terça-feira, 30 de janeiro de 2018

São Cristóvão pela Europa (55)

 
 


 
 
Convento Catharijne, Utrecht, 29 de Julho de 2016
 
Vencedor do Prémio Goncourt de 1970 com o romance Le Roi des Aulmes (O Rei dos Ulmeiros), Michel Tournier (1924-2016) foi um grande romancista francês da segunda metade do Século XX.
O romance inspira-se num poema de Goethe e no mito do ogre.
O personagem principal, Abel Tiffauges, é um garagista em Paris, estudou num colégio chamado São Cristóvão e ele próprio tem uma altura e um peso que o aproximam tanto do ogre como de São Cristóvão.
O garagista recorda-se repetidamente do seu passado. Escreve: Cada vez que uma viatura me é confiada, apercebo-me do medalhão de São Cristóvão apoiado no painel de instrumentos, penso no Colégio de Beauvais, e admiro uma das linhas de constância ao longo da minha existência. O Colégio de São Cristóvão e depois esta profissão de garagista que me repõe sob o patrocínio do gigante portador de Cristo.
  Abel é escolhido como recitator, o aluno responsável por recitar trechos de textos enquanto os restantes tomam as suas refeições. Dão-lhe o texto que devia ler. E é a parte da Lenda dorada de Jacobus de Voragine consagrada a São Cristóvão, já aqui tratada. Ver aqui.
 
Estava bem contente de ter entoado toda esta história sem pestanejar uma única vez durante duas horas. Na aula seguinte, o seu principal amigo, Nestor, estava absorvido num desses desenhos sobrecarregados de cores e floreados que ele enriquecia por vezes durante horas a fio, a cara quase colada à folha de papel. Quando ele se endireitou, vi que tinha desenhado um São Cristóvão. Mas sobre os ombros, o gigante suportava o conjunto dos edifícios do colégio a cujas janelas se debruçava a multidão dos alunos. Nestor passou um lenço pela sua fronte num gesto familiar murmurando: Cristóvão à procura do mestre absoluto, encontrou-o na pessoa de um rapazinho. Mas o que era mesmo preciso saber é a exacta relação que existe entre o peso do rapazinho e o florescimento do cajado. Vi então, inclinando-me, que ele tinha emprestado os seus próprios traços à cara do gigante Porta-Cristo.
 
José Liberato

 

Sem comentários:

Enviar um comentário