Li há dias uma crítica estupenda a Parasitas, nas páginas do TLS, em que se dizia, e muito, que o filme é um filme sobre a confiança – e a perda dela. De facto, pensado nessa perspectiva, Parasitas retrata o modo como uma família conquista a confiança da outra e se apodera dela, sugando-lhe o sangue. E sobre os dispositivos geradores dessa confiança, por parte de uma elite naturalmente desconfiada e, no caso da protagonista feminina, a dondoca temerosa e frágil, muito dependente de «referências» avalizadoras de «qualidade»: diplomas universitários, nomes pomposos (arte terapia), conhecimentos pessoais. O seu marido é também refém dos preconceitos geradores da confiança e da perda de confiança, ardilosamente manipulados pela família parasita (mas, afinal, quem são os verdadeiros parasitas, os pobres ou os ricos?). Daí a importância que confere a um cartão de visita de uma empresa de recrutamento e colocação de pessoal que inverte os termos da selecção: não é o cliente que exige referências à empresa, é esta que reclama do cliente que lhe dê tudo, incluindo contas bancárias. Depois, a «comunidade de segredo», para usar um conceito avançado por Sissela Bok num livro fulgurante, Secrets. A família pobre cria uma comunidade de segredo, pois disso se alimenta, até ao momento em que essa comunidade é intersectada pela presença de outros famintos, em concorrência feroz – e a luta intraclassista surge aqui como tão ou mais violenta do que o conflito interclassista. E, claro, o modo como o ponto básico dessa luta se centra na destruição da confiança junto da entidade patronal: a governanta é despedida não por estar doente mas por ter atraiçoado a confiança dos seus patrões.
O filme é, ele próprio, um produto de
consumo, cuja confiança, aos olhos do espectador potencial, surge agora
certificada pelos Óscares e, mais do que isso, pelo êxito de bilheteira,
propalado de boca em boca (ou de boca a orelha). Outros produtos têm outros
expedientes, como a antiguidade da marca ou o apoio de consumidores-chave.,
seja o actor de Hollywood ou a Casa Real britânica (by appointement…). O que é
curioso, curiosíssimo, é que Parasitas
tem dado sucesso planetário a uma marca de batatas fritas da Galiza, agora
certificada pela sua presença numa mansão de luxo de um filme do Extremo
Oriente. As batatas Bonilla a la Vista chegaram à Coreia do Sul em Abril de
2016, e desde então têm feito furor. (aqui, por exemplo, ou aqui) Vende-se em latas de 500 gramas, a casa
Bonilla foi fundada em 1932. Batatas fritas a 170 graus, em azeite virgem, em
cubas de banho maria. Não provei ainda, mas lá iremos.
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