terça-feira, 5 de março de 2019

Dia de macacada.

 
 

  
       Senhor de Chimpanzé, de Júlio Verne, é uma opereta um pouco pateta mas mais profunda do que parece. Já falei dela aqui, e o ponto que interessa é, claro, o da interacção profunda entre humanos e animais. Na peça de Verne, um homem disfarça-se de macaco para conquistar os favores da filha do director do museu zoológico de Amesterdão e, previsivelmente, instala-se a confusão entre o que é símio e o que o não é.
Consul Peter, 1909
 
 
 
         Com Kafka as coisas são mais sérias, óbvio. Todos conhecem a metamorfose de um ser humano e insecto, mas é menos sabido que Kafka escreveu um conto intitulado «Um Relatório para a Academia», em que um ex-macaco, entretanto evoluído para doutor, apresenta uma sábia comunicação universitária sobre a sua vida pretérita como mono. A sombra de Darwin parece evidente. Menos evidente é saber se Kafka se terá inspirado num macaco de feira para criar o seu chimpanzé, de nome Pedro Vermelho. Um artigo recente do TLS dedica-se a esmiuçar esta temática, sem chegar a grandes conclusões. Ainda assim, fala-se abundantemente de um chimpanzé, Consul Peter, a quem vestiram de humano (uma crueldade…) e que fez vários tours pela Europa, incluindo Praga. E não é descabido pensar, dizem muitos, que este foi o inspirador de Kafka.
 
Pierre Brassau, 1964
 
 
         Termina-se com outra história de outro macaco Peter. «Pierre Brassau», assim se chamava o chimpanzé que, em 1964, serviu para uma deliciosa partida de um jornalista de um tabloide sueco. O jornalista convenceu o dono do macaco a dar-lhe tintas e pincéis, o bicho lá sarapintou a tela e os seus quadros foram exibidos – e aplaudidos – como arte da maior vanguarda. Um crítico afirmou, julgando tratar-se de um artista humano, que aquelas pinturas revelavam um autor que «pintava com a delicadeza de um dançarino de ballet». Uma brincadeira um pouco parva, talvez, mas ilustrativa dos nossos preconceitos. Aqui fica ela, em dia de Carnaval.
 
 

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