segunda-feira, 8 de junho de 2015

Assim, não.

 
 


 
 
Quando o caso é grave, a obsessão justifica-se. Tem-se falado aqui, vezes sem conta, do uso e abuso de bancos de imagens. Já disse a minha opinião: em livros em que a imagem não é um elemento fulcral da capa, mas tão-só um ornamento, nada de mal existe em utilizar fundos bancários. O caso de hoje, porém, é o contrário de tudo isso. Com a agravante de se tratar de uma ilustração, de um desenho. Portugal tem dezenas de ilustradores excepcionais, uma nova geração que só precisa de trabalho para mostrar o seu talento.  Actualmente, a Imprensa Nacional, numa extraordinária colecção, mostra a arte de designers do passado: Victor Palla, Paulo-Guilherme, João da Câmara Leme... No Almanaque Silva, o grande Jorge Silva tem prestado serviço público. Em contraste, o que fazem muitas editoras (neste caso, a Esfera dos Livros)? Compram ilustrações em bancos de imagens… Desenhos que vimos em milhares de sítios, bastando uma pesquisa de segundos na Internet. Dir-se-á que sai mais barato, que o mercado livreiro não anda rico, que este era um livro que não merecia o esforço. Puro engano. Para todos os livros há um ilustrador à altura. Capaz de, com a sua arte, dar a volta ao texto. E, desse modo, ganharíamos todos: os autores dos textos, os ilustradores das capas, os compradores dos livros, as artes gráficas portuguesas. Não é nacionalismo passadista nem patrioteirismo nostálgico. A questão é simples: se todas as editoras passarem a comprar sistematicamente imagens (de desenhos, não apenas de fotografias!) nos bancos internacionais, no futuro quem recordará a geração de ilustradores que agora desponta? Far-se-ão antologias das suas obras? Não, nunca. Alguns irão trabalhar para fora, outros viverão de biscates, outros ainda mudarão de actividade. Isso não constitui  um retrocesso, um empobrecimento cultural? Sem margem para dúvida. E suficientemente grave para que falemos obsessivamente dele.
 
António Araújo
 
 

4 comentários:

  1. Na Casa Moeda uma excepcional exposição " Vults da Nossa História" em medalhas.
    Particular atenção para o número 81 (José Marinho) de José Espiga Pinto.

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  2. Concordo. Porém, se eu falar obsessivamente do assunto, nada acontece. As mesmas palavras, utilizadas por diferentes pessoas não dão idêntico resultado.

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  3. Aprecio as suas observações sobre o valor das imagens.
    Não compreendo bem o desgosto desta filípica sobre os bancos de imagens.
    Os bancos de imagens internacionais, não só estão abertos para o talento nacional, como oferecem também um rendimento e vida mais longa para as imagens de ilustradores, fotógrafos e demais artistas gráficos.
    Proporcionam igualmente uma plataforma acessível, (sem cunhas) limitações geográficas ou linguísticas, para talentos em inicio de carreira.
    É verdade que a concorrência nesta área é enorme, todavia, há bancos de imagens para todas as bolsas e níveis de talento, desde entrada livre, até ao só por convite.

    Quantas imagens do génio nacional (mal pago) terminam após uma rápida passagem pelos escaparates no fundo da gaveta do esquecimento?

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  4. Tem quase toda a razão. Só não concordo na limitação que o António impõe ao artista nacional. Grave, a meu ver, é o facto de a artista/autora da imagem, mesmo tendo sido comprada em banco de imagens, não ter sido identificada. Chama-se Diana Dementeva, é russa, com trabalho muito bom, como se pode verificar aqui - https://www.behance.net/diashule

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