sexta-feira, 16 de fevereiro de 2018

Notas sobre A Grande Onda - 7

 
 
 

 
         7.
 
        Além do exemplar do pintor Charles Shannon, o Museu Britânico possui um outro, adquirido em 1906, outrora pertencente ao escritor e jornalista Arthur Morrison (1863-1945). Trata-se da cópia mais antiga de A Grande Onda que o British Museum tem no seu acervo.

 
         Em 2008, com o apoio do Art Fund, o Museu Britânico pôde adquirir a sua terceira cópia da obra de Hokusai, um exemplar de grande qualidade, que integrava a colecção de René Druart (1888-1961), homem de letras, membro da Academia de Reims, conservador do musée du Vieux Reims e gerente da sociedade Duarte et Cie., de Reims.

 
         A qualidade desta cópia de A Grande Onda, descrita aqui, é facilmente perceptível a olho nu, sobretudo quando comparada com as que o Museu Britânico possuía desde 1906 (ex-Morrison) e 1937 (ex-Shannon).
 
 

Museu Britânico, impressão «ex-Druart», 2008, 3008.1. JA 

Museu Britânico, impressão «ex-Morrison», 1906, 1220, 0.533 (B127)
 
Impressão «ex-Morrison», com as falhas assinaladas

Museu Britânico, «impressão ex-Shannon», 1937, 0710, 0.149
 
Impressão «ex-Shannon» com as falhas assinaladas


 
       A «ex-Druart impression» foi exibida duas vezes nas Mitsubishi Corporation Galleries do British Museum e incluída pelo director, Neil MacGregor, na série radiofónica A History of the World in 100 Objects, emitida em 2010, a partir da qual foi publicado o livro Uma História do Mundo em 100 Objetos (tradução portuguesa, Temas e Debates-Círculo de Leitores, 2014).
 
      Em 2008, ano em que o Museu Britânico adquiriu a «ex-Druart Impression», Nakata Hiroshi, um velho mestre do Instituto Adachi de Xilogravuras, de Tóquio, deslocou-se a Londres, onde elaborou, perante uma audiência, uma reprodução contemporânea da grande onda de Hokusai. É possível adquirir uma impressão, porventura demasiado perfeita, de A Grande Onda na página na Internet do Instituto Adachi, aqui, por cerca de 13.000 ienes (cerca de 100 euros).

 
Reprodução contemporânea feita no Instituto Adashi, Tóquio

 
Em Hokusai's Great Wave (parcialmente disponível aqui), Timothy Clark, director das colecções japonesas do Museu Britânico e um dos maiores especialistas na arte de Hokusai, refere que foram detectados vinte estádios de degradação das xilogravuras japonesas e, em particular, nos diversos exemplares conhecidos de A Grande Onda. Esse trabalho de pesquisa foi levado a cabo por Roger Keyes (e Peter Morse), no monumental catálogo raisonné da obra de Katshushika Hokusai, composto por noventa volumes dactilografados, redigidos entre 1984 e 2006 e que, por razões compreensíveis, nunca foram publicados, encontrando-se depositados na biblioteca da Freer-Sackler Gallery do Smithsonian Institution, em Washington, DC. (https://library.si.edu/libraries/freer-sackler)
 
A impressão «ex-Druart» é considerada de maior qualidade do que a impressão «ex-Morrison», não tendo aquelas que são consideradas as duas falhas mais correntes nos blocos de cerejeira com que, ao longo dos tempos, foi sendo reproduzida A Grande Onda, uma ligeira interrupção na linha de contorno no cume do Monte Fuji e, por outro lado, uma interrupção mais visível na onda do lado direito da gravura, a qual serve de contraponto à vaga monstruosa (ou monstro em forma de vaga?) que desaba sobre nós a partir do lado esquerdo.


   Ainda assim, a impressão «ex-Druart» apresenta alguns defeitos, estando esbatidos o amarelo dos barcos e o delicado rosa das nuvens ao fundo.


    Talvez cheguemos à conclusão borgesiana de que o exemplar perfeito de A Grande Onda é aquele que já não existe –  se algum dia chegou a existir sequer.
 

 



 

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