quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Dar aulas... ou recebê-las?

 
 
 
 
 



Universidade de Brown
Fotografias de Onésimo Teotónio de Almeida






O meu seminário “On the Dawn of Modernity” é para mim uma fonte de prazer, mesmo ao fim de tantos anos. Os cento e cinquenta minutos passam num ápice.
Nestas últimas semanas, uma hora é destinada a apresentações dos alunos, sobre temas por eles escolhidos, relacionados com o assunto central do curso e abrindo para outros não cobertos pelas leituras mas que eles investigam de acordo com sugestões minhas e consoante os interesses de cada um.
Dá gosto ver aquele desfile de calouros meia-hora diante dos colegas usando de equipamento electrónico e exibindo uma presença plena de à-vontade, revelando saber falar em público, expondo ideias de modo estruturado e com clareza e vivacidade. As escolhas vão desde o contributo árabe para a ciência, Roger Bacon e a experiência, Leonardo da Vinci cientista, até, por exemplo, à questão do não desenvolvimento das ciências na antiga China.
Desta vez, as duas apresentações menos conseguidas foram de dois alunos chineses, educados na China e portanto nada habituados a intervir nas aulas, e muito menos a dar uma lição diante dos colegas. Num caso específico, o Yichao parou a meio e assim ficou, imóvel, em silêncio, a olhar fixamente para o computador. Deixei-o por um bocado a ver como se desembaraçava, até que, às tantas, ele se voltou para mim: Professor, não estou convenientemente preparado. Posso fazer a minha apresentação para a semana?
Ora eu sabia que ele estava extremamente bem preparado. O Yichao tinha lido quatro livros - dois além dos que eu sugerira - e trocara e-mails comigo sobre eles. Por isso respondi-lhe: Não, Yichao. Se eu lhe der mais uma semana, você vai por-se a ler mais livros e vai dispersar-se ainda mais num mar de dados. O que você precisa é de calma e descontração. E comecei a fazer-lhe perguntas directas, a que ele foi respondendo magnificamente, revelando estar altamente informado e ter ideias muitíssimo claras.
Horas depois, chegou-me um e-mail dele a agradecer a lição de pedagogia.
Bom, mas o curso tem-me proporcionado o habitual prazer de presenciar o entusiasmo da rapaziada com, por exemplo, o Canto V d’ Os Lusíadas (em inglês, claro, pois nenhum dos alunos fala português). O mesmo na semana passada com um estudo do historiador holandês R. Hooykaas sobre os roteiros de D. João de Castro (em vez dos próprios roteiros, como eu teria preferido, pois privilegio a leitura de fontes primárias, mas nenhum está traduzido em inglês). Hoje, quando abri o debate sobre o relato de Antonio Pigafetta da viagem de Fernão de Magalhães, todos queriam falar ao mesmo tempo. O entusiasmo deles era deveras contagioso. Tinham, como sempre, lido tudo e os comentários saltavam-lhes incontidos. Para o Oliver, a leitura foi pelo menos tão gostosa como a de As Viagens de Gulliver. O Michael acrescentou: É um autêntico clássico! E o Sean pegou na deixa: Sim, um clássico. É a Odisseia, mas com a diferença de que o herói morre.
É por estas e por outras que não me quero reformar.
 
 
 
Onésimo Teotónio de Almeida
 
 
 
 
 



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