Mark Rothko, Nº 8, 1952
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Mas Tu, quando é que virás?
Mas Tu, quando virás?
Um dia, estendendo a Tua mão
Pelo bairro em que habito
no momento maduro em que desespero verdadeiramente:
num segundo de trovão,
arrancando-me com terror e soberania
do meu corpo e de corpo pustulento
dos pensamentos-imagens, ridículo universo;
deixando dentro de mim a tua medonha sonda,
a temível fresadora da Tua presença, erguendo num momento
sobre a minha diarreia
a Tua direita e insuperável catedral;
projetando-me não como homem
mas como obus na via vertical
TU VIRÁS.
Tu virás, se tu existes,
engodado pelo meu lamaçal
a minha odiosa autonomia;
saindo do Éter, de não importa onde, de debaixo do meu
eu perturbado, talvez;
atirando o meu fósforo para a Tua desmedida,
e adeus Michaux.
Ou então, o quê?
Nunca? Não?
Diz, Sorte Grande, onde irás tu cair?
Henri
Michaux, “Mas Tu, quando virás?”, Longínquo
interior (1938)
O poeta surrealista belga Henri
Michaux (Namur, 1899 – Paris, 1988),
destacando-se pelas suas viagens poéticas interiores (Longínquo interior, 1938) e em países imaginários (Viagem a Grã-Garabanha, 1936),
desenhador e pintor, algum tempo fascinado pela droga (Miserável milagre, 1956), poeta-artista (Ideogramas na China, 1975), serve-se duma escrita desenvolta e somática que exprime uma
angústia metafísica de grande intensidade emotiva e dum humor sempre
provocador.
Trad. e nota de João Medina
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