quarta-feira, 16 de setembro de 2020

A propósito de Hans Küng, um salto de 30 anos ao passado.

 



Há alguns anos que o padre Anselmo Borges, aposentado professor de Filosofia na Universidade de Coimbra, publica uma crónica na edição do Diário de Notícias de domingo. Desde que nos conhecemos pessoalmente num encontro de Filosofia, envia-mos de véspera. A desta semana é sobre Hans Küng, o famoso teólogo suíço, antigo professor na Universidade de Tübingen, na Alemanha, e que mexeu comigo nos meus anos de Teologia no Seminário de Angra (sobretudo com o seu Infalibilidade? – uma pergunta – traduzo, porque na altura não o li em português pois não havia ainda tradução portuguesa e li em espanhol) onde tínhamos a sua versão local na pessoa do Dr. Cunha de Oliveira, nosso professor de Sagrada Escritura. Sempre pensei nesse meu professor como parecido com Hans Küng. Não só no estilo emotivo, abrasivo e fulgurante, mas também na sua visão do mundo e até mesmo nos traços fisionómicos. Não que parecessem gémeos, mas o Dr. Cunha, tal como Küng, exibia no rosto os traços de mistura dos temperamentos sanguíneo e apaixonado (termos que hoje já ninguém usa, mas era o que se usava no nosso tempo - Fernando Pessoa, por exemplo, era fleumático).

Nunca me esqueci de um dia passado em Tübingen, em 1989, onde fiz questão de fazer uma paragem precisamente por causa da mítica figura de Küng. Explico-me:


Em 1987, eu tinha publicado um livrinho sobre Pessoa e Mensagem (Mensagem – uma tentativa de reinterpretação, 1987) com uma revisitação“fora da caixa”, e um grupo de lusófilos alemães convidou-me para fazer um circuito de intervenções em universidades no seu país, quase todas acerca desse tema. Fiz um périplo de palestras de Kiel e Hamburgo até Frankfurt. Porque uma das intervenções era em Marburg, onde leccionava o amabilísssimo Dieter Woll (1933-2012), resolvi adicionar uma paragem no percurso em Tübingen, que fica relativamente perto. Tinha uma grande curiosidade acerca do burgo pois estava encantado com as pequenas cidades universitárias alemãs que, juntamente com as britânicas, haviam servido de modelo para as congéneres norte-americanas nos séculos 17, 18 e 19.


Adorei a experiência. Fui mexericar os corredores do edifício onde Melanchthon, o lendário pensador da Reforma, e  mais tarde Hegel leccionaram. Aluguei um barquito a remos para me passear perdidamente abaixo e acima no estreito rio Neckar, deixando-me ficar (contemplativo – podem crer!) por um bom bocado à sombra dos belos chorões, mesmo junto à casa do poeta Hölderlin.


Ainda fui à lista telefónica procurar o número de telefone de Hans Küng e… encontrei-o. Faltou-me, porém, a coragem de o incomodar.


Porque ontem me pus a falar nisto a dois ou três amigos, hoje fui a um caixotão onde tenho milhares de fotos em envelopes (juro que não exagero) à espera de tempo para as colocar em álbuns e deparei com um envelope para cada uma das cidades alemãs visitadas nessa viagem de (agora sei exactamente) 1989. Infelizmente, na bela e fotogénica Heidelberg apanhei um dia enevoado e as fotos ficaram chaladas.


Do conjunto de Tübingen, retirei as que aqui vão.


Porque viajei sempre só, as fotos em que apareço a remar foram tiradas por alguém que estava na margem e a quem pedi o favor. Rarissimamente faço isso, contudo naquele encantador lugar não resisti. A casa de Hölderlin é o belo prédio amarelo. A última foto foi tirada de um dos edifícios da universidade, no alto da colina.


Agora, a 30 anos de distância, dá para ver a diferença entre o que era possível fazer-se com uma maquineta Pentax 1000 dessa altura e o que hoje um simples telemóvel consegue. Mas é o que há e o que resta para ajuda da memória.

 

Onésimo Teotónio de Almeida

 









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