terça-feira, 17 de março de 2015

Elis.

 
 

 

 


Se fosse viva, faria hoje 70 anos. Até parece mentira; confesso que nem acreditei quando uma voz amiga me disse.

Esta é uma das actuações mais impressionantes que lhe conheço. Aquela em que Elis é mais ela. Mesmo só ela. Não será certamente das melhores, em termos artísticos ou musicais. Mas é das mais expressivas, das que mais eloquentemente retratam os abismos em que caíra. Ali estão todos os seus tormentos. Ali está, exuberantemente exposta, a mecânica da dor e do sofrimento que fez com que hoje, no dia de hoje, Elis Regina Carvalho Costa não comemore 70 anos de vida.
Pela fundura dos seus abismos, pela desmesura dos seus excessos, terão alguns a tendência de a colocar ao lado doutros que morreram jovens; de a encarar, tão simplesmente, como uma versão brasileira de Janis Joplin. E, de caminho, lá virá a frase estafada morrem novos aqueles que os deuses amam. Puro engano. Cada um dos que morreu como Elis Regina, chame-se Janis Joplin, Jimmy Hendrix ou Jim Morrison, morreu à sua maneira. Por causas e sofrimentos que eram deles, só deles, tão íntimos quanto intransmissíveis. Ela era Elis, Elis Regina; sendo como foi, nunca poderia viver 70 anos. Nem tínhamos sequer o direito de pedir-lhe que os vivesse, e assim os sofresse vivendo.  

       Entre a parede e a espada, me atiro contra a espada – disse Elis, um dia. A frase, dilacerante, serve de pórtico a uma biografia sua, lida já há vários anos: Furacão Elis, de Regina Echeverria. Agora, disse-me a voz amiga, saiu novo livro, mais amplo e completo. E foi lançado um site oficial em sua memória. Decerto não será o Elis Regina Shop, que descobri ao acaso, mudo de espanto perante o vil comércio daquilo que é intangível, o génio absoluto. Respeitem a maior cantora desta terra, afirmou Caetano, frase que bem se poderia aplicar à loja virtual de produtos Elis Regina. Adiante, que interessa isso, logo neste dia? Mandaram-me, com todas as letras, uma entrevista de Elis a Clarice Lispector. Haverá forma melhor de recordar que hoje era o seu aniversário?  
 
 
 
 

 

3 comentários:

  1. A interpretação é notável e toda ao natural, dramática e sem encenação. Na entrevista não li nada especial.

    Há pessoas que não poderiam mesmo morrer tarde. São excessivas, atiram-se para a espada.

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  2. Grande interpreteNo video sofre mais com o calor do estudio que com a emoção.Morte "acidental" ,para poupar a voz a cocaína era ingerida oralmente e com uma absorção erratica e...talvez fosse em outro dia ou semana.Ja aqui a proposito de M Davis falei da confusão que ha entre o artista e a sua arte.

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  3. :)) aquelas lágrimas não são calor de estúdio. e a voz não treme de calor, mas de emoção pode tremer.

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