impulso!
100 discos de jazz para cativar os leigos e vencer os cépticos !
# 62 - LEE KONITZ
Sempre
adernado alguns graus em relação ao eixo dominante, embora nunca descaindo até
às inconformidades e despeitos da margem, Lee Konitz passou por muita formas de
jazz desde que despontou na aurora dos anos 50, constantemente denotando um
apurado sentido de equilíbrio, para que sem desacato ou alinhamento demarcasse
uma voz, mais do que um estilo, característica. Talvez não seja estranho que a
maior parte da pequena parte de músicos brancos que se destinaram ao jazz
provenha da comunidade judaica americana; é necessário um sólido amparo
cultural para viver, e ainda assim crescer, perpetuamente em minoria.
Lee
Konitz foi o discípulo predilecto de Lennie Tristano que no seu exemplo de
austeridade, mais do que pelos ensinamentos formais, lhe terá induzido a estar
atento à inovação, mas a não ir em modas, prescrição nada fácil de aguentar por
um jovem que principiava em plena explosão do bebop. Este distanciamento formal
veio a encontrar guarida na célebre tertúlia de Gil Evans que congeminou o cool
jazz, modalidade da qual ele foi um dos fundadores – e um dos protagonistas de
“Birth of Cool” o “tal” disco editado 7 anos depois da sua gravação, quando a
música nele ouvida já tinha algo de serôdio – mas depressa um dos dissidentes.
À
semelhança de Gery Mulligan, também Konitz se trasladou para a Costa Oeste onde
as oportunidades pareciam melhores; mas se Mulligan empregou a descontração
californiana no incremento do cool, Konitz, que não procurava escola, mas antes
um caminho, deu largas à sua heterodoxia. Por isso é frequente recorrer ao
substantivo “maverick” para adjectivar a sua atitude.
Motion
1961 (2007)
Verve / Universal
Distribution - 9330
Lee Konitz
(saxofone alto), Sonny Dallas (contrabaixo), Elvin Jones (bateria).
A
hora definitiva de Konitz chegaria em 1961, apesar de em 1955 ter assinado uma
obra notável com o tenorista Wayne Marsh. Dizem os puristas, sem que a razão os
abandone inteiramente, que no improviso está a beleza e a verdadeira ecologia
do jazz, mesmo quando a situação é premeditada, ou seja, numa gravação em
estúdio. Foi o que aconteceu em “Motion”. Lee Konitz nunca dantes trabalhara em
trio de saxofone, ao mesmo tempo sem cordas nem o desafio doutro metal. Para
agravar o caso Elvin Jones assomou com a verve espevitada pelo concerto de
véspera com Coltrane, num quinteto em que tinha de impulsionar ritmicamente
dois saxofones e um baixo enérgico. De modo que a Sonny Dallas coube
aguentar-se no papel de pau-de-cabeleira na ininterrupta e irrequieta troca de
mimos entre, por um lado, as harmonias menos tensas, notas mais longas e o
timbre seco de Konitz e, por outro, as vagas lançadas por Jones.
O
carácter irrepetível de “Motion” e a simbose nele escutada entre dois modos de
ser bem distintos fazem do disco um instante de fulgor.
José Navarro de Andrade
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