A advogada norte-americana Deborah Neff
colecciona há mais de vinte anos bonecas negras. Bonecas negras fabricadas nos
Estados Unidos de meados do século XIX a meados do século XX. Além de bonecas,
e para documentar e perceber o que colecciona, Deborah Neff busca também
fotografias de crianças – rapariguinhas, claro, não rapazes – posando com as
suas bonecas em álbuns de família.
Ao fim de duas décadas, pôde concluir que, em
regra, as meninas brancas tinham bonecas de meninas negras; por seu turno, as
meninas negras tinham, também em regra, bonecas de meninas brancas. Não se
trata de dizer, como é óbvio, que as brancas apenas tinham black dolls, como é óbvio (muitas tinham bonecas brancas,
evidentemente). Nem se pretende, creio eu, fazer daqui grandes considerações
históricas ou sociológicas, mas tão-só colocar hipóteses. O que Deborah Neff
afirma é que é plausível que as bonecas negras que as meninas-família brancas
tinham eram, muito provavelmente, feitas pelas suas amas negras, cosendo
trapos, pedaços de tecido. Quanto às meninas negras, há obscuridades, desde
logo porque não existem muitas fotografias de família dos escravos nas
plantações. E as imagens que mostram meninas negras com bonecas brancas datam
do século XX. E, como é evidente, as famílias negras que eram fotografadas para
álbuns pertenciam à pequena ou média burguesia, não aos segmentos mais pobres.
Tanta conversa para nada? A coisa complica-se pois existiam «bonecas gémeas» ou
«dupla face», que ora apareciam com a tez branca, ora com a tez negra. O facto
é que, talvez por via da moda dos estudos pós-coloniais, a colecção de Deborah
Neff anda a fazer furor, foi fotografada aqui, na Slate, e encontra-se
actualmente em exibição em Paris, na Maison rouge (aqui e notícia no Le Monde, aqui).
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