Cécile Aubry (1928-2010)
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Cecile Aubry, pseudónimo literário de Anne-José Bénard (1928-2010) é uma personalidade
mais interessante do que os seus romances infanto-juvenis podem fazer crer.
Escritora, cenógrafa, realizadora de cinema e actriz, foi a autora da
celebérrima série televisiva Bela e Sebastião, que muitos de nós ainda recordam. Teve uma carreira promissora
no cinema, onde contracenou com Orson Welles e Tyrone Power, mas largou as
fitas quando se casou, na mesquita de Paris, com o filho do pachá de
Marraquexe, o qual se tornaria realizador e actor. Aubry ganharia fama através
das séries televisivas baseadas nas suas obras, com Poly e Bela e Sebastião.
Mostrou grande interesse por Portugal, na altura um destino exótico, tendo sido
cenógrafa de Poly au Portugal, série
de 1965, em sete episódios. Como escritora, escreveu um romance homónimo, mas
o trecho que aqui vamos reproduzir, de Poly
no Ribatejo, parece não ser dessa
obra, mas antes, como se indica na ficha técnica, de Au Secours Poly! (1967), com ilustrações de Christiane Dufour. Foi
traduzido entre nós por Maria Amélia Bárcia e editado pela Empresa Nacional de
Publicidade, que já havia publicado, na mesma colecção Poly em Portugal. Pueril, infantil, o que quiserem, mas o que
interessa é a visão idílica do país, ou de uma sua região, que dela tinha uma
popular autora francesa. Daí este trecho:
Naquela
manhã, mal nascera o dia, Carlitos, armado com uma escova, dirigia-se para a
cavalariça da quinta, na firme intenção de esfregar o pelo, já reluzente, do
seu lindo cavalinho Poly.
Poly,
que ele devia à amabilidade de Pascal. Ao findarem as férias do ano anterior
Pascal tinha visitado o Ribatejo antes de deixar Portugal. O Ribatejo – todos o
sabemos – é uma das mais belas regiões do nosso país. Ali, à beira do Tejo, se
criam os toiros para as toiradas. Esses bandos de toiros chamam-se – como também
sabem – «manadas» e os seus guardas são os «campinos», esses maravilhosos
cavaleiros. Noite e dia, armados com os seus longos pampilhos que se assemelham
a lanças, rendem-se para manterem a ordem entre os altivos animais, por vezes
combativos. Os campinos vivem com suas famílias em vastas herdades isoladas que
são verdadeiras aldeias.
Tinha
sido numa dessas herdades, talvez a mais bonita, que Pascal e Poly haviam
passado perto de uma semana. E assim haviam travado conhecimento com o pequeno
Carlitos. Muito moreno, Carlitos era, com os seus dez anos, o mais hábil dos
jovens cavaleiros. Seu pai, o Zé Ernesto – chefe dos campinos – orgulhava-se
disso. Quanto a Pascal, a sua admiração e a sua amizade por Carlitos foram tais
que lhe propôs deixar-lhe Poly até ao Verão seguinte. O cavalinho seria muito
mais feliz galopando com Carlitos, do que se ficasse fechado na herdade de
Tourelles, muitas vezes fechado na estrebaria. Porque pascal ia entrar num
colégio como aluno interno.
Carlitos
aceitou satisfeito a proposta. Agora, Poly e ele tinham-se tornado companheiros
inseparáveis. Era por isso que, naquela manhã, o rapazito se dirigia
alegremente para o estábulo do pónei.
Nesse
momento já o pai se encontrava a cavalo, pronto para ir ter com a manada.
Carlitos gritou:
− Pai, posso ir consigo?
−
Com certeza – respondeu o pai. – Sela o teu pónei e despacha-te, Vem ter comigo
ao pasto, porque não posso esperar por vocês.
(…)
Zé Ernesto fez sinal ao filho. Ambos
partiram então a trote e foram ter com Afonso, no flanco da manada. Carlitos
juntou-se aos campinos que, com o pampilho, incitavam os animais atrasados. Zé
Ernesto franziu a testa. Com voz severa, ordenou:
− Põe-te atrás de nós, Carlitos.
Um tanto vexado, Carlitos teve no
entanto que obedecer. Pôs-se a ver os homens trabalhando sob as ordens de seu
pai. Separavam o rebanho em dois grupos: os toiros que ficariam em liberdade na
manada e os que seriam escolhidos para a corrida. Os campinos tentavam
agrupar-se em volta desses, que seriam uns dez. Tinham de encerrar os dez
animais num círculo cada vez mais apertado, até que fosse possível obrigá-los a
entrar, um a um, numa espécie de corredor ladeado de altas barreiras que
conduzia a um cercado.
Bruscamente,
Carlitos estendeu o braço para um dos touros:
− O melhor de todos é aquele! – gritou.
Afonso teve um assobio de admiração.
− Estás a ver, Zé, o teu filho tem
olho! Não há dúvida que o Negro é dos mais fortes e dos mais corajosos.
Zé Ernesto teve um sorriso de orgulho,
mas não quis mostrá-lo ao Carlitos.
− Agora vai dar um passeio – disse para
o filho. – Por hoje já viste bastante.
(…)
Poly conduziu Carlitos ao longo dum
caminho escavado, com muita sombra. Depois cortou a direito pelo pasto e trotou
para o parque de uma casa muito bonita que o pequeno avistava por entre as
árvores. Nunca tinha entrado nesse parque, nem na casa toda branca. Zé Ernesto
proibia-o formalmente, a todas as crianças da quinta. Era a «casa dos patrões»,
a bela vivenda de D. Vasco.
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