sexta-feira, 12 de outubro de 2018

Um caso tristíssimo.



José Conrado Rosa, Mascarada Nupcial, 1788
 
 
 
 
Causou grande alarido este relatório da ECRI (Comissão Europeia para o Racismo e a Intolerância) que afirmou, entre o mais, que os manuais de História vigentes em Portugal deveriam dar mais ênfase à escravatura e ao colonialismo. Perante a estranheza de algumas vozes (obrigado, Paulo Guinote), a revista SÁBADO questionou a ECRI, que confessou não ter lido um único manual de História vigente em Portugal. Um único. Nada. «A ECRI não avaliou directamente o conteúdo dos livros». Como? Então o que fez a ECRI? O «ensino da História nos manuais foi apontado por algumas ONG como um motivo de preocupação». Quais ONG’s?, perguntou a SÁBADO. A ECRI declinou responder, devido a «regras de confidencialidade». Como??? Então onde está a transparência de procedimentos, o direito dos cidadãos a serem informados? Como podemos indagar da credibilidade das organizações ouvidas, da sua representatividade? Defenda-se o que se defender nesta matéria, que há ou não há ensino da escravatura nos manuais escolares, o que espanta e causa dó é a leviandade absoluta, absoluta, como uma entidade do Conselho da Europa trabalha e produz documentos que depois são divulgados urbi et orbi. Não abriu um único manual mas fez recomendações, alvitrou sugestões, opinou baseando-se tão-só em depoimentos em segunda mão, vindos de ONG's cuja identidade se mantém no secretismo. É assim que se trabalha na defesa dos direitos humanos? Não percebem que é esta ligeireza que depois alimenta as maiores xenofobias e os piores populismos? Um caso triste, tristíssimo (que bem merecia uma acção do Conselho da Europa, ou das autoridades portuguesas, em nome da credibilidade das instituições).
 
 
 
 
 

 

  

11 comentários:

  1. Não tem nada de extraordinário. Também há uns inquéritos, cujos resultados são muito divulgados, sobre a "perceção da corrupção", nos quais se pergunta a diversos empresários (quais? Não se sabe.) se acham que nos países deles há muita ou pouca corrupção. Os resultados desses inquéritos são divulgados como se representassem realmente a corrupção que há nesses países. É exatamente o mesmo método: em vez de se estudar realmente um fenómeno, pergunta-se a pessoas, cuja identidade é mantida em segredo, qual a sua perceção de, ou opinião sobre, esse fenómeno. E essa perceção ou opinião é erigida em verdade.

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    1. Muito obrigado pelo seu comentário:

      1 - antes de mais, e convém que fique claro, não há da minha parte, como é óbvio, uma discordância quanto à necessidade de combter o racismo e a xenofobia;

      2 - o que se contesta, isso sim, é a ligeireza dos procedimentos, pois deste modo pode acabar por se chegar ao resultado inverso ao pretendido, ou seja, a falta de credibilidade da metodologia pode afectar a conclusão geral e, pior ainda, favorecer os que advogam ideias racistas ou xenófobas;

      3 - salvo o devido respeito, creio que a comparação que faz não é legítima, porquanto nos casos de corrupção, etc, pode haver um risco sério e atendível de retaliação. Não parece que uma ONG que diga que os manuais escolares portugueses são racistas venha a sofrer quaisquer retaliações. Pelo contrário, penso ser tarefa dessas ONG's denunciarem publicamente uma prática que, em si mesma, dificilmente impedirá que esssa ONG's prossigam livremente o seu trabalho. Já foram feitas denúncias sobre manuais escolares, incluindo por mim, incluindo neste blogue, e incluindo sobre estereótipos sexistas e racistas, e não fui alvo, creio, de qualquer retaliação ou ameaça.

      4 - O problema está, justamente, no que afirma a final, no facto de uma percepção ou opinião, para mais dada sob anonimato, ser erigida em «verdade».

      Muito grato pelo seu comentário,

      António Araújo

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    2. Muito bem caro Antonio Araujo,

      Obviamente, é completamente falacioso comparar os indices de percepção da corrupção - que de resto costumam ser claramente apresentados com uma advertência especial (os elaborados pela Transparency International são-no sistematicamente), que sublinha que se trata de uma medida é relativa - com o caso debatido aqui. No caso da corrupção, como no dominio mais vasto da criminalidade, existem dificuldades de medida conhecidas ha muito tempo, que ja fizeram correr rios de tinta por parte dos especialistas, sendo pacifico que elas não devem impedir de usar instrumentos relativos e indirectos, desde que devidamente enquadrados. Nada a ver portanto com a mera recolha aleatoria de opiniões numa ou duas tabernas.

      Uma comparação muito infeliz portanto.

      Boas

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    3. Sem dúvida que um estudo sobre a percepção não revela absolutamente nada sobre a «realidade efectiva» desse fenómeno, seja a corrupção, a criminalidade, a xenofobia, mesmo que seja feito com respeito a métodos sérios, o que nem sempre é o caso. E essa de não terem consultado os manuais e os programas é uma delícia. Gostava de saber quem elaborou estes documentos e ao serviço de quem estão.

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    4. Não misturemos por favor, caro Carvalhão. Não duvido que a critica ao inquérito sobre os manuais seja bem fundada. Agora, epistemologicamente falando, qualquer conhecimento objectivo e rigoroso sobre a "realidade efectiva" passa pela percepção, necessariamente, a não ser que v. acredite em conhecimento por intuição divina. Isto não obsta, como é obvio, a que se distinga entre conhecimento cititico, objectivo, mensuravel, rigoroso e pura matéria de opinião. Os inquéritos sobre a corrupção que servem de base às nossas politicas, apesar de se basearem na percepção pelos agentes economicos, pertencem à primeira catégoria (como alias muitos outros inquéritos sobre criminalidade). Não são perfeitos. Nenhum conhecimento sobre a "realidade efectiva" é...

      Boas

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    5. É isso mesmo. Não misturemos!!! Não tomemos estudos sobre a percepção como se fosse a expressão dessa mesma realidade. É o que aqui está em causa. E nada mais!!! Não misturemos. Não se diga que um país é racista, ou corrupto porque se leram não sei quantos artigos e se ouviu a opinião de não sei quantos informantes privilegiados ou não a emitirem opiniões. «Epistemologicamente» falando: não se diga que meloas são melões só porque o comum do destinatário não consegue à primeira perceber à primeira a diferença. E isso já não é do campo nem epistemológico nem metodológico - é da moral!

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  2. a esquerda apátrida que regurgitou com isto agora fica calada e enterra a cabeça na areia...VERGONHA

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  3. Comissão Europeia para o Racismo e Intolerância, do Conselho da Europa. ECRI. Não confundir com a extinta European Commission for Human Rights, que era um órgão que analisava previamente as queixas para o TEDH e depois foi extinto

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    1. O é que foi extinto? O TEDH? ou A ECHR? É que o TEDH existe, continua em EStrasburgo e está de boa saúde.

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    2. err... Sr. Carvalhao.G, obviamente que não foi o TEDH que foi extinto! A antiga comisão dos direitos humanos, antiga antecâmara do TEDH é que foi. :/

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