente procura. A peça inicial, “Hip Strut” gratifica-nos com 11 minutos de interrogações entre o saxofone alto de McLean e o trompete de Donald Byrd, sobre uma fina película de blues, repetitivamente tocada em staccato pela secção rítmica. E se esta vontade de confluir ainda não estivesse clara, a ideia é reiterada no tema “Minor Apprehension” que abre com algumas rajadas impecavelmente bopers de McLean mas no final ostenta um solo de bateria de Pete La Roca já de todo liberto de amarras rítmicas.
“New Soil” não teve repercussão imediata, foi preciso deixar passar algum tempo para se descobrir que esta obra poderia ter sido o princípio de uma história alternativa do jazz em que o bebop e elementos do free jazz poderiam concordar e, a limite, mesclarem-se numa espécie autónoma.
Apesar das tropelias com estupefacientes, a vida de Jackie McLean prosseguiu até aos 74 anos – não tantos como os 83 de William S. Burroughs, o profeta junkie – concedendo-lhe uma carreira admiravelmente sem decadência.
 
 
 
José Navarro de Andrade
 

 

 

 

 

 

3 comentários:

  1. Gostava de ler sobre as aulas referidas .Conhecendo o feitio e os (alguns)hábitos dos referidos professores.Não me admira que o aluno tenha puxado de navalha .Provavelmente tambem não conhecia bem o Mingus ou era mesmo corajoso .Eu nem com um revolver afrontaria o dito a julgar pela fama.

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  2. Pode crer, o homem era muito volumoso e irascível...

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  3. Grande post, como de costume.
    Lê-se e parece cinema.
    Depois da bola vou colocar o mister em dose dupla.
    Até logo.

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