Os nomes das ruas costumam durar
décadas ou séculos, raramente são alterados. É o caso da longa Rua das Praças,
no bairro da Lapa em Lisboa, que é cortada por sete ruas, passa pelo mítico Sr.
Vinho cantado por Amália e acaba junto ao ISEG. A rua é estreita e ladeada por
prédios, não há ali praça nenhuma, hoje, mas o nome mantém-se desde o século
XVIII.
É pena, porque lhe ficaria bem o nome
Rua Maluda. A pintora Maluda (Maria de Lourdes Ribeiro) viveu nessa rua e teve
aí o seu atelier. Mais importante: as janelas e azulejos dessa mesma rua
inspiraram alguns dos quadros mais icónicos de Maluda, entre eles o que ilustra
este texto, baseado na fachada do n.º 37 da Rua das Praças. Crê-se também que o
lindíssimo azul-Tejo de tantas obras da pintora resultou de anos e anos a ver o
rio pela janela de sua casa.
Nascida e crescida, até aos 30 anos,
na liberdade colonialista de Goa e Maputo e na liberdade europeia de Paris,
Maluda viveu os seus restantes 35 anos vida em Lisboa (morreu faz hoje 25
anos). Tinha um estilo de vida boémio e era amiga de muitos outros artistas,
entre os quais a já referida Amália. Era também homossexual, e o seu longo
namoro com Ana Zanatti provocou um mini-escândalo na elite socioeconómica a que
pertencia.
Da sua obra sobressaem as janelas
lisboetas, quase sempre fechadas, reflectindo mais o exterior do que mostrando
o interior. O detalhe geométrico dos desenhos e o brilho nos azulejos são um
deleite para quem ama Lisboa banhada pelo sol, para quem ama pintura e
arquitectura, simetria e ordem, cores fortes e cheias. Mas Maluda fez muito
mais: desenhou Lisboa vista de cima, com o Tejo ao fundo; desenhou quiosques
lisboetas, faróis e janelas manuelinas em selos premiados internacionalmente;
fez cartazes, tapeçarias, serigrafias.
A Rua das Praças é a minha Rua
Maluda, e não a Rua Maluda que existe, desde 2007, no bairro das
Galinheiras da freguesia de Santa Clara, a mais exterior do concelho de Lisboa.
Essa longa rua, tem graça, também é cortada por várias, neste caso seis, ruas
transversais. As suas muitas janelas, sem azulejos em volta, são de bairro
social. E é possível que dentro delas vivam algumas das pintoras do futuro.
Rui
Passos Rocha
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