quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Dahlov Ipcar.

 
 
 


















 


As paixões são assim, repentinas. Mas, quando batem, dão forte. Ando desvairado por uma senhora. E não me importa nada que se chame Dahlov Ipcar e que tenha nascido no ano de 1917, prestes a ser centenária. Como não me interessa nada saber como é que nasceu com o apelido Zorach e tenha decidido ficar com o nome do marido, que, bem vistas as coisas, também é um bocadinho estranho: Ipcar (que até parece nome de um instituto público). 
          O objecto da minha paixão teve – e tem  – uma vida maravilhosa. Nasceu no Vermont, viveu uns tempos em Greenwich Village, NY, mas fixou-se no Maine em 1937 – e, desde então, pouco de lá saiu. A biografia de Dahlov resume-se a isto. O resto é trabalho e família, uma existência longa e boa e simples a desenhar coisas lindas. A partir dos anos 80, muito do que fez Dahlov não suscita a comoção do belo, havendo até umas rosáceas com animais que mais valia eu não as ter visto. Mas os livros infantis dos anos 60 são simplesmente  únicos. Descobri-os há pouco, é paixão recente, tórrida de poucos dias. Hoje falo apenas daquele que considero o melhor de todos, I Like Animals, de 1960, reeditado o ano passado pela Flying Eye Books. As fotografias dão uma pálida imagem do talento da senhora Ipcar, que tem aquilo que alguém já chamou a inteligência amorosa das coisas. Com um grafismo típico dos anos 60, alternando páginas carregadas de cores vivas com outras mais sóbrias na paleta, I Like Animals é uma delícia indescritível. Aos 97 anos, fresquíssima, Dahlov Ipcar continua a desenhar e a pintar, na companhia de netos e cães. 
          Há uns dias, o Miguel Esteves Cardoso teve a desfaçatez amiga de se pôr a falar, para mais em Público, da minha generosidade, só por eu mostrar aqui no Malomil o que vou lendo e encontrando por aí fora. Não há generosidade nenhuma, só a dele, imensa como sempre, na irmandade do twee. Falar de Dahlov Ipcar não é generosidade nenhuma. Esconder a senhora é que seria um crime. Simplesmente isso, nada mais do que isso.
 
António Araújo
 
 
   
 
 


 

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