impulso!
100 discos de jazz para cativar os leigos e vencer os cépticos !
# 26 - CLIFFORD
BROWN
Fotografia de Francis Wolff
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Também o jazz teve o seu James Dean. Seis
meses mais velho que o golden boy de
Holywood, Clifford Brown morreria seis meses depois dele e de modo semelhante. Mas
em vez de estampar-se epicamente ao volante de um Porsche a alta velocidade
numa estrada deserta da Califórnia, Brown foi vítima de um abjecto azar, despistando-se
na Pensilvânia Turnpike, numa noite de chuva, a caminho de um concerto em
Chicago.
Quatro anos de gravações foi o tudo que Clifford
Brown nos legou e não foi nada pouco. É material suficiente para que os
nostálgicos se permitam chorar, agarrando-se às promessas por ele deixadas de
uma evolução diferente do jazz, mas é também um acervo por demais gratificante
para que se identifique nele uma indelével marca no jazz. Em muito pouco tempo
Clifford Brown destacou-se pela originalidade de pretender um desenvolvimento
do espólio do bebop prescindindo da pressa febril – que por esta altura já
tinha o seu quê de malabarismo técnico da parte de aprendizes – e sem aquele traço
de ansiedade existencial que timbrava a música do quinteto de Miles Davis com
John Coltrane, com quem se dizia que rivalizava.
Quase se pode dizer que havia razões
clínicas para a atitude de Brown. Ele era aquele que entre os seus pares não se
havia submetido ao alento e aos avatares dos narcóticos ou do álcool. Quando o
ouvimos nas gravações em palco, ou mesmo nas de estúdio, é ele próprio que
escutamos, vertiginoso e consciente, sagaz e súbito, e não os demónios que às
vezes os músicos pedem que os levem para além de si.
Clifford Brown não se demitia dos agudos
como Miles, nem temia os graves como Dizz, engrenava a velocidade que lhe
parecia necessária ao andamento da música, fosse ela eufórica ou lírica, mas
sobretudo, fizesse chuva ou sol, embalava um swing quase físico, mesmo que
tivesse de esmagar uma ou duas notas pelo caminho, como lhe reparavam alguns
críticos. Balelas!, não era a perfeição que Clifford Brown propunha, e, já
agora, nem um estado de alma, mas o jazz dinâmico, gracioso e cordial, donde se
podia ver o céu, como o dos apogeus de Duke Ellington ou Count Basie. Talvez pela
sua falta de egotismo, Brown tenha sido o príncipe perfeito para cantoras que
com ele descolaram para altos voos, como Hellen Merrill, Dinah Washington, e
particularmente Sarah Vaughan, a quem o trompetista propiciou que revelasse
todo o esplendor da sua voz. Inspiração e mestre Clifford Brown atribuiu-os
principalmente a Fats Navarro – sem nunca desmerecer Dizzy Gillespie – um dos
meteoritos do primitivo bebop que por manifesta malvadez do destino sofreria
uma carreira tão curta como viria a ser a sua. Sendo desinteressante saber se a
sua música daria para mais se a vida lhe tivesse dado mais tempo, há que levar,
então, a formação que Brown partilhou com o baterista Max Roach na conta de
terem sido os últimos moicanos do bebop.
Clifford
Brown and Max Roach at Basin Street
1956 (2004)
Universal – 9531
Clifford Brown (trompete), Sonny Rollins (saxofone
tenor), Richie Powell (piano), George Morrow (contrabaixo), Max Roach
(bateria).
Marca de água do jazz é a capacidade de
cada um dos músicos em despertar e estimular aqueles com quem toca. Poucos o
terão feito com maior idoneidade do que Clifford Brown neste quinteto. Sonny Rollins,
o seu par de dança no saxofone, começaria o ano de 1956 com estas gravações no
clube Basin Street e depois haveria de gravar “Tenor Madness” em Maio e “Saxofone
Colossus” em Junho. Fazendo uma comparação bombástica, mas nem por isso menos
acurada, seria como se Howard Hawks tivesse realizado no mesmo ano “To Have and
Have Not”, “Red River” e “Rio Bravo”. Isto só pode estar tudo ligado e na origem
esteve Clifford Brown. À bateria Max Roach demonstrava que se emancipara da
tutela de Jo Jones, sendo capaz de desencadear pequenos tornados rítmicos sem
nunca perder o controlo – dava aqui o passo decisivo de uma trajectória que os
alcandorou entre os primeiros da percussão no jazz.
Clifford Brown não teve tempo para
amadurecer o fruto de uma escola, mas polinizou o porvir do trompete do jazz de
modo surpreendente para uma presença tão breve – até hoje ninguém o esqueceu.
José Navarro de Andrade
Enquanto se fazia a mala deu para publicar um da bela serie Verve Jazz Masters.
ResponderEliminarBoas férias FA, cá o espero.
EliminarPior é que nem sequer ia a conduzir na noite do acidente.Tanto quanto sei além de não entrar no clube da heroina, coletava dinheiro para ajuda das inúmeras viúvas da mesma.Ironia do destino.Um aviso aos que resolverem comprar agora discos do nosso artista.Comprem edições em caixa que fica por um décimo do preço do um por um.
ResponderEliminarE, então, por via digital (iTunes, passe a publicidade) as caixas estão a preço de saldo. Sempre vai havendo algumas vantagens em gostar de um género musical se interesse comercial...
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