Num
livro saído há pouco, esbarrei com o nome dela – e com o quadro em que está
pintada. O livro chama-se The Unfinished Palazzo e Cristina é convocada por ser modelo para a dona do palácio
inacabado, Luisa Casati, já aqui falada. Cristina Trivulzio Belgiojoso pertenceu
a uma família ilustríssima, cujas origens remontam ao ano 1000. Um descendente
montou um site (http://www.cristinabelgiojoso.it/wp/) onde é possível saber tudo, absolutamente tudo, desta vida
singular, a existência de uma mulher que nasceu em Milão, em 1808, com o nome: Maria Cristina Beatrice Teresa Barbara Leopolda Clotilde
Melchiora Camilla Giulia Margherita Laura Trivulzio. Criança introvertida,
educada no amor às artes, casou aos 16 anos com um libertino, a quem tolerou as
constantes aventuras; o casamento manteve-se – no papel. Falta dizer o essencial:
Cristina era herdeira da maior fortuna de Itália, que colocou ao serviço da
causa da independência face ao domínio austríaco. Por causa disso, teve de se
exilar em Paris, onde montou salon
para as luminárias da época, Balzac, Alfred de Musset, Tocqueville, Victor
Hugo, Heine. Foi lá que se desenrolou o épico duelo entre Liszt e Thalberg,
visando determinar quem era o maior pianista. Após a refrega, Cristina
sentenciou, salomónica: «Thalberg é o maior pianista, mas só há um Liszt».
Regressada à Itália revolucionária, envolveu-se pessoal e financeiramente na
luta pelo seu país, tendo novamente de exilar-se com assaz conforto, em viagem
pela Síria, Líbano e Palestina. Viu a situação terrível das mulheres nesses
países, escreveu sobre isso como já antes escrevera sobre a causa italiana.
Ficou conhecida pelos seus textos em prol dos direitos das mulheres. Enquanto
isso, foi mãe de uma menina, ignorando-se quem terá sido o pai biológico da
criança natural, legitimada apenas depois do marido morrer. Passou os últimos
dias nas margens do Lago Como, na companhia da filha e do genro, um marquês, da
sua governanta inglesa e de um criado turco, um antigo escravo. As biografias canónicas mencionam os seus vários livros mas, por pudor ou prudência, não
contam que Cristina ficou célebre pelos seus vários amantes, a menos que tudo isso
não passe de um boato aviltante com que as más-línguas tentaram incinerar o bom
nome de uma mulher livre e livre pensadora. Mas, mentira ou não, dizia-se que
Cristina tinha a paixão do ocultismo e do tenebroso, que chegou a embalsamar o
coração de um amante falecido e a guardar no guarda-fato o cadáver de outro
namorado. Se não é vero, é bem achado.
Sem comentários:
Enviar um comentário