sábado, 21 de setembro de 2013

Na Igreja da Polana.










 
No passado mês de Julho, pouco antes de regressar a Portugal, num domingo ao cair da noite fui a uma missa na igreja católica da Polana, em Maputo. Recordei o episódio quando, há dias, ouvia o comentário do Prof. Marcelo Rebelo de Sousa na TVI a partir de Maputo em que se referiu a essa igreja. No dia em que fui à missa estavam apenas ocupados cerca de um terço dos lugares. Segundo me explicaram, a igreja da Polana costuma ficar lotada à sexta-feira ao final da tarde e sobretudo ao domingo de manhã. Na missa a que assisti, os membros do clero que dirigiram a cerimónia eram todos negros. Os demais que auxiliavam o acto litúrgico eram alguns negros, um ou outro mestiço e sobretudo brancos. Do lado das pessoas presentes na missa nesse dia, os negros estavam em minoria. Havia alguns mestiços, mas dominavam as pessoas brancas. Certamente que existirão diferenças entre uma missa em 2013, em Maputo, e uma missa neste mesmo local em 1973, em Lourenço Marques. Mas sobra qualquer coisa de permanente que atravessa o tempo, mas que também se vai adaptando às invariâncias do espaço. Na Cova da Piedade, em Almada, até há poucos meses celebrava missa um padre negro, com um outro acólitos também negros e pessoas negras entre as presentes na missa. Isso para dizer que as cerimónias religiosas nos antípodas podem ser socialmente semelhantes. Na aparência e não só. Os impérios não morrem. A homilia que ouvi em Maputo era sobre a necessidade de escutarmos o próximo, de termos compaixão por ele, bem como uma visão crítica do ruído interior e exterior ao sujeito. Tal homilia seria, mesmo nos detalhes, inteiramente transponível para a actual sociedade portuguesa. Assim chegamos à sociologia. O ideal-tipo de instituição é isto: isolada na forma das particularidades do social, isto é, com sentidos de pertença, normas e rituais de funcionamento mais ou menos universalizados. O mesmo deveria acontecer quando entramos numa universidade, numa esquadra de polícia, num hospital, num tribunal, num parlamento, numa repartição de finanças, numa escola, num transporte público, num centro comercial (diferente de um mercado de rua). Por um lado, o institucional é tendencialmente fechado das particularidades do social e tendencialmente universal quando se trata de instituições que regulam as sociedades pós-tradicionais; por outro lado, o contexto social que está para lá do institucional, o espaço público, o espaço aberto, é que é específico de cada sociedade. Quando um padre, um polícia, um professor, um médico, entre outros, viaja da sua igreja, esquadra, sala de aula ou hospital para igrejas, esquadras, salas de aula ou hospitais de países de outros continentes e nota disfuncionalidades acentuadas no modo de funcionamento em relação à sua instituição de origem, alguma coisa deverá estar errada no destino ou na origem. Isto não é eurocentrismo. É o mais básico da condição humana. Uma igreja é uma igreja, um hospital é um hospital, um tribunal é um tribunal, uma esquadra é uma esquadra, uma sala de aula é uma sala de aula. Onde quer que estejamos.
 
 
Gabriel Mithá Ribeiro
 
 
 

2 comentários:

  1. Assisti à construção desta igreja e à sua consagração. O seu clero e fiéis eram, em 1973, quase exlclusivamente brancos. Afinal era e ainda é uma das zonas mais exclusivas da cidade.
    Hoje vivo na província portuguesa. Em aldeias onde não há negros e quase não existe já população branca indígena, é curioso ver que o padre da terra ou é negro ou mestiçado de índio da América do Sul, pregando para aldeões descendentes da mestiçagem entre árabes, judeus e godos. Parece-me o império de torna viagem!

    ResponderEliminar